Foi na pandemia que a artista Mariana Darvenne resolveu reinventar sua arte. Se antes seus desenhos eram uma representação de sentimentos, o estudo e a experimentação trouxeram novos tons e significados às telas. Responsável pela identidade visual dos eventos temáticos da SBPC (Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência) no mês em homenagem às mulheres, Darvenne defende a busca por diferentes formas de expressão como caminho artístico.
“A pintura sempre foi uma coisa que esteve comigo, porque o meu pai sempre pintou [nas horas vagas] e comigo foi assim, eu sempre pintei, apesar de fazer também outras coisas de trabalho não relacionadas às artes plásticas. Mas na pandemia, esse processo se intensificou muito”, conta.
Reclusa em casa, Mariana começou a se dedicar mais às artes. No começo, fez aulas para aprimorar técnicas, mas o contato com a professora trouxe debates sobre a representação de suas telas. Depois, passou a integrar grupos de estudos, onde viu sua arte ser debatida coletivamente – e, assim, chegar a mais pessoas.
“Esse período foi importante também para descobrir outras coisas, porque eu acho que antes a minha arte vinha de um lugar onde eu colocava as minhas dores, e aí era menos técnica, menos pensar, menos elaborar, menos ideia. Era só eu soltando os problemas”, diz a artista, refletindo seu processo.
Até que das dores, a sua arte migrou para as memórias. No período de confinamento, Darvenne desenterrou fotografias, que se tornaram base de seus desenhos. Uma das obras dessa série, “Mãe no quarto”, estampou os banners do almoço virtual “Mulheres e meninas: poder e ciência na refundação do Brasil”, realizado pela SBPC no começo deste mês. Em 2022, outra obra, “Fotossíntese Feminina”, ilustrou a “Jornada da SBPC no Dia Internacional das Mulheres”, em março 2022.
“Na verdade, são duas imagens que foram usadas para os eventos. É interessante, porque são imagens baseadas em fotografias, uma é minha, uma autofotografia, e a outra é uma fotografia da minha mãe. E essas fotos eram o que eu tinha de referência para pintar em um momento que eu estava fechada. Porque eu não tinha como sair, ver pessoas ao vivo ou coisas do gênero. Então, eu estava revistando algumas memórias fotográficas e traduzindo elas numa técnica de azul e amarelo.”
O aprimoramento artístico e a difusão de seu trabalho fez surgir novos processos. No ano passado, Darvenne foi chamada para ilustrar uma edição da obra “O amante de Lady Chatterlay”, de D.H. Lawrence, publicada pela editora Antofágica.
“É um livro publicado em 1928, super problemático na época porque tem cenas sexuais explícitas. Ele era vendido no mercado ilegal. E, na verdade, é um livro desafiador também de ler hoje, porque ainda tem posições machistas, homofóbicas e racistas, que são da época, mas eu acho que também são do autor, e que são problematizadas pela editora nesta edição. Porque, querendo ou não, foi um livro pioneiro na época por trazer essas questões sexuais à tona”, explica.
Ao todo, Darvenne realizou 110 pinturas especialmente para a obra, explorando diferentes técnicas de pastel e óleo. “Para fazer esse projeto de pintura, eu tentei focar muito na personagem principal, que é uma mulher que se casa e, dois meses depois, o marido fica paralítico em um acidente na Primeira Guerra Mundial. Então, eles não conseguem mais transar, e ela tem uma busca de se encontrar dentro das coisas que faltam a ela.”
Este trabalho foi um grande reconhecimento para Darvenne como artista profissional, que vem colecionando criações inspiradoras em sua ainda breve trajetória. Somente para a SBPC, foram três projetos. Além dos dois quadros cedidos para os eventos do Dia Internacional das Mulheres em 2022 e 2023, ela produziu seis ilustrações especiais para a série de debates “Contagem Regressiva para o Bicentenário”, realizada em celebração aos 200 anos da Independência do Brasil, setembro passado.
Hoje, ela segue nas experimentações. Acompanha trabalhos de quem a inspira e segue descobrindo técnicas. Diz que não coloca prazos ou processos: “eu continuo vendo o que sai de dentro de mim”, conclui.
Os trabalhos de Mariana Darvenne podem ser acessados em sua página no Instagram ou em seu site oficial.
Rafael Revadam – Jornal da Ciência