As comunidades científicas e acadêmicas mineiras devem refletir sobre o que podem fazer para ajudar a economia do estado, que passa por um de seus momentos mais difíceis. Essa é a visão de Evaldo Ferreira Vilela, presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig), instituição que teve seu orçamento tragado pela crise econômica que atinge o país, em geral, e mais ainda o estado.
“Se não estivéssemos passando por essa crise, agora seria o momento ideal, porque temos uma comunidade bem formada, um sistema estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação de (C&TI) bem constituído, temos muitos talentos, excelentes universidades, excelentes pesquisadores e excelentes empresários, agora seria o momento de fazer a união desses esforços e criar uma nova economia”, afirmou o presidente da Fapemig em entrevista ao Jornal da Ciência.
Vilela está desde 2014 à frente da Fapemig. Há três anos ele vem assistindo a uma escalada das dificuldades financeiras da Fundação até o ponto de ter que suspender praticamente todo o programa de iniciação científica (IC) e fechar as portas para a entrada de novos pesquisadores.
Os problemas financeiros da fundação não são de agora. Assim como outras unidades da federação, a verba para a pesquisa em Minas vem do repasse de 1% da arrecadação tributária estadual. Em 2016, o então governador Fernando Pimentel (PT) determinou uma divisão desse percentual, tirando 40% do 1% e redirecionando para a Secretaria de Ciência e Tecnologia. De lá para cá, com a queda da arrecadação de impostos devido à crise econômica, os 60% da Fapemig ficaram ainda mais magros. “No ano passado, por exemplo, a Fundação recebeu tão pouco, que foi obrigada a pagar só bolsas e passar um pouco de projetos para a Secretaria, quando na verdade nós fomos criados para financiar projetos, não a Secretaria”, diz Vilela.
No início de 2018, a Fapemig mantinha 7.200 bolsas, incluindo as de IC, que representavam um dispêndio mensal de R$ 8 milhões. Ao perceber que os recursos estavam minguando, a fundação decidiu não renovar as bolsas que venciam, chegando ao fim do ano com 6.500 bolsas ativas, em um total, em dezembro de R$ 6,5 milhões.
O novo governo, de Romeu Zema (Novo), ofereceu um orçamento total de R$ 6,6 milhões mensais, tanto para as bolsas quanto para o custeio da fundação em 2019. Isso significou um corte orçamentário de 60% este ano, de R$ 180 milhões para apenas R$ 72 milhões. Os cortes obrigaram a interrupção do pagamento dos editais Universal e Pesquisador Mineiro, a suspensão de mais de cinco mil bolsas de iniciação científica e graduação e também dos novos pedidos de bolsas para mestrado e doutorado. Sobraram apenas 1.600 bolsas de pós-graduação que já estava em andamento.
Desde então a comunidade científica e acadêmica mineira vem se mobilizando para tentar preservar o dinheiro da CT&I via Fapemig. Reitores das universidades públicas e privadas, professores, estudantes e representantes de entidades ligadas ao setor mantiveram reuniões entre si e com representantes do executivo estadual. Uma concorrida audiência pública sobre o tema foi realizada este mês na Assembleia Legislativa, com o saldo positivo de ter chamado a atenção do público e arrancado declarações dos parlamentares, favoráveis às demandas da comunidade por mais apoio à ciência e tecnologia no estado. Convidados, o governador e seus secretários relacionados ao tema – do Desenvolvimento e Integração do Norte e Nordeste de Minas (Sedinor) e do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia e Ensino Superior (Sedectes) – não foram, preferiram mandar representantes.
Reflexos futuros
Adelina Reis, secretária-regional da SBPC em Minas Gerais que tem participado de todos os encontros ao lado das universidades e instituições de educação e pesquisa, comemora o apoio dos parlamentares, mas reconhece o momento como um dos mais difíceis. “Isso vai ter reflexos no futuro, em termos de formação de recursos humanos”, comentou.
Para o conselheiro da SBPC, Eduardo Mortimer, o corte dos recursos da Fapemig abre um grave precedente, podendo comprometer todos os programas de pós-graduação. “Mais de 80% da pesquisa científica está assentada nos programas de pós-graduação”, disse Mortimer.
As negociações prosseguem, afirmou Vilela: “ainda não jogamos a toalha”. No entanto, ele acha que será preciso um esforço adicional – que não pode ser feito apenas pela Fapemig – de mostrar ao governo e à população a importância da CT&I no estado. “Se somos tão importantes, se produzimos tanto conhecimento, o que podemos fazer para que esse conhecimento vire novos negócios, novas cestas de impostos, que possam revigorar a economia?” questiona. E completa: “Precisamos ir além da publicação de paper”.
Janes Rocha – Jornal da Ciência