Parlamentares prometem apoio para recomposição do orçamento 2021 da Capes

GT da SBPC sobre políticas da Capes debateu nessa quinta-feira com congressistas, pesquisadores e jornalista estratégias para reverter previsão orçamentária que compromete o sistema de pós-graduação nacional

10-09-2020-gt-da-capes

O Grupo de Trabalho da SBPC sobre políticas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) realizou nessa quinta-feira, 10 de setembro, uma discussão sobre os impactos do Projeto de Lei Orçamentária para 2021 (PLOA 2021) na agência. A proposta que o governo enviou ao Congresso condiciona 33,7% dos já parcos recursos da Capes destinados ao pagamento de bolsas de Ensino Superior e Pós-graduação, o que torna impraticável o pagamento do benefício a partir de agosto.

O debate contou com a participação do ex-presidente da Capes, Abílio Baeta Neves, da deputada Margarida Salomão (PT-MG),  do senador Marcelo Castro (MDB/PI) e do professor-titular do Departamento de Bioquímica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e conselheiro da SBPC, Carlos Alexandre Netto. Também participaram a repórter da revista Carta Capital, Thais Reis Oliveira, e o coordenador do GT sobre políticas da Capes, Reinaldo Ramos de Carvalho. A vice-presidente da SBPC, Fernanda Sobral, coordenou o painel. Segundo ela, o objetivo da discussão foi buscar subsídios para formar uma estratégia de atuação no Parlamento para reverter essa previsão orçamentária para ciência e tecnologia.

A trajetória de diminuição de financiamento para educação e CT&I no Brasil já dura uma década. Como ressaltou Carlos Alexandre Netto, isso compromete o futuro da pesquisa e da inovação, fontes importantes de riqueza de um país hoje em dia. Em 2019, o orçamento da Capes foi de cerca de R$ 4,2 bilhões, em 2020, caiu para R$ 2,8 bilhões. A previsão para 2021 é de R$ 1,9 bilhões, mas 1/3 está condicionado a créditos futuros. “Chegamos a um orçamento semelhante a 2010”, observou. Somado a isso, a Portaria no 34, publicada pela Capes  em 9 de março de 2020 já reduziu em cerca de 10% o total de bolsas de pós-graduação permanentes financiadas pela agência desde sua implementação. “Isso não é positivo. O número de bolsas de cota permanente está diminuindo e a Capes está aumentando as bolsas empréstimo no lugar, o que gera uma situação de insegurança e acaba causando desinteresse dos estudantes pela pós-graduação”, apontou, alertando que o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) teve cortes ainda maiores, de ordem de 50%. “É importante que o Parlamento entre nessa questão, para que haja reforço no orçamento da Capes. É preciso aumentar a dotação, mas também corrigir os valores das bolsas, que não são ajustadas há 7 anos”, alertou.

Segundo Baeta Neves, que presidiu a Capes entre 1995 e 2003 e depois entre 2018 e 2018, recuperar esses recursos condicionados em 2021 como crédito suplementar será muito difícil. “Essa forte restrição orçamentária pode corroer o sistema de pós-graduação. Recompor o orçamento é fundamental, as instituições precisam dessa recomposição e a tarefa de recomposição ficou mais pesada. Por outro lado, é possível, sim que a Capes repense seus instrumentos de ação e que a gente discuta que é realmente necessário para o desenvolvimento da pós-graduação no Brasil. Mas para tudo isso, a gente precisa de recursos, ou condenaremos nossas universidades a um retrocesso brutal, e a sociedade brasileira a cada vez maior dependência de quem fornece conhecimento num mercado global cada vez mais exigente.”

Os dois congressistas presentes no painel se comprometeram a apoiar as reivindicações da comunidade científica e acadêmica no processo de tramitação do PLOA. O senador Marcelo Castro sugeriu inclusive uma “cruzada” na Casa para repor o que foi tirado. “O orçamento não é feito só pelo governo, o Congresso também participa e está alerta”, disse.

Médico com especialização em Psiquiatria, Castro foi bolsista da Capes quando fez sua pós-graduação na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e reconhece que o benefício é vital para atrair e manter pesquisadores nas universidades. Ele criticou a queda no orçamento tanto da Capes quanto do CNPq. “Infelizmente, pela composição dos ministérios, a gente vê que não são preocupação desse governo as áreas de educação, ciência, tecnologia e inovação. O orçamento veio muito aquém do esperado”, lamentou.

A deputada Margarida Salomão também garantiu que o Congresso não deixará que as bolsas de estudos de pesquisadores fiquem comprometidas em 2021, mas advertiu que será necessária uma intervenção bastante proativa, considerando o cenário de crise econômica do País, agravado pela pandemia de coronavírus.

“Os números mostram com clareza que retrocedemos. Estávamos em um quadro de expansão e essa interrupção abrupta que vem dos últimos quatro anos é desastrosa, porque desorganiza aquilo que estava se estabelecendo e que a rigor precisava se consolidar. A pós-graduação brasileira é um imenso sucesso. Não faz sentido mexer em time que está ganhando. Não é que não podemos redesenhar o sistema. O que não podemos é desmanchá-lo”, disse, acrescentando que os cortes previstos nas universidades federais também estão preocupantes, em torno de R$ 1 bilhão.

A deputada disse que será necessário rever a questão do engessamento orçamentário imposto pelo teto de gastos. “Com essa Emenda Constitucional 95, numa situação de crise aguda como a que estamos atravessando, torna-se quase que impossível orçamentar. Este ano estamos funcionando com base no chamado Orçamento de Guerra, que autorizou o governo a fazer desembolsos que impediram que a crise social e econômica alcançasse um patamar ainda mais grave. É muito possível que teremos que trabalhar em regime excepcional também no ano que vem.”

Para a jornalista Thaís Oliveira é importante que a sociedade se engaje nesse movimento para que a pressão sobre o governo para reverter o orçamento seja mais eficiente. Segundo ela, a pandemia abriu uma janela de oportunidade para reforçar o valor da ciência, mas ressaltou que o assunto orçamento ainda é muito hermético para a população geral. “A ideia de envolver a sociedade nessa luta tem que passar por quem será atingido por esses cortes”, sugeriu a repórter da Carta Capital. “As pessoas reconhecem que é importante investir em educação e ciência, tecnologia e inovação. Mas não conhecem os meandros desse processo (de distribuição orçamentária|), de onde vem o dinheiro, o que significa, etc..”

O vídeo completo do debate está disponível no canal da SBPC no YouTube.

Jornal da Ciência