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Reunião Regional da SBPC reuniu comunidade local para discutir direitos humanos

Em meio a uma programação voltada para a divulgação da ciência e da tecnologia, a Reunião Regional da SBPC em São Raimundo Nonato, no Piauí, realizada entre os dias 20 e 23 de abril, trouxe para a comunidade local a oportunidade de participar de um debate sobre violação dos direitos humanos. A palestra, realizada na sexta-feira, 22 de abril, foi proferida pelo juiz José Henrique Torres, da Associação de Juízes para a Democracia (AJD), e pela professora da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Andreia Marreiro Barbosa.
A Reunião Regional da SBPC em São Raimundo Nonato, no Piauí, trouxe para a comunidade local a oportunidade de participar de um debate sobre violação dos direitos humanos
Em meio a uma programação voltada para a divulgação da ciência e da tecnologia, a Reunião Regional da SBPC em São Raimundo Nonato, no Piauí, realizada entre os dias 20 e 23 de abril, trouxe para a comunidade local a oportunidade de participar de um debate sobre violação dos direitos humanos. A palestra, realizada na sexta-feira, 22 de abril, foi proferida pelo juiz José Henrique Torres, da Associação de Juízes para a Democracia (AJD), e pela professora da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Andreia Marreiro Barbosa. 
Citando o escritor uruguaio Eduardo Galeano, Torres iniciou sua apresentação, argumentando que a luta social é a base dos direitos humanos: “As únicas coisas que se constroem de cima para baixo são poços, dizia o autor”. O juiz traçou um panorama da história recente dos direitos humanos no mundo e, em especial, no Brasil, desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1948. “O objetivo dos direitos humanos é proteger os mais fracos contra o poder dos mais fortes”, explicou.
Nessa linha histórica, Torres, que é também professor de Direito Penal na PUC-Campinas, passou pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, de 1966, que esclareceu que todos têm direitos à liberdade, à manifestação livre de opinião, a um nome, ao voto, a um julgamento justo. “Foi somente em 1976, com o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que os países reconheceram o alimento, a moradia, educação, saúde, previdência social e a participação cultural como direitos fundamentais humanos, garantidos de forma imediata”. 
No Brasil, todos esses direitos foram reiterados na Constituição Federal de 1988. Mas, conforme relatou o magistrado, a reforma constitucional de 2004 decidiu que os tratados internacionais não possuem estatura constitucional, ainda que estejam acima das leis nacionais. “Na pior das hipóteses, os direitos humanos estão acima da Lei”, afirmou. 
O interesse da plateia pelo tema em discussão foi tanto, que o conferencista seguiu a apresentação para muito além do tempo estabelecido de 30 minutos. “Eu fico empolgado, principalmente por ver tanta gente interessada”, comentou. 
Por uma hora e meia, o juiz tocou em temas como o perfil dos presos no País – uma população de 607 mil pessoas encarceradas, 38% delas sem condenação. Além dos presidiários, Torres alertou para outras classes que continuam tendo seu direito à liberdade violado: os loucos e os idosos. 
“Nós prendemos velhos e loucos também. Afastamos do convívio social aqueles que consideramos indesejáveis”, disse, chamando a atenção para o papel dos movimentos sociais contra os abusos do poder. O movimento antimanicomial, por exemplo, conquistou a sanção da Lei 10.216/2001, da Reforma Psiquiátrica, que determina o fechamento progressivo dos hospitais psiquiátricos e a instalação de serviços substitutivos. Em 2003, uma mobilização de aposentados, pensionistas e idosos conseguiu que fosse aprovado o Estatuto do Idoso.
Outros temas que foram apresentados foram o direito das crianças, o racismo, e o trabalho escravo. Sobre este último, com pena prevista no artigo 149 do Código Penal Brasileiro, foi lembrado que, desde 1995, 50 mil pessoas foram encontradas no País trabalhando em condições análogas ao trabalho escravo. Muitos casos como esses, conforme foi apontado por uma pessoa na plateia, ocorrem nas carvoarias do Estado do Piauí. 

Direitos das mulheres
Outro assunto que não poderia ter sido deixado de lado, são os direitos sobre igualdade de gênero. “A história da mulher é uma história de violência, dominação e subordinação. Mas, também, é uma história de lutas e conquistas”, resumiu.
Um exemplo para o Brasil é a lei Maria da Penha, sancionada em 2006, que estabelece punições mais rigorosas à violência doméstica praticada contra as mulheres. No Brasil, os dados desse tipo de violência são alarmantes: segundo Torres, todos os dias, 15 mulheres morrem vítimas de violência no País. “A morte de mulheres no Brasil é epidêmica”, diz. 
Outra forma de violência contra a mulher, especialmente as pobres, segundo Torres, é a criminalização do aborto. No mundo, 47 mil mulheres morrem todos os anos em decorrência de aborto inseguro. Aqui, a prática mata uma brasileira a cada dois dias. “A cada hora, seis mulheres são estupradas no Brasil, e nós não reconhecemos os direitos reprodutivos e sexuais delas”, protesta.  
Por várias vezes, o juiz reiterou o papel dos movimentos sociais na defesa desses direitos: “Os movimentos sociais são efetivos para evitar tragédias. Devemos todos lutar por dignidade”. 
O papel do Estado
Para a professora da UFPI, Andreia Marreiro Barbosa, a defesa dos direitos humanos passa pela educação das pessoas para a democracia: “Ou a gente problematiza o que nos é ensinado, ou a gente não implementa nada em direitos humanos”. 
Para ela, a responsabilidade de garantir o cumprimento dos direitos humanos é do Estado, mas é importante ter consciência de quem que constitui esse Estado é a sua população. “O Estado viola direitos humanos, mas nós somos parte desse Estado”, ressalta.
A apresentadora da mesa-redonda, Rute Maria Gonçalves de Andrade, organizadora local da Reunião da SBPC, contou que, ao final da apresentação, um grupo de mulheres da cidade veio a ela pedir informações sobre como elas poderiam fazer para organizar uma associação de mulheres. “É uma semente que plantamos”, disse.

Daniela Klebis – Jornal da Ciência