Os debatedores, Carlos Alberto Aragão de Carvalho Filho, professor da UFRJ e ex-presidente do CNPq, e Vitor Francisco Ferreira, professor da UFF, destacaram a necessidade de desenvolver tecnologias para tirar o máximo de proveito da biodiversidade que o Brasil tem
Os desafios e oportunidades para o desenvolvimento da bioeconomia no Brasil foram discutidos em uma mesa redonda nesta segunda-feira, 4 de julho, durante a 68ª Reunião Anual da SBPC, que se realiza até sábado na Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), em Porto Seguro. Os debatedores, Carlos Alberto Aragão de Carvalho Filho, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-presidente do CNPq, e Vitor Francisco Ferreira, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), destacaram a necessidade de desenvolver tecnologias para tirar o máximo de proveito da biodiversidade que o Brasil tem.
“O Brasil tem um enorme potencial para explorar a química da biomassa e está há muitos anos inserido na bioeconomia global com os agronegócios. Porém, precisamos expandir essa área com novas tecnologias para o aproveitamento completo das biomassas brasileiras”, comentou Ferreira.
Entre as vantagens que o País possui nesse mercado, ele menciona que temos a disponibilidade de matérias-primas, a quantidade de terras aráveis (22% do nosso território), o espaço marinho para exploração das algas, por exemplo, além de que 15% da água potável do mundo está aqui: “Com essas vantagens, o Brasil tem possibilidade de melhorar a segurança energética e, consequentemente, grande potencial de reduzir os gases de efeito estufa”.
O problema, conforme aponta ele, é que o Brasil ainda não explora as potencialidades da biomassa, as nossas tecnologias ainda estão muito concentradas para a produção de biocombustíveis. “O Brasil importa muitos insumos de química fina, quando poderia produzi-los a partir da biomassa. As oportunidades são enormes e as biomassas não devem ser encaradas somente como matérias-primas para a produção de combustíveis, mas, também para a fabricação de novos intermediários químicos e materiais de maior valor agregado”.
Para ele, a grande e diversificada quantidade de biomassa no Brasil pode tornar a bioeconomia num poderoso instrumento para novas tecnologias, inovação e geração de emprego. Mas isso só é possível se tivermos uma política que priorize essa área, que incentive programas de pesquisa focalizados no desenvolvimento de tecnologias para a produção industrial.
As oportunidades são ainda maiores se considerar que a questão da sustentabilidade e da bioeconomia se impõem como desafios globais do século XXI, diante das perspectivas de que a população mundial ultrapasse os 9 bilhões em 2050.
“Como todos os países possuem biomassa, se você gerar uma tecnologia para biomassa em um país, você gera para o mundo todo”, diz Ferreira, que também argumenta que o modelo econômico deveria ser conduzido na direção do aproveitamento de biomassas para o desenvolvimento sustentável.
“Precisamos pensar em como vamos alimentar uma população de 9 bilhões de pessoas, em como produziremos medicamentos para as doenças que emergem, em como manteremos a qualidade da água, evitando a pobreza e a fome”.
Tendência global
Carlos Alberto Aragão de Carvalho aponta que as oportunidades de investimento na produção de bioquímicos no Brasil, a partir de fontes renováveis, notadamente a biomassa, pode gerar de US$15 bilhões a US$30 bilhões para a indústria por volta de 2030. “Segundo dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), até 2030, a contribuição da biotecnologia vai ser de US$ 1 trilhão ao ano, no mundo todo. Cerca de 80% do que se produzirá em medicina, será produto da tecnologia, por exemplo”, aponta o ex-presidente do CNPq.
Segundo ele, será quase uma imposição o aproveitamento da biomassa. A tendência é comprovada pelo crescimento da produção de biocombustíveis pelo mundo. E, nessa área, o Brasil é uma liderança – entre 1973 e 2014, a taxa de consumo de combustíveis derivados do petróleo caiu de 39,7% para menos de 15%, enquanto que hoje, a matriz energética conta com cerca de 40% de participação de fontes renováveis. A média mundial é de apenas 13%.
Nesse cenário global, o Brasil tem a vantagem da disponibilidade e competitividade de várias fontes de materiais renováveis, mas ainda tropeça em problemas como os prazos para aprovação de pesquisas clínicas – o que contribui para manter a participação do País em apenas 1% da produção de biofármacos no mundo -, além de um marco regulatório inadequado, observa Carvalho, referindo-se à Lei da Biodiversidade.
O pesquisador comenta ainda que por volta de 2020 as primeiras patentes de biofármacos de 2ª geração – que vêm apostando na produção de anticorpos monoclonais – vão expirar e haverá uma corrida global para produzi-los. “Não podemos perder essa oportunidade”, alerta.
É fundamental, portanto, tratar o setor da bioeconomia como prioritário, conclui Carvalho: “Não é suficiente ter a biodiversidade. É preciso ter as competências que vão transformar essa biodiversidade em conhecimento e riqueza”.
Daniela Klebis – Jornal da Ciência