A presidente da SBPC, Helena Nader, esteve presente no segundo dia da semana de comemoração dos 10 anos da Universidade Federal do ABC (UFABC), no campus Santo André, onde realizou uma palestra sobre o histórico da ciência brasileira, a situação atual, suas consequências para a pesquisa no Brasil e suas propostas de solução. O evento de comemoração do decenário da UFABC começou na noite de segunda-feira, 19, com o lançamento do livro comemorativo “UFABC 10 anos: Novos caminhos para o ensino superior”, seguida de uma palestra proferida pelo professor Luiz Bevilacqua – que coordenou a formulação do projeto acadêmico e implantação UFABC, em 2005 -, e segue até esta sexta-feira, dia 23 de setembro.

Considerado vanguardista e inovador, o plano da mais nova universidade federal paulista desafiou cânones da tradicional academia brasileira. Eliminou departamentos, deu maior liberdade à definição de conteúdos e disciplinas, promoveu a interdisciplinaridade, transformou o método de admissão – o estudante ingressa na universidade e não em um curso determinado. Hoje, a UFABC é modelo nos debates sobre a universidade do futuro.

Na terça-feira, dia 20, a pró-reitora de pesquisa da UFABC, Marcela Sorelli Carneiro Ramos, apresentou dados e resultados dos 10 anos de existência da Universidade. “Esses dados servem para ilustrar que a UFABC tem tomado realmente um destaque muito importante na pesquisa, e a ideia é que a gente possa aprimorar o que a gente tem feito nesses 10 anos da UFABC”, completou.

Ramos destacou que, mesmo sendo uma das mais novas universidades brasileiras, a UFABC já figura nos mais altos rankings de classificação de universidades nacionais e internacionais, fazendo parte das 3,9% melhores instituições do mundo no Center for World University Ranking de 2015. A universidade também conquistou altas colocações no ranking da Times Higher Education, com 18º lugar na classificação geral das universidades da América Latina, 9º entre as brasileiras e 5º entre as federais. Além disso, conquistou mais de 100 prêmios de pesquisa e inovação e altíssimas classificações de produção científica e internacionalização. (Confira aqui o levantamento completo dos dados da UFABC que Ramos apresentou)

Avanços na ciência

Helena Nader parabenizou a universidade e comentou que segue o desenvolvimento do projeto inovador da universidade desde sua concepção. “É uma alegria ver que a UFABC começou muito bem e continua crescendo, embora o Brasil enfrente uma fase complicada de financiamento”, disse.

A presidente da SBPC apresentou dados sobre a pesquisa científica no País, e declarou ser uma entusiasta do Brasil. Ela afirmou que é incrível o que se conseguiu avançar em tão pouco tempo, mostrando o crescimento na produção científica, impacto e citações, desde 1985, que passou de 10 mil artigos publicados para aproximadamente 610 mil artigos, e o impacto que cresceu de 1 a 3,5, segundo dados do InCitesTM.

Nader também apontou a importância da ciência para a manutenção do sistema econômico e para o desenvolvimento do País. “Nós éramos a 7ª maior economia do mundo, agora somos a 9ª. Nós só não caímos mais por conta da ciência”. A presidente explicou como a ciência teve papel importante no desenvolvimento de tecnologias de alimentos, nas ciências espaciais, no controle biológico de insetos, na produção de celulose, na produção de animais e na extração de petróleo em águas profundas, elementos que sustentam a economia brasileira nos dias de hoje.

A presidente da SBPC destacou também a importância internacional de descobertas que relacionaram a zika à microcefalia, realizadas por pesquisadores e institutos brasileiros, graças à tradição de pesquisa sobre doenças infectocontagiosas, iniciada pela Fiocruz.

Investimentos em CT&I

Apesar disso, a cientista afirma que a nossa economia sofre uma crise no momento porque se baseia quase integralmente na exportação de materiais de baixa tecnologia, e que a situação precisa ser revertida por meio do investimento advindo de empresas, não só do governo, nos setores de pesquisa e inovação. Atualmente, o setor empresarial é responsável por apenas 40% dos investimentos em ciência e tecnologia, incluindo empresas estatais, e deixando o restante nas mãos do governo. Esses dados são preocupantes, para ela, quando comparados a países como a Coreia, que tem aproximadamente 75% dos investimentos vindos do setor empresarial.

A presidente da SBPC afirma, porém, que muitas mudanças são necessárias para que o País possa avançar, e apresentou dados sobre o investimento em CT&I em relação ao PIB nacional, que tinha por meta chegar a 2% até 2020, mas está muito distante disso, com apenas 1,24%, atualmente. “Como você pode expandir o desenvolvimento científico em todo o território brasileiro e manter o mesmo ou menor financiamento?”, questiona.

Nader critica outras medidas públicas, como a aprovação da PEC 31/2016, pelo Senado, que permite desvincular até 30% dos recursos com destino específico para serem utilizados para cumprimento da meta de estados, Distrito Federal e municípios no fechamento de contas, o que prejudica os investimentos em CT&I, já reduzidos com a inclusão da pasta de Comunicações no ministério.

A professora também criticou os oito vetos ao Marco Legal da CT&I, impostos na ocasião de sua sanção em janeiro, que desestimulam os setores privados a investir em tecnologia e inovação, e pediu para que os pesquisadores se unam para lutar e reverter essa situação.

“Nós estamos aquém do que podemos, pois nós somos muito bons. Deem as condições, que vocês verão aonde se chega”, declarou.

Internacionalização e interdisciplinaridade

Para Nader, o fraco da ciência no Brasil é a internacionalização, ponto que parabeniza a UFABC pelas conquistas. Ela destaca a importância da colaboração internacional por meio da pesquisa de J. Adams,  publicado na Nature, denominado “The Forth Age of Research”, que aponta que quanto mais colaboradores de diferentes países, maiores são as chances de o artigo ser publicado em revistas de alto impacto.

Já o ponto forte do Brasil é a interdisciplinaridade, que mesmo com a ciência muito recente, já nasceu interdisciplinar. Outro ponto positivo da ciência no Brasil destacado por Nader é a distribuição dos cursos de pós-graduação no País, que cresceu significativamente. “São Paulo era 50% da ciência no País, hoje é por volta de 30%. Não é que São Paulo tenha perdido a primazia, e sim que outros estados também estão crescendo e fazendo ciência”, afirmou. “Estamos caminhando em rumos que trarão frutos no futuro. Educação leva tempo, ciência leva tempo”, explicou.

As celebrações pelos dez anos da UFABC seguem até o fim da semana, com atividades nos dois campi, em dias alternados. Serão realizadas duas exposições: a “UFABC 10 anos”, uma exposição interativa na qual a comunidade pode colaborar com a composição do mural contribuindo com ideias de filmes e livros que representam os 10 anos da UFABC, no campus Santo André; e a “Mulheres da UFABC”, que contará com fotos e a história de mulheres que tiveram papel importante para a universidade, no campus São Bernardo do Campo. Confira a programação completa

Ludmila Vilaverde, estagiária de comunicação da SBPC, para o Jornal da Ciência