Esta é uma célebre expressão do romancista francês Romain Rolland, que muitos conhecem porque Antonio Gramsci a citou, e que se aplica como uma luva ao Brasil de hoje. Nosso presente é lastimável, exige uma atitude de defesa da ciência, tecnologia, educação, cultura, saúde e meio ambiente. Tivemos governos, no passado, que reduziram verbas para essas áreas – e todas as vezes protestamos.
Lembro até uma vez, por volta de 2000, quando eu era secretário da SBPC e propus uma espécie de kit-protesto, porque os cortes eram tão frequentes que exigiam tomadas de posição igualmente constantes. Mas uma ressalva deve ser feita: nenhum governo, dos que lembro, que cortou verbas para essas áreas o fez por ojeriza ou desdém por elas. Nós brigávamos, reclamávamos que elas deviam constituir prioridade, mas sabíamos que o problema era “apenas” não serem prioridade.
Hoje, temos um governo que olha ciência, educação, tecnologia, cultura, saúde e meio ambiente como ameaças. Ele é contra elas. Isso eu nunca vi em minha vida, aqui nem em outros países. Mesmo Trump, escolhido como modelo por nosso governo, pelo menos comprou vacinas. Não vacinou, o que Biden tem feito com dinamismo admirável. Mas nenhum governo foi tão contra a inteligência contra o atual governo do Brasil.
Esse, o pessimismo da inteligência, a percepção preocupante do que está acontecendo e que exige, de nós, uma constante atuação em favor – repito – da ciência, educação, tecnologia, cultura, saúde e meio ambiente.
Mas há também o otimismo da vontade. Não por acaso, uma por uma das áreas que mencionei vale ouro na sociedade em que estamos entrando. Não por acaso, na economia que prospera no Primeiro Mundo, hoje, cada uma dessas áreas injeta muito mais valor do que a conversa atual dos conservadores em favor da desregulamentação, da perda de direitos trabalhistas e sociais, da redução dos cuidados ambientais.
Qualquer pessoa que leia a imprensa internacional, e mesmo a nacional mais qualificada, sabe que os consumidores europeus preferem, cada vez mais, pagar um pouco mais por produtos ambientalmente corretos do que por aqueles que são fruto da destruição da natureza. Sabe que há entidades que monitoram a exploração do trabalho infantil e boicotam a compra de produtos que o utilizam. Sabem, finalmente, que o movimento Sleeping Giants alerta as empresas quando aparecem anúncios delas em YouTubes negacionistas, racistas ou mentirosos.
Deveriam saber também que o Financial Times está interessado até o pescoço no que ele chama de Moral Money, que traduzido em miúdos seria algo como Dinheiro Ético: a preocupação de que o capital não seja investido em ações que sejam imorais. É uma empreitada dificílima, porque – como já dizia um romano – “pecus non olet”, o dinheiro não cheira, e o capital(ismo) é marcado por uma grande indiferença ética, para não dizer coisa pior. Mas que um dos principais veículos do pensamento capitalista se empenhe nisso é um sinal promissor de mudança, de mudança que veio, creio eu, para ficar.
Por que afirmei que este é o otimismo da vontade? Porque nos próximos anos, passado o pesadelo sanitário mundial e o pesadelo político nacional, haverá que reconstruir o Brasil – e quais serão os fatores mais importantes para isso? Não será a taxa de juros, não ela sozinha. Não será a perda de direitos trabalhistas, sociais e ambientais. Será – na qualidade de principal dentre todos os fatores envolvidos – este conjunto nosso que é composto pela ciência, a educação, a tecnologia, a saúde, a cultura e o meio ambiente.
Este será nosso papel. Por isso, a SBPC nesta altura tem que ser, um pouco como o bifronte deus romano, Jano: tem que olhar para este passado/presente assustador e enfrentá-lo, formando o mais amplo arco de alianças que permita limitar e reverter a destruição. Mas também precisa encarar o futuro e prepará-lo. A pior coisa será, quando tivermos a oportunidade de reconstruir o Brasil, não termos um projeto consistente de como usar toda a inteligência de que dispomos para fazer um País de alta qualidade.
*O artigo expressa exclusivamente a opinião de seu autor