Trump tenta coibir uso de quase 200 palavras, mas pode um governante legislar sobre a linguagem?

‘O problema é como os governantes definem certos conceitos’, diz filósofo e presidente da SBPC Renato Janine Ribeiro

No começo de março, deu no New York Times que 197 palavras e expressões vêm sendo excluídas do léxico do governo americano e devem ser evitadas em documentos e na comunicação oficial. Entre elas: “antirracismo”, “energia limpa”, “orientação”, “historicamente”, “mulheres”, “transexual”, “pronomes”, “trauma”, e até “Golfo do México”. Todas pertencem ao vocabulário “woke”, isto é, são utilizadas por determinada militância progressista deplorada pelo presidente Donald Trump. Ou se referem a obsessões do republicano, como renomear o Golfo do México como Golfo da América (nos Estados Unidos, mapas do Google e da Apple já adotaram o topônimo trumpista).

O dicionário de expressões indesejáveis foi compilado a partir da consulta de documentos que ordenam sua remoção de sites do governo e de outros materiais, como currículos escolares. Quando não há proibição explícita, recomenda-se cautela do uso de certas palavras. O NYT supõe que a lista de palavras banidas seja ainda maior. A presença desses termos pode resultar na revisão de contratos e na reprovação do financiamento de pesquisas científicas, afirmou o jornal.

Mas, afinal, pode um governante legislar sobre a linguagem? O filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679) acreditava que sim. Em “O cidadão”, ele afirma que cabe ao soberano impor o significado das palavras, pois “uma denominação incorreta pode levar à revolta e à sedição”, ou seja, a divisões sociais que abalem o poder político. Hobbes é um teórico da soberania e, embora admita leituras mais democráticas, sua obra é mais comumente associada a uma defesa do poder ilimitado do monarca. Leitor de Hobbes, o professor de filosofia e ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro explica que o problema não é os governantes criarem um vocabulário próprio, mas como eles definem certos conceitos.

Veja o texto na íntegra: O Globo

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