José Fernandes Lima falou sobre os desafios do PNE 2014-2024 em conferência no segundo dia da Reunião Regional da SBPC em São Raimundo Nonato, no Piauí
Os desafios do Plano Nacional de Educação (PNE), Lei no 13.005/2014, foram discutidos no segundo dia da Reunião Regional da SBPC em São Raimundo Nonato, no Piauí. José Fernandes de Lima, ex-presidente e hoje conselheiro do Conselho Nacional de Educação foi quem proferiu a palestra. Segundo ele, o PNE 2014-2024 é a consequência de um movimento que vem avançando desde a Constituição de 1988, que estabeleceu, além de que o Plano fosse uma Lei, a ideia da educação para todos. Mas, conforme observou, essa ideia se concretizará somente se, junto à ampliação do acesso a escolas, os governos federal, estaduais e municipais, forem capazes de criar as condições que garantam a qualidade desse ensino.
“Para seguir esse caminho de fazer educação para todos, nós temos que garantir o acesso, a permanência e o sucesso dos alunos na escola. Isso implica em ampliar o número de vagas, em formar os professores, melhorar a gestão e garantir o financiamento das escolas”, afirma. O Conselho Nacional de Educação é uma das instâncias responsáveis pelo monitoramento da execução e cumprimento das metas do PNE, juntamente ao Ministério da Educação (MEC), às Comissões de Educação da Câmara dos Deputados, à Comissão de Educação e Cultura do Senado Federal e ao Fórum Nacional de Educação.
Lima, que hoje é conselheiro da Câmara de Educação Básica no CNE, conta que, nesta edição do PNE, o que se propôs foi identificar as questões que estão diretamente relacionadas com a ampliação do acesso das pessoas à educação. “Mas essa ampliação do acesso só irá ocorrer se nós tivermos todos os investimentos no que nós chamamos de qualidade da educação”, ressalta.
Outro ponto que o conselheiro do CNE levanta é que, para se criar um Plano decenal de educação, é preciso estabelecer o que se espera para o futuro do País. “Tendo a ideia de qual é a nação que você imagina, é que você vai poder dizer qual é a educação que você vai querer. Se você quer um país democrático, então você vai optar por uma educação para todos, que ofereça maiores oportunidades. Se você imagina que o país que você quer para o futuro não é desse jeito, então, obviamente, você não precisará fazer esse tipo de investimento na educação”, argumenta.
Se for para seguir o que está estabelecido pela Constituição Federal, que é garantir e viabilizar a educação para todos, isso requer, impreterivelmente, investimentos, comenta ele: “não só do ponto de vista financeiro, mas também da mentalidade e do ponto de vista do nosso comportamento em relação à escola”.
Avaliações
Sobre a questão das avaliações, ferramenta utilizada cada vez mais sistematicamente para medir a qualidade das instituições de ensino no País, Lima defende que elas são necessárias. Porém, é preciso, antes de avaliar, que se defina o que é que se quer avaliar. E para isso, deve-se, primeiramente, definir um currículo comum.
“O problema que estamos enfrentando nesse momento é que a metodologia de avaliação foi desenvolvida muito antes do estabelecimento de onde queremos chegar. Nós avançamos na questão das avaliações muito antes de avançarmos na definição dos conteúdos, da estrutura necessária para esses conteúdos e na qualificação dos professores”, observa.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que esteve até março aberta para consulta pública, foi idealizada com esse propósito, conforme define o conselheiro do CNE: definir quais são os conhecimentos mínimos que precisam ser colocados a todos os estudantes. Daí, sim, como justifica Lima, fará mais sentido que se busque uma forma de acompanhamento que permita saber se o que foi planejado está sendo cumprido, e se a direção escolhida é a mais adequada.
“A avaliação tem um papel de fornecer essas informações. O que não pode é considerá-la como uma coisa para a uniformização geral do País, que despreze a nossa diversidade. Essa diversidade do Brasil é o nosso potencial”, diz.
