SBPC e ABC enviam carta aos senadores pedindo alterações no PL sobre experimento com animais

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e Academia Brasileira de Ciências (ABC) enviaram carta aos senadores pedindo alteração no texto do Projeto de Lei 2833/2011, do deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP), que criminaliza condutas praticadas em cães e gatos.
São Paulo, 27 de maio de 2015
SBPC-077/SBPC-ABC
Excelentíssimos Senhores
Senadores membros da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ)
Senado Federal
Senhores Senadores,
No último dia 29 de abril, foi aprovado na Câmara dos Deputados o PL 2833/2011, do deputado Ricardo Tripoli, que criminaliza condutas praticadas contra cães e gatos e dá outras providências e enviado ao Senado Federal, onde tramita como PLC 39/2015. A proposição será apreciada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e pelo Plenário do Senado.
O PLC 39/2015 criminaliza condutas como: (i) matar, (ii) deixar de prestar socorro, (iii) abandonar, (iv) promover luta entre cães, (v) valer-se de corrente, corda ou aparato similar para manter cão ou gato abrigado, (vi) expor a perigo de vida, a saúde ou a integridade física de cão ou gato.
Durante sua tramitação, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Academia Brasileira de Ciência (ABC) bem como outros representantes da comunidade científica participaram de debates na Câmara e alertaram para o risco da aprovação do texto original do PL 2833/2011 para a ciência brasileira. Foram apresentadas sugestões de alterações de forma que não criminalizasse a pesquisa que ainda necessita utilizar a experimentação animal. Além disto, alertamos para o fato de que o projeto ignora a Lei no 11.794/2008, conhecida como Lei Arouca, que regulamentou o inciso VII do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, e estabeleceu procedimentos para o uso científico de animais, dentre os quais “cães e gatos”, criando o Conselho Nacional de Controle da Experimentação Animal (CONCEA), órgão responsável, entre outras coisas, em formular normas, zelar pelo seu cumprimento e credenciar instituições para criação ou utilização de animais em ensino e pesquisa científica. 
O CONCEA é órgão integrante da estrutura do Ministério da Ciência e Tecnologia, é instância colegiada multidisciplinar de caráter normativo, consultivo, deliberativo e recursal, para coordenar os procedimentos de criação e utilização de animais em atividades de ensino e pesquisa científica, conforme o disposto na Lei No – 11.794, 8 de outubro de 2008, e no Decreto No – 6.899, de 15 de julho 2009. Ainda, o Art. 7º da citada lei define que o CONCEA será presidido pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia e integrado por diferentes ministérios e representantes da sociedade civil, incluindo, representantes das sociedades protetoras de animais legalmente estabelecidas no País.
A Reunião de Instalação do CONCEA foi em 08/12/2009, e a segunda reunião ocorreu de 24 a 26 de fevereiro de 2010. Desde então, O CONCEA já aprovou 21 Resoluções Normativas, sendo que a última foi publicada em 20 de março de 2015, e 6 Orientações Técnicas, além da plataforma para credenciamento das instituições de pesquisa e dos biotérios.
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) reúne cerca de 120 sociedades científicas de várias áreas do conhecimento e, muitas delas desenvolvem pesquisas na área da saúde humana e animal, que envolvem a descoberta de novas drogas utilizadas na produção de medicamentos, e que necessitam ainda utilizar animais para testes de sua segurança, eficácia e eficiência, antes de utilizá-los em seres humanos.
Em diversas áreas do conhecimento, há ainda a necessidade da utilização de testes em animais, isso para que possamos trazer benefícios aos seres humanos, bem como animais, minimizando sofrimentos causados por doenças e males que atingem a todos, sem exceção. Vale ressaltar que todos os procedimentos envolvendo animais requer aprovação prévia por Comissões de Ética com Uso de Animais (CEUAs) para sua aprovação (de acordo com a Lei Federal no 11.794 de 2008) e, nos casos em que o animal for submetido a algum tipo de estresse a justificativa para esse procedimento deverá estar fundamentado em protocolos aceitos no país e no exterior. 
Não se pode ignorar que o uso de animais para pesquisa científica é ainda essencial para as descobertas científicas com benefícios inquestionáveis para os humanos e outros animais. Vacinas, medicamentos, desenvolvimento de próteses e cirurgias, terapias com células tronco, terapia gênica são apenas exemplos dos benefícios obtidos com o uso de animais. Digno de nota, ainda, é a inexistência de método alternativo que substitua cães e gatos para testes toxicológicos ou de eficiência. O banimento do uso de cães e gatos em pesquisa sem a existência de um alternativa validada deixa uma lacuna irreparável na construção do dossiê de segurança e eficácia de diversos produtos, dentre eles medicamentos. Tendo a segurança das pessoas e do ambiente em relevo, essa lacuna de informação inviabiliza o registro de produtos em qualquer lugar do mundo, pois são dados ainda essenciais, implicando em forte impacto econômico. Na possibilidade de registro de produto sem este testes há risco relevante para as pessoas e o ambiente.
Importante deixar claro que a SBPC e a ABC não são contra a proposição do deputado Tripoli, pois são contra a submissão dos animais a crueldade. Porém, não concordam com a generalização do projeto, que não diferencia a crueldade praticada contra os animais e a utilização humanitária dos mesmos para fins científicos. Para esses fins, existe a Lei no 11.794/2008. 
Em nosso entendimento, a aprovação do projeto na forma que veio da Câmara, criminalizará a pesquisa e inviabilizará, no Brasil, o teste de medicamentos e os estudos de diversas doenças negligenciáveis que tem os cães como vetores importante, colocando em risco o desenvolvimento de fármacos em território nacional, colocando o Brasil na dependência de testes no exterior, o que pode comprometer a soberania nacional e a segurança da população brasileira.
Assim, a SBPC e ABC reforçam a necessidade de que se faça uma ressalva no PLC 39/2015 aprovado na Câmara, de que não há crime de “exposição a perigo a vida, saúde ou integridade física” quando os animais forem utilizados em atividades de ensino ou pesquisa científica após a aprovação de protocolo pela CEUA da instituição onde se realizará o estudo; assim como não há crime de “homicídio” se os animais vierem a óbito em decorrência do experimento, sem que tenha ocorrido qualquer violação às normativas do órgão competente nesta área (o CONCEA).
Diante da importância deste tema para o Brasil, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciência (ABC) solicitam a V.Exas que corrijam o texto aprovado na Câmara dos Deputados, incluindo as ressalvas acima mencionadas. 
Desde já agradecemos a atenção dos senhores e nos colocamos à disposição para qualquer esclarecimento.
                                                              Atenciosamente,
                         HELENA B. NADER JACOB PALIS
                         Presidente da SBPC Presidente da ABC