Os desafios do Brasil na exploração da Amazônia Azul

No primeiro dia da 72ª Reunião Anual da SBPC em sua versão virtual e estendida, pesquisadores e especialistas debatem o potencial econômico e energético da costa oceânica brasileira

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Às vésperas da entrada da Década do Oceano (2021-2030), instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil se encontra na necessidade de investir na ampliação das pesquisas científicas e tecnológicas visando o melhor aproveitamento da ampla capacidade do território de 300 milhas e 9,5 mil quilômetros da Costa Leste.

Esta foi a indicação de pesquisadores e profissionais da área oceanográfica durante o Painel “Ciências do Mar: Herança para o Futuro”, que abriu o primeiro ciclo da versão estendida e virtual da 72ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência (SBPC), nesta terça-feira (1/9).

O debate, mediado pelo professor Jaílson Bittencourt de Andrade, da Universidade Federal da Bahia, contou com a participação do almirante de esquadra Marcos Sampaio Olsen, diretor geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha; Segen Farid Estefen, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Helenice Vital, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN); Alexander Turra, da Universidade de São Paulo (USP), e Humberto Alves Barbosa, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Em sua exposição, o almirante Olsen falou das diretrizes da Política Nacional de Defesa (PND) para a atuação da Marinha, que estabelece a estratégia de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) para a atuação no campo oceanográfico. Ao contrário das demais forças armadas, a Marinha não tem um instituto próprio de pesquisas, atuando em parceria com a academia. Olsen relatou um dos maiores desafios recentes enfrentados pela força, que foi o combate ao crime ambiental de derramamento de óleo na costa nordestina em 2019.

O almirante, assim como outros debatedores, defendeu a criação do Instituto Nacional do Mar (Inmar) e disse que a Marinha está empenhada em somar esforços com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) para criação do instituto. “A ideia é atuarmos preliminarmente ao instituto congregando a comunidade científica e os recursos”, comentou.

O engenheiro Sergen Farid Estefen, professor titular de estruturas oceânicas e tecnologia submarina do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe/UFRJ), afirmou que o derramamento de óleo na costa do Nordeste no ano passado evidenciou a necessidade de maior integração da comunidade cientifica para que ações de proteção da costa oceânica brasileira sejam cada vez mais efetivas.

“A implantação de tecnologias de monitoramento da nossa costa, tanto por radares quanto satélites se mostra como uma das prioridades que teremos em relação à prevenção e mitigação nos próximos anos”, disse Estefen. Para ele, o país tem que ter estratégias, não só para proteção da costa, mas também para aproveitar os benefícios da chamada economia azul, que se produz no oceano e na qual o Brasil tem como destaque a produção de petróleo no mar, ampliada com a descoberta das reservas do pré-sal.

O petróleo é o produto mais conhecido da economia azul, mas Estefen citou a importância do transporte marítimo, tanto de cabotagem quanto para exportação e importação de produtos e commodities e o segmento de energia ainda pouco explorado. “Estamos em fase pré comercial do aproveitamento de ondas, marés, correntes para que sejam fontes convertidas para eletricidade ou usadas na dessalinização”, disse.

A professora e geóloga Helenice Vital destacou o papel dos oceanos como o maior sistema de suporte à vida do planeta e também apontou o potencial econômico. “Estima-se que em 2030 aproximadamente US$ 3 trilhões serão gerados anualmente em setores oceânicos como transporte, pesca, turismo e energia”, afirmou. Na visão dela, no entanto, a escala, o ritmo e a prática atuais da descoberta e observação cientifica não estão acompanhando as mudanças no oceano e nas condições humanas. “Precisamos de mudanças fundamentais na maneira como os pesquisadores se relacionam com os tomadores de decisão para co-criar conhecimento que irá abordar problemas urgentes de desenvolvimento”, afirmou Helenice Vital, conclamando a um maior compartilhamento de informações entre os pesquisadores e uma maior liberdade de pesquisa para expandir o conhecimento.

Alexander Turra, que também é membro do grupo de especialistas do processo de avaliação do meio ambiente marinho junto às Nações Unidas, trouxe dados do relatório recente da Comissão Oceanográfica Intergovernamental que abrange o período 2010-2014, sobre como a ciência oceânica está sendo produzida no mundo. Segundo ele, o Brasil tem despontado com aumento da produção de pesquisas na área e tem uma posição de destaque por várias razões, uma delas é a infraestrutura de instituições, laboratórios, em especial os flutuantes civis e militares. “Em termos de publicações, o Brasil está em primeiro lugar na América do Sul com 3,2 mil ‘papers’ publicados e 51 mil citações no último levantamento”. Para Turra, houve um aumento da produção porque o país declarou, naquele período, a pesquisa como prioridade pública, ou seja, houve uma política de estado que levou a uma mudança no cenário.

Humberto Barbosa, que também é membro do conselho técnico cientifico do Instituto Nacional do Semiárido do MCTIC, disse que o ponto principal, quando se fala em herança é tecnologia e inovação. “Se a gente está falando de infraestrutura científica, de redes de pesquisa interinstitucional e interdisciplinar para fortalecer pesquisas sobre os mares, obviamente que uma herança para o futuro parte do princípio da tecnologia e inovação”, afirmou.

Barbosa também chamou a atenção para as lacunas existentes no Brasil entre a academia e centros operacionais, principalmente em função da falta de recursos humanos qualificados. Nesse sentido, afirmou, a capacitação se tornou um desafio para o País.

Assista ao debate na íntegra no canal da SBPC no YouTube, clicando neste link.

Confira toda programação da 72ª Reunião Anual da SBPC: http://ra.sbpcnet.org.br/72RA/

Jornal da Ciência