O conselheiro acredita que a preocupação que as escolas manifestam hoje com as avaliações tem a ver, justamente, com o fato de que a ordem foi invertida, ou seja, a avaliação foi criada antes que se chegasse a um consenso sobe o currículo nacional.
Ele considera que o fato de a BNCC ter sido amplamente discutida é, em si, um avanço. De acordo com ele, as discussões abertas para a consolidação da Base Comum servem para identificar, nos currículos existentes em todas as escolas, o que eles têm em comum e o que é considerado fundamental fazer parte de todos.
Salários dos professores
Uma das metas do PNE é a equiparação da média dos salários dos professores da rede pública de educação básica à média dos rendimentos de outros profissionais com escolaridade equivalente, até 2019. Questionado sobre a probabilidade de que esta meta seja cumprida, o conselheiro do CNE falou que, segundo um levantamento feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), chamado Linha de Base, que avalia a evolução das metas do Plano, alguns estados já conseguiram atingir 90% do desejado.
A equação dessa média é feita pelo cálculo da média dos salários dos professores da educação básica, em cada Estado, individualmente, comparado com a média de salários de profissionais de formação superior, como arquitetos e psicólogos, que atuam na rede pública. “Em muitos estados isso já ultrapassou 90%. Então é possível sim, no futuro, ter essa equiparação. O que pode não significar muita coisa, porque os salários base de muitas dessas outras categorias também não são tão bons”, pondera Lima.
PNE 2001-2010
O PNE 2014-2024 é a segunda edição do Plano Nacional de Educação na forma de Lei no País. A primeira foi em 2001-2010, mas foi criticada por não conseguir concretizar seus objetivos, especialmente pela falta de verbas e falta de comunicação com estados e municípios.
“O PNE passado dizia que os estados e municípios deveriam fazer seus planos estaduais e municipais. Mas mais de dois terços dos estados deixaram de cumprir isso. O mesmo aconteceu no caso dos municípios”, conta.
Nesta nova versão, foram definidas 20 metas, sustentadas por 254 estratégias. Um dos instrumentos para viabilizar esta Lei, foi a obrigação de ampliar os investimentos públicos em educação para que se atinja 7% do produto interno bruto do País até 2019 e 10% do PIB até 2024.
Para Lima, o PNE 2014-2024 seguiu uma estratégia melhor. “Dos quase 5600 municípios, mais de 90% têm planos municipais. Essa discussão precisa ser continuada e o governo federal, na minha opinião, precisa fazer um investimento para a continuação desse debate. Precisa criar programas de incentivo, mecanismos de cobrança e de acompanhamento das informações para que elas cheguem aos municípios”, aponta.
A questão agora, diz ele, é como criar políticas públicas e programas que permitam dar continuidade ao debate. O PNE 2014-2024 prevê que, durante esse período, se realizem pelo menos duas conferências nacionais. “E se queremos ter duas conferências nacionais, significa que teremos mais duas vezes esse debate em todos os estados e municípios. Eu acho que a construção desse Plano apresenta mais cuidado que o outro no sentido de fazer a informação chegar na base”.
SBPC
O conselheiro do CNE também destacou a importância da Reunião Regional e da atuação da SBPC – que é um dos atores que participaram ativamente da construção do PNE 2014-2024 – para o desenvolvimento da ciência e da educação no País: “Eu acho que essas reuniões regionais têm uma importância fundamental que é trazer informação para uma população que, sem a reunião, não teria acesso a esse conteúdo. Além disso, outro aspecto é a mobilização em torno da causa da ciência e da educação científica; e, mais ainda, ela possibilita ampliar a capacidade da comunidade local de se conhecer e reivindicar direitos de ter uma educação e uma ciência e tecnologia de melhor qualidade”.
Com o tema “O homem e o meio ambiente: da pré-história aos dias atuais”, a SBPC realizou sua Reunião Regional em São Raimundo Nonato, PI, entre os dias 20 e 23 de abril. O evento trouxe palestrantes e autoridades de todo o País para discutirem com estudantes e comunidade local temas que vão desde ciência, tecnologia e educação à história da região e direitos humanos.
Daniela Klebis – Jornal da Ciência