As nove vencedoras do 4º Prêmio “Carolina Bori Ciência & Mulher” participaram de uma visita guiada no dia 11 de fevereiro – Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência – ao Museu do Ipiranga. A visita foi parte da homenagem que a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) prestou às futuras cientistas, em parceria com o Museu Paulista. A visita contou com a participação de integrantes da Diretoria da entidade e da ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos.
Ao lado dos integrantes da Diretoria da SBPC, dentre eles o presidente e os vice-presidentes da entidade, respectivamente, Renato Janine Ribeiro, Fernanda Sobral e Paulo Artaxo, da presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Helena Nader, e das jovens cientistas premiadas, a ministra conheceu as novas instalações e visitou a exposição temporária “Memórias da Independência”.
Para Luciana Santos, museus como o do Ipiranga são fundamentais para a compreensão dos conceitos que formam um país. “Essa visita ao Museu do Ipiranga tem essa dimensão. E o MCTI tem todas as condições de fazer uma articulação com o Ministério da Cultura para ampliar equipamentos como esse”, declarou a ministra. “Além dos aspectos relacionados às ciências humanas, o restauro de obras requer especialistas das mais diversas áreas do conhecimento”, acrescentou.
Paulo Garcez, docente e curador do Museu do Ipiranga, que orientou o grupo na visita, ressaltou que o museu tem se direcionado atualmente a um público mais amplo e diversificado e por isso tem como missão abordar a cultura material resistente no Brasil para entender e melhorar a sociedade. “São 12 exposições que nós procuramos colocar aos nossos sujeitos sociais a multiplicidade brasileira, a diversidade do nosso povo em questão a partir de acervos diversos (novos e antigos), convidando as pessoas a pensarem sobre a nossa realidade, sobre os desafios para o futuro, além de aprender e compreender como o passado pode auxiliar a seguir novos caminhos”, afirmou.
Garcez ressaltou ainda que um dos desafios do Museu é a revisão de personagens históricas que foram cultuadas durante muitas décadas, como é o caso dos Bandeirantes. “Hoje essas pessoas são muito mais criticadas do que eram, obviamente, há 100 anos. Hoje há muitos movimentos sociais que enfaticamente colocam essas construções memoriais em discussão. E nós fazemos parte desse esforço de entender que as construções sobre o passado são sempre construções que devem ser colocadas em discussão, podem ser revistas, criticadas e um museu de história é um bom lugar para nós refletirmos como o passado é recontado”, explicou.
Para Renato Janine Ribeiro, presidente da SBPC, a visita atendeu à proposta da entidade de conhecer um museu tão emblemático da Independência do Brasil, além de lembrar as ações da entidade em comemoração ao Bicentenário. “O governo passado, por razões ideológicas, não prestigiou a Independência do Brasil nos seus 200 anos. Mas a SBPC tem desenvolvido uma série de atividades relativas ao Bicentenário da Independência que se iniciaram com uma ‘virada’ em setembro de 2021, entre outras discussões. Acreditamos que é preciso pensar o passado para construirmos o futuro e por isso, debates em torno da Independência é muito importante para a SBPC”, comentou.
Janine Ribeiro destacou a exposição do Museu que traz as diferentes lutas pela Independência. “Lembrando que em março vamos comemorar a Batalha do Jenipapo (um dos confrontos mais sangrentos da Guerra da Independência do Brasil, ocorrido no dia 13 de março de 1823, às margens do rio de mesmo nome na vila de Campo Maior, no Piauí), com a realização da nossa Reunião Regional no Piauí.”
A vice-presidente da SBPC, Fernanda Sobral, que coordenou a avaliação do prêmio, destacou também os questionamentos sobre as versões oficiais dos acontecimentos históricos. “A visita foi maravilhosa. Vimos as interpretações clássicas da nossa história, mas com possibilidade de reinterpretações na atualidade.”
