Como preparativo para a tradicional sabatina dos candidatos à Presidência da República, a SBPC organizou um ciclo de seminários temáticos ao longo do primeiro semestre de 2018 com os temas “Ciência e Tecnologia”, “Educação Básica”, “Educação Superior e Pós-Graduação”, “Democratização da Comunicação”, “Direitos Humanos” e “Saúde Pública”. O resultado desses seminários foram compilados no caderno “Políticas Públicas Para o Brasil que Queremos”, que reúne pontos críticos a serem debatidos com os presidenciáveis e também com candidatos ao Legislativo. A publicação foi apresentada nessa terça-feira, 24, na 70ª Reunião Anual da SBPC, que está sendo realizada na Universidade Federal de Alagoas (Ufal).
“A ideia é que esse conjunto de proposições da SBPC sirva de parâmetro para essas discussões. Vamos enviar aos candidatos à Presidência para que eles adotem os pontos que destacamos em seus planos de governo. E enviaremos também aos candidatos ao Legislativo”, explicou o presidente da SBPC, Ildeu de Castro Moreira. Os coordenadores dos seminários temáticos que contribuíram com o caderno apresentaram uma síntese dos painéis, dando um panorama amplo dos desafios que ainda afligem a ciência, a educação, os meios de comunicação, a saúde e toda a sociedade brasileira.
Alguns pontos críticos foram levantados por todos os grupos, como o fim da Emenda Constitucional 95, que estabelece o teto de gastos públicos nos próximos 20 anos. Outra demanda em comum foi a retomada do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação com viés exclusivo para a área, voltando à composição ministerial sem a pasta de Comunicações. Além desses dois itens, a cobrança pelo fim dos contingenciamentos em Educação, Saúde e Ciência e Tecnologia esteve presente em todos os seminários, bem como a necessária recuperação dos investimentos em CT&I ao valor máximo atingido na última década.
O professor da UFRPR, José Aleixo da Silva, um dos coordenadores do seminário temático de CT&I, leu a “Carta de Pernambuco”, documento resultante do encontro realizado no dia 13 de abril de 2018, no auditório da Fundação Oswaldo Cruz no Campus da Universidade Federal de Pernambuco, em Recife. O documento propõe doze pontos essenciais para políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação que possam recolocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento sustentável.
Além dos pontos comuns a todos os documentos, são listados como prioridade a recuperação paulatina dos recursos já contingenciados; o uso adequado e o acompanhamento permanente de todos os fundos públicos de apoio a atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D); a recuperação dos níveis orçamentários de investimento em CT&I ao valor máximo do período 2009-2014; e o estabelecimento da meta de investir 2,0% do Produto Interno Bruto nos recursos para P&D nos próximos anos, com um planejamento efetivo para alcançar a meta.
O professor Nelson Pretto, coordenador do seminário temático “Democratização da Comunicação”, realizado no dia 04 de junho de 2018, no auditório Leopoldo Amaral, da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia (UFBA), apresentou a “Carta de Salvador”. O ponto crucial levantado no documento foi a adoção de medidas pelo futuro governo que promova um sistema de comunicação não controlado por monopólios ou oligopólios. Essa quebra da concentração da mídia em poucos grupos de comunicação, aliás, está prevista na Constituição Federal em seu artigo 220. A atenção às rádios comunitárias, ampliando o espectro da comunicação, bem como a adoção de políticas que assegurem as premissas do Marco Civil da Internet no processo de avanço das novas mídias também foram apontados como prioridades. Na sessão dessa terça-feira, Pretto ressaltou que a elaboração do documento envolveu sociedades, pesquisadores de diversas áreas e, mais importante, movimentos sociais ativistas, como o Intervozes e a ANPG, “o primeiro provocador da entrada desse tema na SBPC”, afirmou.
Na Educação Superior e Pós-Graduação, a SBPC pede o compromisso dos candidatos com a continuidade da universidade pública e gratuita, assim como com a promoção da melhoria da qualidade das instituições acadêmicas. Neste contexto, foi demandada a expansão dos programas de pós-graduação e a promoção da internacionalização, levando sempre em conta as características e as necessidades locais. As demandas foram reunidas na “Carta de Porto Alegre”, lida pela professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Maíra Baumgarten. O documento é resultante do seminário temático “Desafios da Graduação, da Pós-graduação e da Educação em Ciências”, realizado no dia 6 de junho de 2018, no auditório do Instituto Latino-americano de Estudos Avançados, da UFRGS.
Em Direitos Humanos, a busca por soluções que revertam o cenário de intranquilidade social e extrema violência, intensificados com as políticas de austeridade impostas pelo atual governo, foi destacada pelo grupo que realizou o seminário temático “Direitos Humanos e atos do Estado”, no dia 14 de junho de 2018, no auditório do Centro de Desenvolvimento Tecnológico (CDT) da Universidade de Brasília (UnB). O professor da Ufam, Alfredo Wagner Berno de Almeida, foi quem apresentou a “Carta de Brasília”, com as propostas deste grupo temático. Também foi evidenciado na carta que a criminalização de protestos sociais e a repressão aos refugiados, exilados e migrantes têm trazido grandes preocupações para os pesquisadores que atuam nessa área, que enxergam uma crescente violência institucional sobre as populações mais vulneráveis.
O professor Eduardo Mortimer, da UFMG, apresentou o a “Carta de Belo Horizonte”, documento resultante do seminário temático coordenado por ele, “Desafios da política educacional para a Educação Básica”, realizado no dia 15 de junho de 2018, na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte. Entre as propostas consideradas prioritárias para a Educação Básica, destacam-se a demanda para que o novo governo cumpra de forma plena as metas do Plano Nacional de Educação (PNE); a necessidade de promoção e valorização salarial dos professores; o compromisso em rever a nova Lei do Ensino Médio, com um debate de fato amplo com a sociedade; e o compromisso de estimular e melhorar a educação científica.
Na Saúde, por fim, um dos pedidos para o futuro governo foi a realização de políticas que garantam o acesso efetivamente universal e de qualidade ao atendimento de saúde. Para isso, o grupo defende o fim das políticas de reestratificação e segmentação da oferta de serviços e das medidas que fragmentaram o sistema de atenção básica. As reivindicações estão reunidas na “Carta do Rio de Janeiro”, documento desenvolvido a partir do seminário temático “Direito ao Desenvolvimento, à Saúde e à Ciência, Tecnologia e Inovação”, que aconteceu no dia 29 de junho de 2018, na Tenda da Ciência Virgínia Schall, no campus Manguinhos da Fiocruz, no Rio de Janeiro. “Esse conjunto de proposições se insere em uma perspectiva de que é necessária a formulação de um novo padrão de desenvolvimento que incorpore o bem-estar, a CT&I, o acesso universal e equânime à saúde, à educação e à informação, contemplando o fortalecimento da democracia e a capacidade de o Estado conceber e implementar políticas públicas destinadas a promover o interesse nacional”, ressalta o grupo, na carta.
Além de servir como base para o debate com os candidatos a cargos públicos, o trabalho realizado pela SBPC também pretende inspirar outros segmentos a construírem suas cartas de demanda para compor as políticas públicas vindouras.
Todas as cartas podem ser lidas na íntegra no caderno “Políticas Públicas para o Brasil que Queremos”, que está sendo distribuído gratuitamente na Reunião Anual da SBPC e está também disponível para download no site da SBPC, neste link.
Mariana Mazza e Daniela Klebis – Jornal da Ciência