As celebrações do centenário do primeiro experimento que comprovou a Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein tiveram seu auge nesta quarta-feira, 29 de maio. Em Sobral, onde as observações decisivas do eclipse solar foram feitas, foi um dia de festa, que começou com uma solenidade com transmissão simultânea com a Ilha do Príncipe e encerrou com um espetáculo de vídeo-mapping e orquestra sinfônica em praça pública.
Foi neste dia que, há cem anos, foi observado em Sobral o eclipse solar cujo registro foi decisivo para comprovar, pela primeira vez, que a previsão do físico alemão estava correta: a luz, quando passa próxima a um corpo de massa grande, se curva. Isso revolucionou a física moderna e a maneira como entendemos o universo.
O Centenário do Eclipse de Sobral foi assunto em todos os jornais do País, e também na imprensa internacional, mobilizou a comunidade científica e fez com que toda a cidade falasse da física de Einstein.
“Esse evento terá um impacto muito grande”, afirmou Ildeu de Castro Moreira, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), na solenidade que marcou a celebração na manhã dessa quarta-feira. “É fundamental que todos ajudem a divulgar que Sobral foi palco desse evento tão importante para a ciência mundial. A cidade que recebeu tão bem os cientistas naquela época e nos recebe tão bem hoje”. A SBPC, juntamente com outras entidades e os governos do Ceará e de Sobral, vem promovendo desde maio de 2018 atividades para comemorar o centenário do Eclipse de Sobral.
Apesar do clima de festa, Moreira lembrou o momento difícil pelo qual a ciência do País passa, com cortes orçamentários drásticos que impossibilitam seu desenvolvimento. “Não pode haver eclipse para a ciência; queremos que essa crise seja um eclipse parcial e que acabe rápido.”
A solenidade contou com a presença de autoridades, inclusive o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes. “A ciência ajuda na produção de riqueza, no bem estar da humanidade, mas também une as pessoas pelo bem do planeta. Precisamos deixar o achismo de lado e trabalhar para produzir mais conhecimento”, declarou. Pontes disse ainda que é impossível separar ciência da educação e ressaltou que Sobral, lugar onde se concretizou a teoria que revolucionou o mundo, é um exemplo de como as duas áreas devem caminhar juntas.
O governador do Estado do Ceará, Camilo Santana, destacou a importância de manter viva essa história na cidade. “Foi a partir de Sobral que vimos uma revolução na educação pública do Estado. Sobral contribuiu para revolucionar a ciência e contribui para revolucionar a educação.”
Ivo Gomes, prefeito de Sobral, ressaltou a força e o entusiasmo da SBPC para realizar o evento e resgatar a importância da cidade nesse capítulo da história da ciência mundial. “Temos que ter orgulho do nosso país, da nossa cidade e de todos que colaboraram para que Sobral seja reconhecida como o palco de uma grande revolução da ciência”.
O deputado Leônidas Cristino também falou do exemplo que a cidade é para a Educação e da importância de manter viva essa história que liga a cidade à ciência mundial. “Todos olham para o Brasil e para o Ceará nessa comemoração.”
O ex-governador do Ceará, Ciro Gomes esteve presente à solenidade, ao lado irmão, Ivo. Ele defendeu a ciência como instrumento para vencer a ignorância e superar os problemas do País. “Em tempos em que temos um ministro astronauta, vemos pessoas dizerem que a Terra é plana. O que precisamos agora é de inteligência para vencer nossos desafios”, disse.
“A inquietação deve nos mover para a luz e para o conhecimento”, acrescentou o presidente da Assembleia Legislativa do Ceará, José Sarto.
O secretário da Ciência, Tecnologia e Educação Superior do Ceará (Secitece), Inácio Arruda, reiterou a importância de divulgar essa celebração, “especialmente em um momento em que se subtrai a capacidade do povo avançar”. “Educar, formar, significa abrir caminho para enterrar para sempre o obscurantismo e dizer que a humanidade é humana”, declarou, defendendo em seu discurso a universidade pública brasileira, “celeiro da produção científica nacional”.
Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), dedicou as celebrações ao primeiro presidente da ABC, Henrique Morize, astrônomo brasileiro que sugeriu Sobral como o melhor lugar para observar o eclipse e ajudou a organizar a recepção das expedições estrangeiras ao Brasil. “Se Morize estivesse aqui, estaria muito contente. Porque além de grande cientista, ele defendia a educação de qualidade. E Sobral representa as duas coisas. Ciência é a base do desenvolvimento e deve fazer parte de uma agenda nacional.”
A cerimônia teve uma sessão solene simultânea com a Ilha do Príncipe, direto da Roça Sundy, onde foram feitas as observações pela equipe do astrofísico britânico Arthur Eddington – lá, o mau tempo impediu um registro preciso do evento e, por isso, os dados de Sobral foram decisivos. Na transmissão, o primeiro ministro de São Tomé e Príncipe, Jorge Bom Jesus, falou sobre as afinidades dos dois países, seja em suas histórias, na riqueza da diversidade cultural e biológica, na língua portuguesa que compartilham. “A ciência vem cimentar essas nossas afinidades. Hoje é um dia de festa para nós, festa da ciência e da cultura. É um exemplo de como a ciência serve à paz e ao desenvolvimento das nações”.
Um dia para recordar
O dia foi cheio de momentos marcantes. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos lançou na solenidade o selo comemorativo do Centenário do Eclipse de 1919. A criação da peça foi baseada em duas fotografias reais do evento à época: uma foto do eclipse e outra dos preparativos da observação. Segundo o superintendente do órgão, Érico Jovino Sales, foram estampados 240 mil selos comemorativos para circular no Brasil e no mundo. “Selos e carimbos são peças de valor histórico, documental e cultural. O centenário ficará marcado para sempre”, declarou.
Em sua conferência após a solenidade, o astrofísico irlandês Tom Ray, do Instituto de Estudos Avançados de Dublin, apresentou ao público o celostato e a lente do telescópio de 4 polegadas que registrou o eclipse cem anos atrás. “O equipamento trazido como reserva ao Brasil foi crucial. Ele se perdeu e foi encontrado 70 anos depois”, conta Ray. “Ver e tocar essa lente me emocionou muito”, disse o físico Luís Crispino, professor da Universidade Federal do Pará. A peça está emprestada a Sobral até julho e ficará exposta no Museu do Eclipse.
Logo em seguida, no histórico Teatro São João, estudantes no Brasil, em Portugal e na Ilha do Príncipe apresentaram uma mini-ópera em homenagem aos cem anos da observação do eclipse. O espetáculo internacional teve transmissão simultânea nos três países.
E foi com música também que se encerrou o grande dia de comemoração do eclipse. Dessa vez, o palco foi a Praça do Patrocínio, onde foi realizada a cerimônia de reabertura do Museu do Eclipse, ao som da orquestra sinfônica da Universidade Federal do Ceará, com um vídeo-mapping projetado na fachada da Igreja. O espetáculo atraiu centenas de pessoas da cidade, maravilhadas com a tecnologia e a história por trás dela.
A SBPC, a prefeitura municipal e o governo cearense também trouxeram para o Museu a mostra itinerante “Cem anos do Eclipse de Sobral”. A ideia é que a exposição circule posteriormente por cidades do Ceará.
Além de Sobral, o Centenário do Eclipse está sendo celebrado em outras cidades do País. No Congresso Nacional, em Brasília, uma exposição organizada pela SBPC sobre o evento está em exibição até o dia 15 de junho.
No Rio de Janeiro, o Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST), em parceria com o Observatório Nacional (ON), lançou nessa quarta-feira a exposição “O Eclipse – Einstein, Sobral e o GPS”. A mostra vai contar a história da expedição científica que comprovou da Teoria da Relatividade Geral, de Albert Einstein, trazendo detalhes sobre como foram registradas as fotografias da posição das estrelas próximas à borda solar nas cidades de Sobral (Ceará) e na Ilha do Príncipe (África).
Já em Belo Horizonte, na Universidade Federal de Minas Gerais, a data será comemorada na Estação Ecológica, de 29 a 31 de maio, com sessões de planetário, oficinas e laboratórios de Biologia, Física, Matemática e Química, palestras e observações astronômicas.
Daniela Klebis – Jornal da Ciência