O Brasil é um grande produtor de ciência, mas ainda deixa muito a desejar quando o assunto é inovação. O diagnóstico é do presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Mario Neto Borges, que participou nessa segunda-feira, 23, de mesa-redonda para discutir o financiamento da ciência brasileira e as agências de fomento n 70ª Reunião Anual da SBPC, em Maceió (AL). O relato de Borges é confirmado pelas posições ocupadas pelo Brasil nos rankings do setor: enquanto ocupamos a 13ª posição em produção de ciência, amargamos a 69ª posição em inovação.
Segundo ele, os números mais recentes revelam que o Brasil ganhou algumas poucas posições no ranking da inovação, subindo para 64º. “Embora tenha melhorado, é uma situação muito constrangedora, dado o potencial do País”, analisou. Para o presidente do CNPq, três fatores têm impedido o Brasil de transformar o conhecimento científico produzido em riqueza, por meio da pesquisa aplicada e da inovação: a burocracia, a baixa integração entre academia e empresas e a falta de recursos que alavanquem o sistema.
O CNPq tem trabalhado na redução burocrática, terreno onde possui capacidade própria de colaborar com a solução. Segundo Mario Neto Borges, o Conselho está mudando seu método de análise de projetos para focar no resultado do processo científico. “Nós sabemos que o que interessa não é a contabilidade ao fim de um projeto, mas, sim, o resultado da pesquisa”, declarou. Além disso, o CNPq passará a usar um sistema de amostragem na análise desses resultados, diminuindo a carga burocrática de avaliação de milhares de projetos financiados pela agência de fomento.
No campo da falta de recursos, que assombra todo o setor, a presidente do Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap), Maria Zaira Turchi, lembrou que tão importante quanto o aumento de verbas para a ciência é assegurar um fluxo confiável desses aportes. “É muito importante garantir a regularidade e a confiabilidade dos projetos existentes”, reforçou. Atualmente, o Confap participa de diversos projetos em parceria com ministérios e agências de fomento, organizando o financiamento de milhares de pesquisas e dos bolsistas que as conduzem.
Uma ferramenta essencial para o sucesso do financiamento mediado pelas Fundações de Amparo (FAPs) é a definição de percentuais de investimento obrigatório em pesquisa e desenvolvimento nas constituições e leis estaduais. Mas a prática tem demonstrado que, infelizmente, esses compromissos legais não têm sido suficientes para garantir a chegada dos recursos. “Se não houver efetivamente empenho dos governos, mesmo que esteja previsto na Lei, o repasse não é cumprido”, lamentou a presidente do Confap. Um modelo que continua sendo perseguido é o do Estado de São Paulo, onde a Fapesp tem repasses assegurados constitucionalmente e pagos no sistema de duodécimos, o que garante um fluxo seguro mês a mês para a continuidade dos projetos.
No terceiro apoio do tripé apontado por Mario Neto Borges, o da maior integração entre academia e empresas, entram projetos tocados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). “Como colocar a ciência básica para funcionar em projetos efetivamente aplicados que se transformem em produtos que possam movimentar a economia brasileira? Isso é um processo complicado e uma das missões da Finep”, explicou Wanderley de Souza, diretor de Desenvolvimento Científico e Tecnológico da Finep. Para cumprir essa missão, a financiadora tem investido pesado nos centros geradores de inovação.
Segundo Souza, nos últimos 15 anos a Finep já investiu recursos em 24 parques tecnológicos em 13 estados e em 90 incubadoras localizadas em 21 estados. No mesmo período, R$ 30 bilhões foram aportados por meio de crédito em empresas inovadoras e outros R$ 3,5 bilhões via subvenção econômica. “Tudo isso tem gerado um ambiente inovador que explica parte da melhora no índice de inovação”, analisou o diretor.
Mais recursos devem chegar na Finep com a aprovação recente de um empréstimo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no valor de US$ 1,5 bilhão para concessão de créditos pela Financiadora. Souza lamentou, no entanto, que o Tesouro Nacional tenha vetado um segundo empréstimo, de US$ 1 bilhão, negociado continuamente há vários anos e que serviria para reforçar a linha de não reembolsável do banco.
Os diagnósticos otimistas dos palestrantes, ainda que os entraves tenham sido reconhecidos no setor, geraram reações da plateia, que cobrou posições mais firmes na busca do aumento dos recursos para ciência, especialmente para os bolsistas. A presidente de honra da SBPC, Helena Nader, e membros da diretoria da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) pediram especial atenção às bolsas de pós-graduação, tanto para pesquisa básica quanto aplicada, segmento que tem sofrido particularmente com o estrangulamento de verbas para o setor.
Mariana Mazza – Jornal da Ciência