Tanto a cultura popular quanto o rigor científico devem ser levados em consideração quando o assunto é planta de uso popular. Essa foi a síntese da conferência “Plantas de uso popular: Verdades e mitos”, proferida pela professora Cássia Cristina Fernandes Alves, pesquisadora do Laboratório de Química de Produtos Naturais do Instituto Federal Goiano (IF).
A apresentação, que integra a Reunião Regional (RR) da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), reuniu um público de aproximadamente 100 pessoas no Auditório Goiano do campus Rio Verde do IF, e aproximou nomes conhecidos na região do Cerrado brasileiro, como a Gabiroba ou o Breu branco, de suas nomenclaturas na literatura científica, no caso a Campomanesia e a Eugenia klotzschiana.
Especialista no assunto, Alves falou sobre todas as etapas da pesquisa, desde a concepção no laboratório, em que ela ressalta que a revisão bibliográfica tem um papel importante quando se estuda os potenciais usos das plantas: “Não adianta, a parte mais importante da pesquisa é a revisão bibliográfica. O Brasil, sobretudo, o Cerrado, é maravilhoso em matéria de biodiversidade, mas o pesquisador tem de saber sobre aquilo que vai pesquisar, porque mesmo com toda a variedade, você está sujeito a entrar no tema de outra pessoa”, destaca.
Após a revisão bibliográfica, vem a parte dos recursos para pesquisa, em que a pesquisadora do IF Goiano vê uma falta de interesse da indústria para investir em pesquisas no Cerrado, além da crise por qual passa o País, que reduziu os aportes financeiros. Alves destacou o tema da RR como provocação para a inovação e a saída da crise.
“Qual o tema desta reunião que nós estamos participando?”, e seguiu: “‘Cerrado: Ciência, Inovação, Crescimento Econômico, Desenvolvimento Sustentável e Sociedade’”, respondeu. “Nós precisamos inovar nos métodos e ser firmes na ação, seguir em frente com nossas pesquisas para alcançarmos o crescimento econômico e o desenvolvimento para esse bioma que nós amamos. É um campo muito rico e importante para nossa área de atuação e nosso País”, defendeu.
A pesquisadora do Laboratório de Química de Produtos Naturais falou também dos processos, em que ela salientou que os métodos são impreteríveis para uma boa pesquisa em produtos naturais. “O horário de coleta apresenta diferentes reações das composições químicas, ou seja, você não pode esperar a extração do mesmo óleo essencial de uma planta que você colheu às seis da manhã ou às oito da noite”, exemplificou.
Se valendo de um chá bastante popular no Brasil, Alves mostrou como o rigor científico auxilia a cultura popular neste sentido: “Dizem que o chá de erva cidreira tem efeito calmante, será que o efeito será o mesmo com a panela tampada ou destampada? Com a água fervendo ou não? Tudo isso influencia”. Isso porque o princípio ativo é um óleo essencial volátil, que quando a água verve, ele evapora. Por isso a tampa é importante.
Embora Alves tenha falado sobre os problemas para levantar recursos para a pesquisa, ela apontou também a necessidade de um ambiente mais aberto e alerta para radicalismos: “Nem tudo que é natural é bom e nem tudo que é sintético é ruim.”
Você pode usar o conhecimento popular para se aprofundar em um estudo sobre um determinado composto e chegar a um produto comercializável. A professora, portanto, refuta a dicotomia cultura popular x método científico e prefere a colaboração entre as áreas. “Existem muitos indícios e poucas comprovações acerca de muitas plantas que podem ser benéficas, mas a pesquisa científica não é tão rápida quanto os relatos, a sabedoria popular. Então, eu acho que as duas coisas precisam caminhar juntas. O cientista precisa da sociedade e a sociedade precisa da ciência”, concluiu.
Marcelo Rodrigues, estagiário da SBPC, para o Jornal da Ciência