Denise Barrozo de Paula, graduada de Psicologia na Universidade Municipal de São Caetano do Sul, São Paulo, e uma das vencedoras da área de Humanidades, por já conhecer o museu antes da reforma, disse que se surpreendeu com a nova proposta. “Pelas lembranças que eu tinha, melhorou muito. Me surpreendi porque não havia a explicação de algumas obras como atualmente. Um dos exemplos são as obras que retratam os bandeirantes. Antes, o museu não nos convidava a pensar o que estava por trás das obras. Hoje o local se atualizou, trazendo um novo olhar, um contraponto, sem deixar o que faz parte da história, mas fazendo a gente pensar quais são as narrativas existentes e que há outras visões. O museu está muito mais verdadeiro e acolhedor. Me senti mais identificada com a história, sabendo que há outras percepções além do colonizador”, salientou.
Gabrielly Santos Souza, estudante do Centro de Ensino Médio Elefante Branco, uma das vencedoras do Ensino Médio pelo projeto “Biodiversidade, ciência e juventude negritude, política e protagonismo juvenil”, concorda com Paula que a discussão sobre o passado é fundamental. “Esse novo olhar foi uma das grandes surpresas da visita. Eu gostei de pensar sobre as novas narrativas sobre o nosso passado” disse.
Isabelle Almeida Novais, estudante da Escola Estadual Fernão Dias Paes, também vencedora no Ensino Médio, destacou a companhia do professor Garcez à visita. “Para mim a companhia do docente explicando os acontecimentos históricos de forma aprofundada, mostrando as diferentes faces por trás da “Independência do Brasil”, que é formada não só por um fato isolado como o que eu vi nos livros, mas por um conjunto de memórias, foi enriquecedor. Os documentos e obras do museu não estão colocados como uma forma de verdade absoluta, o que faz com que os visitantes se coloquem em uma posição crítica. Esse tipo de visita deveria ser mais explorado no ambiente escolar, por estimular uma aprendizagem ativa, que não dependa somente de textos explicativos em uma apostila, mas dos diversos fragmentos de memórias que são responsáveis pela visão que temos hoje acerca da história”, disse.
Alessandra Stefanello, graduanda de Letras na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), uma das vencedoras da área de Humanidades pelo trabalho “Um outro olhar para a língua: a posse da terra e o direito à propriedade”, disse que a visita reforça sua motivação a questionar as versões da História. “Tem algo no meu trabalho que é questionar a constituição vigente e do que entendemos do que é História. E ali (no museu) eu pude entender questões que atravessam a minha pesquisa. Ouvir o professor Garcez me deixou mais confortável em questionar, em tentar entender o que de fato aconteceu no Brasil. E isso me motiva a fazer o mesmo. Claro em outra área, de outro modo, mas (ciente) de que a História é passível de ser questionada”, afirmou.
Ariane Leite do Nascimento, graduanda em Ciências Biológicas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), vencedora na área de Biológicas, e Camily Pereira dos Santos, estudante do curso Técnico em Informática integrado do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, uma das vencedoras do Ensino Médio, disseram que a visita as deixou mais reflexivas. “As exposições nos convidam a olhar o passado e pensar como queremos o futuro do País”, disse Nascimento. Santos, destacou que além da arquitetura, ficou impressionada com as obras de arte, da maneira com elas representavam a realidade de um povo.
Amanda Guimarães Melo, graduanda em Matemática na Universidade Federal do Sergipe (UFS), e Sara Lüneburger, formada em Química pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), vencedoras na área de Engenharias, Exatas e Ciências da Terra, ressaltaram que a visita foi uma experiência inesquecível e de muito aprendizado.
Lüneburger comemorou também a proposta do Museu de retratar a história do Brasil com outros olhares. “É muito importante ver os esforços da instituição em retratar uma história mais real, mais diversa. E isso é muito válido”, concluiu.
Vivian Costa – Jornal da Ciência