SBPC publica moção em defesa do FNDCT e alerta para riscos no julgamento da Cide no STF

Documento aprovado pela Assembleia Geral de Sócios da SBPC, reunida em 17 de julho durante a 77ª Reunião Anual, alerta que a adoção de uma interpretação restrita de “tecnologia” compromete o principal mecanismo de financiamento da ciência, da inovação e da soberania tecnológica no País

MOÇÃO APROVADA NA ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIA DOS SÓCIOS DA SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIÊNCIA (SBPC), REALIZADA EM 17 DE JULHO DE 2025, NA UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO (UFRPE), EM RECIFE-PE, POR OCASIÃO DE SUA 77ª REUNIÃO ANUAL.

Título: Em defesa do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT)

Destinatários: Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos; Ministros do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Gilmar Mendes, Carmen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, Alexandre de Moraes, Nunes Marques, André Mendonça, Cristiano Zanin e Flávio Dino.

Texto: “Os cientistas brasileiros, reunidos durante a Reunião Anual da SBPC, expressam profunda preocupação com o julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da constitucionalidade da incidência da CIDE (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) sobre remessas de valores ao exterior. A tese apresentada pelo Ministro Relator coloca em risco o financiamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

Neste processo, o cerne do debate reside na interpretação do conceito de “tecnologia”. Para maior clareza, é fundamental distinguir dois conceitos:

  1. Tecnologia Restrita: Refere-se a algo tangível, como bens físicos, máquinas, equipamentos ou softwares específicos, representando uma visão tradicional e limitada, focada em produtos e ferramentas.
  1. Tecnologia Ampla: Engloba não apenas bens físicos, mas todo o conhecimento, processos, metodologias, patentes, inovações e serviços que impulsionam o desenvolvimento. É uma visão moderna e abrangente, que reconhece que o valor da tecnologia reside também no know-how, nas descobertas e na capacidade de gerar soluções.

Caso a tese apresentada pelo Ministro Relator Luiz Fux, que defende a interpretação restrita de tecnologia, prospere, haverá um impacto significativo no modelo de financiamento do sistema nacional de ciência e tecnologia. A CIDE é responsável por 74% da arrecadação do FNDCT, fundo que, por sua vez, financia programas estratégicos cruciais para o Brasil. Os recursos da CIDE são direcionados diretamente ao FNDCT, viabilizando diversas iniciativas essenciais, tais como dois terços do Programa Brasileiro de Inteligência Artificial, o Programa Pro-Infra (para infraestrutura de pesquisa), Conhecimento Brasil, Segurança Alimentar, SOS Clima Brasil e Pro-Amazônia.

Ou seja, o que está em debate no STF não é apenas uma questão fiscal, mas a própria sustentabilidade do progresso científico e tecnológico brasileiro e sua capacidade de induzir inovação no setor produtivo.

A defesa do entendimento amplo de tecnologia neste julgamento não apenas garante a integridade do financiamento à ciência e tecnologia, mas também reforça a ideia de que o progresso científico e inovador deve estar alinhado às demandas atuais da sociedade e do setor produtivo. Reconhecer o valor do conhecimento intangível, da inovação e das descobertas como componentes essenciais da tecnologia é fundamental para estimular uma economia mais inovadora, competitiva e sustentável, promovendo uma maior integração entre pesquisa, desenvolvimento e produção. Além disso, essa interpretação mais abrangente contribui para fortalecer a autonomia brasileira na construção de capacidades estratégicas e na consolidação de um ambiente de inovação propício ao desenvolvimento de soluções próprias para os desafios nacionais. Dessa forma, o resultado do processo no STF impactará diretamente a capacidade do Brasil de avançar em sua agenda de soberania tecnológica e de garantir uma base sólida para o crescimento sustentável, posicionando o país na vanguarda do conhecimento e da inovação no cenário global.

Portanto, para que continuemos trilhando o caminho do desenvolvimento nacional, da independência e da soberania brasileira, é imprescindível que o STF adote o entendimento amplo de tecnologia, conforme estabelecido pela lei federal em vigência e pela própria Constituição brasileira, reconhecendo como fundamentais para a construção das capacidades tecnológicas e inovadoras tanto os elementos tangíveis quanto os intangíveis.

Recife, 17 de julho de 2025.”

O documento pode ser acessado neste link.

SBPC