Uma pesquisa realizada junto a professores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal da Bahia (UFBA) acende um alerta: uma boa parte da população brasileira tem uma visão negativa das universidades públicas.
“Mais ou menos metade do Brasil, até um pouquinho mais do que a metade, não confia nas universidades públicas, acredita que as universidades particulares são melhores do que as públicas – a despeito dos índices que a gente utiliza para mensurar indicarem totalmente o contrário – e acredita que as universidades públicas promovem mais ideologia de esquerda do que educação de qualidade”, sintetizou Pablo Ortellado, filósofo e professor da USP e autor do estudo, junto com Waldomiro J. Silva Filho, escritor e professor titular de Filosofia na UFBA.
Intitulada “Percepções sobre a universidade pública e pluralidade na universidade”, alguns dados preliminares da pesquisa foram apresentados dia 22 de maio durante debate online, promovido pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). A iniciativa e coordenação do debate foram do pesquisador emérito da Fiocruz e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Samuel Goldenberg.
Ortellado, que também coordena o Monitor do Debate Político no Meio Digital, explicou que a pesquisa faz parte de uma investigação mais ampla sobre polarização política, contratada junto à empresa Quaest, que ouviu 10.002 pessoas maiores de 16 anos entre os dias 22 de janeiro e 12 de fevereiro de 2025.
A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas face-a-face e domiciliares, através de questionários estruturados. A amostra, segundo Ortellado, é representativa da população e das cinco macrorregiões do Brasil (Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste e Sul). A margem de erro estimada de 1.0 com 95% de confiabilidade.
Para o recorte das universidades foram ouvidas, até o momento, 40 pessoas nos cursos de História e Direito. Ortellado admitiu que este universo é limitado devido ao pequeno tamanho da amostra – que ele definiu como “piloto” -, restringida por falta de recursos.
O objetivo foi entender qual a penetração das críticas que se fazem à universidade pública brasileira. Foram aplicadas três questões: se a pessoa confiava ou não nas universidades públicas; o quanto concordavam se são melhores ou piores que as particulares; e se acreditavam que as instituições públicas promovem mais ideologia do que educação de qualidade.
“Os resultados não são bons para as universidades [públicas]”, comentou Ortellado”. “O que eu tenho percebido, e me parece que a pesquisa indica, é que parece que nós temos um ambiente interno na universidade que é muito fechado”, completou Silva Jr.
O presidente da SBPC, Renato Janine Ribeiro, comentou a análise dos autores do estudo: “É preocupante”, disse Ribeiro após a apresentação. Para ele, a visão da população demonstrada na pesquisa, de que a universidade pública seria de pior qualidade que a particular (com fins de lucro) e privada (ligadas a instituições religiosas e outras sem fins lucrativos) vai de encontro às evidências apontadas por estudos e análises dos resultados concretos. “Isso indica um tipo de negacionismo do qual a gente não se livra simplesmente dizendo que o povo está errado”, afirmou Ribeiro.
“Os dados assustam, porque a percepção que a gente acha que tem na universidade, pode estar enganada, embora entendo que esse estudo é inicial, com uma coorte que não abrange cursos de áreas de exatas e biológicas, (nas quais) talvez essa percepção seja diferente”, comentou Samuel Goldenberg.
Ortellado e Silva Jr recomendaram estudos mais aprofundados, uma vez que, na visão deles, ficou demonstrada a necessidade de maior pluralidade política nas universidades brasileiras.
Janes Rocha – Jornal da Ciência