
Os desafios do ensino superior no Brasil foi tema da mesa-redonda “Um olhar sobre o ensino superior no Brasil”, durante o segundo dia da 77ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).
Aldo Zarbin, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e vice-presidente eleito da SBPC, destacou que, entre os diversos desafios enfrentados pelo ensino superior brasileiro, dois se sobressaem de forma mais crítica. O primeiro é a necessidade de ampliar e democratizar o acesso a uma educação de qualidade. Atualmente, apenas 22% da população brasileira entre 25 e 34 anos possui ensino superior completo. Além disso, apenas 20,7% dos estudantes matriculados estão em instituições públicas e gratuitas, um dado que evidencia a urgência dessa pauta.
O segundo grande desafio, segundo Zarbin, é a ampliação da formação de recursos humanos com qualificação científica e tecnológica. Embora o Brasil ocupe a 13ª ou 14ª posição mundial em produção acadêmica, figura apenas na 50ª colocação no Índice Global de Inovação. “Sabemos que, sem a formação de profissionais em áreas estratégicas, não é possível transformar esse cenário”, afirmou.
Diante dessas dificuldades no acesso e na qualidade do ensino superior, Zarbin mencionou a iniciativa da Academia Brasileira de Ciências (ABC), que elaborou um relatório com propostas para o aprimoramento dessa etapa educacional, especialmente nas instituições públicas. O documento, intitulado ‘Um olhar sobre o ensino superior no Brasil’, reúne uma série de recomendações e está disponível no site da entidade.
Ao também citar que 23% dos brasileiros entre 21 e 34 anos concluíram ou estão cursando o ensino superior, Rodrigo B. Capaz mencionou que a meta do Plano Nacional de Educação (PNE) era chegar em 33% em 2024. “É urgente para qualquer estratégia de desenvolvimento do País aumentar a fração de brasileiros com ensino superior. Ouvimos muito falar que o Brasil não precisa tanto de ensino superior. Que ele precisa investir no ensino técnico. Isso não é uma verdade. É claro que a gente precisa também de ensino técnico, mas ainda a gente está muito abaixo da média da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), por exemplo, de percentual de ingressos. Ainda há muito espaço para o ensino superior, para as matrículas crescerem de forma importante.”
Capaz destacou a necessidade urgente de reduzir a desigualdade entre o número de matrículas em cursos de graduação nas instituições públicas e privadas. “Quando analisamos a evolução ao longo do tempo, observamos que o número de matrículas nas instituições privadas cresceu consideravelmente. Em 2022, apenas 22% dos estudantes estavam matriculados em instituições públicas, enquanto 78% estavam nas privadas. Se fizermos uma conta simples, veremos que somente cerca de 5% dos jovens brasileiros têm acesso ao ensino superior público. Precisamos reverter essa realidade com urgência”, enfatizou.
Ele também chamou atenção para o avanço das vagas no ensino a distância (EaD), especialmente na rede privada. “Ao compararmos o crescimento das vagas presenciais com as do EaD nos últimos anos, vemos um aumento expressivo na oferta de ensino a distância, majoritariamente oferecido pelas instituições privadas. Isso pode indicar que as instituições públicas não estão conseguindo responder à demanda dos estudantes”, afirmou.
Já Helena Nader, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), alertou para a necessidade de ação imediata por parte do País. Segundo ela, o Brasil está envelhecendo rapidamente, o que trará impactos significativos para a previdência social. “Em 2011, o Brasil ocupava a 47ª posição no Índice Global de Inovação. Após algumas oscilações, em 2024 estamos na 50ª posição”, lamentou.
Nader citou ainda que uma das recomendações presentes no documento da ABC é a criação de Centros de Formação em Áreas Estratégicas, voltados para seis setores prioritários — bioeconomia; agricultura e agronegócio; transição energética; saúde e bem-estar; transformação digital e inteligência artificial; e materiais avançados e tecnologias quânticas. “É essencial preparar nossos jovens para que se tornem adultos produtivos, capazes de contribuir de forma significativa com a sociedade”, concluiu.
Rui Vicente Oppermann, diretor de Relações Internacionais da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), abordou o funcionamento do Sistema Nacional de Pós-Graduação brasileiro. Segundo ele, apesar de ser um sistema consolidado e presente em todas as regiões do País, ainda enfrenta desafios significativos que precisam ser superados. Isso se deve, em parte, à diversidade dos padrões de qualidade, à internacionalização desigual e à variação na interação com a sociedade.
Entre os principais pontos levantados por Oppermann que demandam atenção estão: o enfrentamento das assimetrias regionais; o estímulo à mobilidade acadêmica dentro do país; a adoção de uma avaliação mais ampla e multidimensional; a valorização de políticas voltadas à equidade e à diversidade; a garantia de financiamento contínuo; o fortalecimento das relações com o setor produtivo fora do meio acadêmico; além da necessidade de ampliar a internacionalização e a visibilidade global da ciência brasileira e das pesquisas institucionalizadas.
Assista aqui ao debate na íntegra.
Vivian Costa – Jornal da Ciência