Com 765 inscrições válidas, a comissão julgadora do Prêmio Carolina Bori “Ciência & Mulher” teve um desafio de selecionar pesquisas que tivessem um rigor científico e um potencial transformador e social. Este é o caso de Isadora Abreu Leite, estudante do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA) e uma das ganhadoras da categoria Ensino Médio.
Isadora foi responsável pela pesquisa “Sementes da Maré: saberes e fazeres de marisqueiras da costa de manguezais de macromaré da Amazônia”; com orientação da professora Izabel Cristina da Silva Almeida Funo. “Essa pesquisa foi realizada aqui no município de Raposa, no Maranhão, que é um município muito voltado para a pesca artesanal de mariscos, a cidade é como se fosse uma comunidade de pescadores, eu entendo por assim”, explica a premiada. “Essa atividade de mariscagem é majoritariamente feita por mulheres, por ser uma atividade de baixo lucro, mas que normalmente é complemento de renda. É uma tradição familiar, a mãe passa para a filha o que aprendeu de sua mãe, e assim por diante. E são mulheres que não têm normalmente uma formação acadêmica, e que vivem dessa atividade informal.”
O estudo foi pensado com o objetivo de analisar os saberes dessas marisqueiras e qual a percepção ambiental dessas profissionais. Ao todo, 120 mulheres foram entrevistadas pelo método bola de neve, que é quando um entrevistado vai sugerindo outros entrevistados. “É um método usado quando a gente não sabe a quantidade determinada de pessoas de uma comunidade. Por exemplo, eu chego na casa de João e faço a minha pesquisa com ele, aí eu pergunto: ‘João tem algum outro marisqueiro que você conhece e que pode responder essa pesquisa?’, e aí ele indica uma pessoa, nós vamos na casa dessa pessoa, e assim por diante.”
Uma das principais conquistas da pesquisa foi ilustrar como a mariscagem é realizada e com essa realização tem ligação com o entendimento das mulheres sobre sustentabilidade – algo que apareceu somente em 3% das entrevistadas.
“Esta é uma atividade feita sem conhecimentos de higiene e normas de segurança. As marisqueiras não costumam usar luvas e ainda utilizam elementos rudimentares para catar os mariscos. Por exemplo, aquelas vassouras de ferro usadas para varrer folhas, copos de quengas de coco ou hélices de ventiladores. Tem gente que nem sabe o que é conservação ambiental, enquanto outras pessoas até fazem algumas ações para a conservação das espécies. Nesse caso, quando elas vão sacudir os mariscos pegos, elas deixam os pequenos saírem, porque sabem que a espécie precisa continuar a se desenvolver.”
O Sementes da Maré é um projeto que envolve muitos estudos, mas a ideia de entrevistar as marisqueiras veio da Isadora. “Eu sempre gostei muito de entrar em contato com o público. Eu nunca fui só aquela pessoa de ficar em um laboratório, gosto de estar em campo com os meus colegas. E quando a gente entra em contato com as pessoas, a gente consegue ver a realidade, não só uma parte superficial dela. É bom também porque é uma forma de ouvir o que as pessoas têm necessidade de falar.”
Com a pesquisa realizada, a jovem cientista tem ainda um desejo: que o seu estudo traga melhorias às entrevistadas. “A minha pesquisa também foi feita para entender as necessidades que as marisqueiras têm, porque, em geral, a pesca artesanal não tem visibilidade de governos. Então, a gente espera que essa pesquisa traga visibilidade política, para que os governos possam fazer mais por essa população, isso vai melhorar bastante a sua condição de vida.”
Ao saber, no começo da semana, que foi uma das ganhadoras do Prêmio Carolina Bori, Isadora não pôde acreditar que um reconhecimento viria tão cedo. “Até agora não caiu a ficha! Porque como eu estou começando na pesquisa, eu ainda sou do ensino médio, não esperava ganhar. Mas fiquei muito feliz, porque não é só a minha vitória. É uma vitória de todas as pessoas que trabalharam comigo no laboratório, é uma vitória da minha família e também das pessoas por quem eu luto, as marisqueiras”, conclui.
Premiação
Nesta 6ª edição de Prêmio Carolina Bori “Ciência & Mulher”, as ganhadoras da categoria Ensino Médio receberão R$ 7 mil cada, enquanto as vencedoras de Graduação serão agraciadas com R$ 10 mil cada uma, graças ao apoio das instituições: Fundação Conrado Wessel, Instituto Serrapilheira, Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (Fapema) e o Complexo Pequeno Príncipe. Também foi concedida uma menção honrosa, que receberá um certificado e um troféu.
Além da premiação em dinheiro, as seis vencedoras terão acesso a uma série de oportunidades para impulsionar suas carreiras científicas. Elas apresentarão seus projetos na 77ª Reunião Anual da SBPC, que ocorrerá em julho de 2025, em Recife (PE), e participarão de uma mentoria exclusiva com pesquisadores de destaque, ampliando suas perspectivas acadêmicas e profissionais. As premiadas também farão uma visita ao CNPEM, em Campinas, onde está localizado o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, a única fonte de luz síncrotron da América Latina.
A cerimônia de premiação acontecerá no dia 11 de fevereiro, no Salão Nobre do Centro MariAntonia da USP (Rua Maria Antonia, 294 – 3º andar – São Paulo/SP), durante a comemoração do Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, instituído pela Unesco, com transmissão ao vivo pelo Canal da SBPC no YouTube.
Criado em 2019, o Prêmio “Carolina Bori Ciência & Mulher” é uma homenagem da SBPC às cientistas brasileiras destacadas e às futuras cientistas brasileiras de notório talento. A premiação leva o nome da primeira presidente mulher da entidade, Carolina Martuscelli Bori, precursora na luta pela regularização da Psicologia enquanto ensino e profissão no Brasil, além de uma defensora da comunicação científica à sociedade.
Confira abaixo a lista das premiadas da 6ª Edição do Prêmio “Carolina Bori Ciência & Mulher” – Meninas na Ciência:
Categoria ENSINO MÉDIO:
Engenharias, Exatas e Ciências da Terra – Millena Xavier Martins (MG)
Humanidades – Isadora Abreu Leite (MA)
Biológicas e Saúde – Ana Elisa Brechane da Silva (SP)
Categoria GRADUAÇÃO:
Engenharias, Exatas e Ciências da Terra – Narayane Ribeiro Medeiros (SP)
Humanidades – Angélica Azevedo e Silva (DF)
Biológicas e Saúde – Beatriz Oliveira Santos (SP)
MENÇÃO HONROSA: Lucia Ferreira da Silva (AP)
Rafael Revadam – Jornal da Ciência