SBPC encaminha moção contra tese do Marco Temporal

O texto foi aprovado por unanimidade pela Assembleia Geral Ordinária de Sócios da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, realizada no dia 27 de julho, na Universidade Federal do Paraná (UFPR), durante a 75ª Reunião Anual da entidade

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) encaminhou a autoridades a “Moção: Não à tese do Marco Temporal. Pelo respeito à vida e aos direitos dos povos indígenas no país”. O documento, aprovado por unanimidade pela Assembleia Geral Ordinária de Sócios da SBPC, foi endereçado ao senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, à ministra Rosa Weber, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Eliana Torelly de Carvalho, secretária-geral do Ministério Público Federal (MPF), e Sônia Guajajara, ministra dos Povos Indígenas.

O documento pede que os guardiões da ordem constitucional tratem o tema “com toda a seriedade e gravidade que ela enseja, e que rejeitem integralmente tudo o que nela atenta contra os princípios de nossa Magna Carta quanto aos direitos dos povos indígenas”.

O texto alerta que o atual ao Projeto de Lei (PL) 2903, que se encontra agora no Senado Federal, contém graves problemas formais e de conteúdo, “com o nítido e nocivo intuito de fragilizar os direitos dos povos indígenas e os esforços para lhes assegurar justiça social e sustentabilidade ambiental.”

“Importantíssimo enfatizar, neste sentido, que as terras indígenas compõem parte relevante do mosaico de áreas protegidas em nosso país, contribuindo para a garantia de conservação e sustentabilidade ambiental não só do Brasil como do planeta, sobretudo em tempos de extremo comprometimento climático”, acrescenta o texto.

Ainda de acordo com o documento, tal tese, no STF ou no Legislativo, nega o passivo de violência contínua sofrida pelos povos indígenas, sejam elas praticadas pelo Estado, ou por grupos privados, em disputas pela terra. “Ela não apenas exclui povos de seus territórios como lhes nega seu direito à memória e à verdade de sua história, além de seus direitos aos territórios por eles tradicionalmente ocupados. A Constituição de 1988 é a garantia para se manter e defender a democracia em nosso país, mas a tese do marco temporal ameaça o pleno processo democrático de direito. Por isso, ela é tema de interesse de toda a sociedade brasileira e não só dos povos indígenas”.

A Assembleia Geral Ordinária de Sócios da SBPC foi realizada no dia 27 de julho na Universidade Federal do Paraná (UFPR), durante a 75ª Reunião Anual da SBPC.

Veja o texto na íntegra:

Não à tese do Marco Temporal. Pelo respeito à vida e aos direitos dos povos indígenas no país

A tese do Marco Temporal estabelece a data de 05 de outubro de 1988 como marco legal para a presença indígena em suas terras, independentemente de expulsões sofridas ou de características específicas de ocupação em cada caso. Em 2020, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) ingressou como amigo da corte no processo de julgamento da tese no STF. Tal julgamento foi interrompido por pedido de vistas e será proximamente retomado.  Entretanto, a tese ganhou força no Legislativo e o PL 490 conseguiu ser aprovado na Câmara dos Deputados, com uma versão ainda mais perversa, e que se encontra agora no Senado Federal, como PL 2903.

A SBPC se junta à ABA para externar sua profunda preocupação com este PL, em seus flagrantes elementos que atentam contra a ordem constitucional vigente, o direito à sustentabilidade ambiental e os direitos humanos dos povos indígenas.

O atual PL 2903 contém graves problemas formais e de conteúdo, com o nítido e nocivo intuito de fragilizar os direitos dos povos indígenas e os esforços para lhes assegurar justiça social e sustentabilidade ambiental. Importantíssimo enfatizar, neste sentido, que as terras indígenas compõem parte relevante do mosaico de áreas protegidas em nosso país, contribuindo para a garantia de conservação e sustentabilidade ambiental não só do Brasil como do planeta, sobretudo em tempos de extremo comprometimento climático.

Tal tese, no STF ou no Legislativo, nega o passivo de violência contínua sofrida pelos povos indígenas, sejam elas praticadas pelo Estado ou por grupos privados, em disputas pela terra. Ela não apenas exclui povos de seus territórios como lhes nega seu direito à memória e à verdade de sua história, além de seus direitos aos territórios por eles tradicionalmente ocupados. A Constituição de 1988 é a garantia para se manter e defender a democracia em nosso país, mas a tese do marco temporal ameaça o pleno processo democrático de direito. Por isso, ela é tema de interesse de toda a sociedade brasileira e não só dos povos indígenas.

Assim, alertamos para que os guardiões da ordem constitucional tratem esta matéria com toda a seriedade e gravidade que ela enseja, e que rejeitem integralmente tudo o que nela atenta contra os princípios de nossa Magna Carta quanto aos direitos dos povos indígenas. Não à tese do Marco Temporal.

Jornal da Ciência