Pró-reitor encaminhou documento a todos os cursos de PG solicitando levantamento de informações sobre a presença de israelenses nos programas
São Paulo, 8 de junho de 2015.
Exmo. Sr.
Prof. Dr. Paulo Afonso Burmann
Magnífico Reitor
Universidade Federal de Santa Maria
Senhor Reitor,
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência que representa mais de 130 sociedades científicas de todas as áreas do conhecimento e mais de 10 mil sócios ativos, foi tomada de surpresa com o documento encaminhado pelo Prof. Dr. José Fernando Schlosser, Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) a todos os Programas de Pós-Graduação da UFSM, no dia 15 de maio do corrente ano, sobre o assunto: “levantamento de informações”, no qual lê-se:
“Vimos solicitar a V. Sa., o envio urgente de informações sobre a presença ou perspectiva de discentes e/ou docentes israelenses nesse Programa de Pós-Graduação, podendo ser informado por e-mail.
Esta demanda atende solicitação de requerimento de representantes da SEDUFS, ASSUFSM, DCE e Comitê Santamarinense de solidariedade ao povo palestino.”
Lembramos a V. Mag. que o Brasil é um país onde todos os povos com suas diferentes crenças convivem em harmonia. Essa solicitação, encaminhada pela universidade da qual o senhor é o representante maior, traz indignação a todos nós da comunidade acadêmica do país. Entendemos que a vida acadêmica do país deva ser referência na promoção de tolerância e respeito à diversidade, combatendo toda e qualquer forma de discriminação.
Vivemos hoje o Estado de direito, com uma democracia conquistada por muitas lutas, com a participação de todos os brasileiros de diferentes origens, incluindo cientistas, professores e estudantes, que lutaram e seguem na construção de um país mais tolerante e menos excludente.
Também gostaríamos de lembrar ao senhor a grande parceria que se deu em nosso país pela redemocratização, quando estiveram lado a lado, o arcebispo de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns e o Rabino Henry Isaac Sobel, entre outros líderes de outras religiões, para coibir as violências do regime ditatorial militar. Esse é o país que desejamos e não o que, infelizmente, a nosso ver, se expressa em vossa universidade.
Ao mesmo tempo, reconhecemos a necessidade de solidarizarmo-nos aos diferentes povos que enfrentam conflitos e lutas, muitas das quais resultantes de recrudescimento nacionalista, intolerância religiosa, política e territorial, protecionismo econômico, etc, como acontece entre diferentes povos e etnias, tais como nigerianos, suítas, chiitas, sírios, palestinos, israelenses, cubanos, ucranianos, venezuelanos, entre muitos outros, porém sem que isso acarrete na discriminação de um outro povo. Entendemos a importância de discutirmos os conflitos, mas sem que isso se expresse em uma conduta que ameaça a perseguição de um grupo de pessoas por seu credo ou origem étnica-racial. A Academia deve ser porta voz do pensamento livre, e de discussões sobre como, juntos, podemos transformar o mundo em que vivemos em um de respeito, tolerância e integralidade e não da repercussão e incentivo a intolerâncias que, infelizmente, ainda seguem presentes.
Dessa forma, a comunidade acadêmica, docentes e estudantes, exigem um pedido de desculpas público, garantindo que nossos espaços universitários sejam locus de diversidade e valorização da mesma.
Lembramos ainda que nos colocaremos firmemente contrários a toda e qualquer forma de discriminação de qualquer ordem e seguiremos na construção de um país mais equânime em todos os sentidos.
Esta carta está sendo copiada para o Exmo. Sr. Ministro de Estado da Educação, Prof. Dr. Renato Janine Ribeiro e para o Exmo. Sr. Presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, responsáveis pela educação superior no nosso país para que tomem conhecimento e coibam atitudes semelhantes, preservando a história e o desejo do país que queremos alcançar.
Helena Nader
Presidente da SBPC