As dimensões da Amazônia, tanto territoriais e da biodiversidade, quanto em problemas e desafios, exige uma readequação do Fundo Amazônia (FA). Essa foi, em síntese, a visão expressada por três especialistas na questão amazônica que participaram, na última sexta-feira (12/7), da mesa-redonda “Fundo Amazônia e a Estratégia de Desmatamento Zero em 2030”, realizada na programação da 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
A 76ª RA aconteceu entre os dias 7 e 13 de julho na sede da Universidade Federal do Pará UFPA), em Belém (PA).
Criado em 2008 com o Decreto 6.527, o FA é uma reserva financeira que tem por objetivo promover projetos para a prevenção e combate ao desmatamento, a conservação e o uso sustentável da floresta na Amazônia Legal. O Fundo é mantido com recursos de países como Noruega, França, Alemanha e Estados Unidos e é administrado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A mesa-redonda contou com a participação da socióloga Edna Maria Ramos de Castro, professora emérita da UFPA, o cientista Adalberto Luís Val, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e o geógrafo Francisco de Assis Mendonça, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Edna Castro, que também é representante da SBPC no conselho gestor do FA, ressaltou a importância do Fundo para os projetos de conservação da floresta, porém chamou a atenção para o fato de que não contempla o financiamento a pesquisas científicas que deveriam orientar os projetos.
“Na primeira reunião (do conselho em 2023) que definiu as estratégias do que seria beneficiado pelo Fundo Amazônia, não tinha absolutamente nada de ciência, nem uma linha”, relatou. Segundo ela, os participantes observaram a falta de referência à ciência e ao final foi incluída uma menção breve e genérica entre os diferentes destinos do fundo.
“Mas até agora, depois da retomada do Fundo (em 2023), não houve nenhum edital para C&T e também parece que não tem nada previsto de imediato”, disse Castro, conclamando um movimento de demanda para o financiamento de pesquisas em todos os campos de estudo, sejam na biologia, nas exatas ou nas ciências humanas.
Castro também questionou o enfoque dos projetos financiados atualmente pelo FA, que prioriza o estudo de cadeias produtivas que acabam promovendo o desmatamento como o transporte de gado e soja pelos portos da região. “Precisamos de pesquisas mais interdisciplinares”, frisou.
Adalberto Val opinou que é necessário criar um fundo amazônico para o desenvolvimento econômico e social envolvendo todos os países que abrigam a floresta. “Vivemos num bioma único e, portanto, todos nós, todos os países Amazônicos devem ter na realidade um processo de investimento que sustente o desenvolvimento científico e tecnológico da região”, afirmou.
Val chamou a atenção para a necessidade de financiamento de pesquisas e projetos que conectem os jovens às suas regiões, pois boa parte deles acaba partindo para outras regiões ou países quando concluem seus estudos. “Precisamos pensar em coalisões criativas na pan-amazônia”, sugeriu o pesquisador do Inpa.
Francisco de Assis Mendonça fez um contraponto ao FA com a plataforma Floram-Aziz Ab’Sáber, uma iniciativa conjunta do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) e a SBPC que tem por objetivo a formação de gestores e pensadores dedicados à restauração das paisagens e biomas brasileiros.
“A plataforma Floran tem tudo a ver com essa ideia de Fundo Amazônia, tem tudo a ver com o desmatamento zero”, definiu Mendonça. Embora a grande preocupação hoje no Brasil e no mundo seja conter o desmatamento da Amazônia, a proposta da Floram é “reflorestamento do Brasil”. A plataforma foi idealizada pelo geógrafo Aziz Ab’Saber (1924-2012), que já previa a aceleração da degradação da paisagem décadas atrás. “Há 40 anos ele (Ab’Saber) dizia que o Brasil sozinho não vai conseguir reconstituir suas paisagens, reconstituir a sua vegetação, seus biomas, porque não terá a capacidade económica, não terá investimento com a responsabilidade e capacidade, portanto é preciso abrir esse leque”, afirmou Mendonça.
Desse ponto de vista, concluiu o professor da UFPR, o fundo Amazônia vem exatamente nesse sentido: angariar ações planetária, concentrar recursos financeiros particularmente de países que têm condições financeiras para isso para aplicar aqui no Brasil.
Assista à mesa-redonda na íntegra pelo canal da UFPA no Youtube
Janes Rocha – Jornal da Ciência