Manifesto da SBPC-AM sobre a atual situação sanitária do Estado do Amazonas
A Secretaria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência no Amazonas e seus associados abaixo-assinados, vêm a público manifestar sua contrariedade às medidas de reabertura do comércio no estado do Amazonas anunciadas para serem iniciadas ainda em 14 de maio de 2020. É estarrecedor que na mesma semana em que Manaus registrou 2400 enterros em um mês (3 vezes mais do que o mesmo período de 2019) o Governador do Amazonas tenha optado por anunciar medidas de reabertura e flexibilização ao invés de tomar medidas para restringir a circulação de pessoas e para a consequente redução do vírus. A questão torna-se ainda mais espantosa quando se considera que vários especialistas, entre eles, Adele Schwarz Bezanken, Mário Scheffer e Julio Henrique Rosa Croda se pronunciaram publicamente no sentido de que o estado do Amazonas e Manaus, especificamente, deveriam estar tomando medidas mais restritivas de isolamento social nesse momento e se preparando para estratégias mais radicais de isolamento, chegando, até mesmo ao fechamento completo.
Chama a atenção que a divulgação de reabertura não veio acompanhada de qualquer anúncio de medidas de testagem ou de estratégias específicas para reduzir a subnotificação e nem mesmo de medidas que possam modificar substancialmente o quadro caótico que vive o estado do Amazonas e, especialmente, a cidade de Manaus. Cabe enfatizar que o estado registrou, no mês de abril, um colapso em seu sistema de saúde pública e privado com o extravio de corpos de vítimas, falta de vagas em UTI’s, famílias enterrando seus entes por ausência de coveiros, falta de caixões, ineficiência dos atendimentos realizados pelas UBS’s, SPA’s trabalhando como hospitais e tendo mesmo que prestar serviços de UTI, manifestações de profissionais de saúde por falta de EPI’s e de condições de trabalho em hospitais e um alastramento da pandemia de COVID-19 por 53 dos 62 municípios do estado, impactando significativamente os povos indígenas e demais comunidades e povos tradicionais. Não bastasse o cenário caótico, há fortes evidências de subnotificação no interior e na capital e há ainda uma projeção de 4.260 óbitos apenas na capital para o mês de maio.
Diante desse cenário caótico, em que claramente se nota a falta de estrutura sanitária para o enfrentamento do COVID-19 e a necessidade de se reforçar as recomendações da OMS e do próprio Ministério da Saúde brasileiro, demandamos das autoridades competentes e dos órgãos de fiscalização que considerem as seguintes ações:
1.Que o Governo do Estado do Amazonas realize a imediata revisão da previsão de reabertura dos comércios e de retomada de atividades;
- Que o Governo do Estado e as prefeituras adotem medidas mais restritivas em todo o estado, pelo menos, até que o número de casos comece a reduzir;
- Que se adote o controle intensivo (ou mesmo ostensivo) do fluxo de pessoas, principalmente entre municípios, com previsão de penas pecuniárias para pessoas que não obedecerem às restrições;
- Que o Estado providencie a aquisição de testes rápidos e adote medidas claras para o aumento da testagem de pessoas em todos os municípios e comunidades, estabelecendo critérios para as áreas ou populações prioritárias;
- Que se realize uma testagem estratégica de pessoas em deslocamento, principalmente para a manutenção de fluxos de abastecimento e de serviços essenciais no estado;
- Que sejam providenciados a aquisição e o aumento do fornecimento de EPI’s para garantir condições mínimas de trabalho às equipes de saúde e funerárias de todos os municípios do estado;
- Que realize a articulação coordenada e ofereça apoio às Instituições de Ensino Superior e Instituições de Pesquisa para realização de ações de enfrentamento da crise (e.g. apoio à testagem, produção de EPI’s, apoio psicológico, produção de álcool gel). Nesse caso, recomenda-se o acionamento da SEDECTI-AM para interlocução de ações estratégicas.
Requeremos ainda:
- A regulamentação de protocolos de cuidado e prevenção contra a transmissão do COVID19 para os comércios que ainda estão em funcionamento, em relação ao número de pessoas e fluxo de atendimento, obrigando-os ao fornecimento e utilização de máscara e álcool gel para seus funcionários, sendo recomendada a higienização permanente destes trabalhadores;
- A obrigação do uso de máscaras por todo cidadão em circulação fora de suas residências, proibindo a presença em transportes públicos de pessoas sem máscara;
- Transparência nas informações sobre leitos disponíveis (clínicos e UTI’s), e sobre EPI’s e número de profissionais da rede privada;
- Integração entre rede pública e privada durante o período de enfrentamento da COVID-19;
- Acompanhamento dos Ministérios Públicos Federal e Estadual sobre as questões de saúde;
- Transparência sobre o fornecimento de materiais e aplicação de recursos para o enfrentamento da COVID-19;
- Envio de profissionais de saúde aos municípios do interior do estado devidamente treinados e equipados para atendimento adequado;
- Estruturação de hospitais existentes e de hospitais de campanha equipados na capital e no interior (pelo menos 1 por meso ou microrregião do estado) para a internação e cuidado de pacientes acometidos por COVID-19; e
- Elaboração de uma política estadual de atendimento especializado aos povos indígenas, sobretudo em seus territórios e comunidades com a parceria junto ao governo federal e aos governos municipais.
Sanderson Castro Soares de Oliveira
Secretário da SBPC no Amazonas
Pedro Henrique Coelho Rapozo
Secretário Adjunto da SBPC no Amazonas
Ennio Candotti
Presidente de Honra da SBPC
Vera Maria Fonseca de Almeida Val
Secretária da Diretoria da SBPC
Veja o PDF do manifesto.
Jornal da Ciência