A SBPC lançou na última sexta-feira, 3 de junho, o volume 1 da obra “Povos tradicionais e biodiversidade no Brasil – Contribuições dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais para a biodiversidade, políticas e ameaças”. Intitulada “Quem são, quantos são”, a seção 1 da primeira arte do trabalho propõe uma questão que parece básica, porém é muito difícil de responder.
“Pode-se dizer que, por enquanto, permanece a invisibilidade censitária de grandes contingentes de população”, comentam Manuela Carneiro da Cunha, Sônia Barbosa Magalhães e Cristina Adams, organizadoras da obra.
O volume se inicia por aqueles que nunca foram contados, porque voluntariamente se isolam na floresta. Essa escolha não é acidental: os povos indígenas que voluntariamente evitam o contato são os mais vulneráveis e mais ameaçados de todos. Começar por eles em grande detalhe é um alerta para o extremo risco em que eles se encontram e a importância da proteção que a Constituição Federal atribui ao Estado.
Por meio de refinadas análises das bases de dados disponíveis o volume revela a insuficiência e a precariedade dos dados censitários referentes aos povos indígenas, mas sobretudo aos quilombolas e comunidades tradicionais.
Com a exceção bastante recente da população indígena, os outros Povos e Comunidades Tradicionais nunca foram recenseados no Brasil. Os quilombolas seriam incluídos como categoria pela primeira vez no Censo de 2020, mas este, até o momento em que escrevemos – março de 2022 – tem dois anos de atraso.
Os dados oficiais sobre indígenas são do censo de 2010: 896.917 pessoas para as quais antropólogos e linguistas identificam 262 povos e 154 línguas. Os dados sobre quilombolas são da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), que avalia a população entre dez e quinze milhões de quilombolas. Avalia também em 6.300 o número de comunidades quilombolas, um número apenas pouco acima da estimativa do IBGE.
Sobre muitos outros Povos e Comunidades Tradicionais há uma lacuna que parece só agora estar sendo percebida com maior acuidade, quando se tomou consciência da importância da conservação da biodiversidade assegurada por esses povos e comunidades.
Obra completa
O projeto foi lançado no dia 29 de abril de 2021, em sessão especial transmitida pelo canal da SBPC no YouTube. A obra completa, com 17 seções, tem coordenação de Manuela Carneiro da Cunha (USP e Univ. de Chicago), Sônia Barbosa Magalhães (UFPA) e Cristina Adams (USP). Segundo as coordenadoras do projeto, o estudo compõe um acervo importantíssimo, não só para os tomadores de decisão, mas também para os povos tradicionais e cientistas de muitas áreas.
Trata-se de uma síntese das contribuições dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais no Brasil para a geração e conservação da biodiversidade, além de outros serviços ecossistêmicos; das políticas públicas que os afetam positiva ou negativamente e dos conflitos e ameaças a que estão sujeitos. A pesquisa traz ainda avaliações e recomendações de órgãos internacionais acerca de compromissos assumidos pelo Brasil também são repertoriados.
O trabalho é resultado de uma encomenda do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), viabilizado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), complementado pelo apoio de um doador que quis ficar anônimo e, ainda, com contribuição da Plataforma Brasileira de Serviços Ecossistêmicos (BPBES).
Dirigida a tomadores de decisão de todos os níveis, a obra segue as orientações da Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) “O objetivo é reunir e resumir o conhecimento atual referenciado por fontes acessíveis ao público”, enfatizam as coordenadoras do projeto.
Confira abaixo a estrutura básica da obra, dividida em 6 partes e 17 seções, cada uma com um número variável de capítulos:
Povos Tradicionais e Biodiversidade no Brasil. Contribuições dos Povos Indígenas, quilombolas e Comunidades Tradicionais, para a biodiversidade, Políticas e Ameaças.
PARTE I. TERRITÓRIOS E DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS, QUILOMBOLAS E COMUNIDADES TRADICIONAIS
- SEÇÃO 1. QUEM SÃO, QUANTOS SÃO(lançada em 03/06/22)
- SEÇÃO 2. TERRITÓRIOS (Onde estão?)
- SEÇÃO 3. DIFICULDADES NA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS TERRITORIAIS(lançada em 19/07/21)
- SEÇÃO 4. ALGUNS DIREITOS ESPECÍFICOS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA(lançada em 16/09/21)
PARTE II. CONTRIBUIÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS, QUILOMBOLAS E COMUNIDADES TRADICIONAIS À BIODIVERSIDADE
- SEÇÃO 5. OS TERRITÓRIOS INDÍGENAS E TRADICIONAIS PROTEGEM A BIODIVERSIDADE?(lançada em 23/06/21)
- SEÇÃO 6. BIODIVERSIDADE COMO LEGADO DE POVOS INDÍGENAS(lançada em 17/05/21)
- SEÇÃO 7. GERAR, CUIDAR E MANTER A DIVERSIDADE BIOLÓGICA(lançada em 29/04/21)
- SEÇÃO 8. CONHECIMENTOS ASSOCIADOS À BIODIVERSIDADE(lançada em 18/08/21)
PARTE III. POLÍTICAS PÚBLICAS DIRECIONADAS AOS POVOS INDÍGENAS, QUILOMBOLAS E COMUNIDADES TRADICIONAIS
- SEÇÃO 9. INCENTIVOS AO USO DA TERRA E PRODUÇÃO
- SEÇÃO 10. POLÍTICAS EDUCACIONAIS, DE SAÚDE E DE PROTEÇÃO SOCIAL
PARTE IV. POLÍTICAS PÚBLICAS QUE AMEAÇAM OS POVOS INDÍGENAS, QUILOMBOLAS E COMUNIDADES TRADICIONAIS
- SEÇÃO 11. PROJETOS ECONÔMICOS E DE INFRAESTRUTURA
- SEÇÃO 12. POLÍTICAS AGRÁRIAS E AMBIENTAIS: CONFLITOS
- SEÇÃO 13. AMEAÇAS
PARTE V. AVALIAÇÕES INTERNACIONAIS
- SEÇÃO 14. AVALIAÇÃO DO CUMPRIMENTO DE METAS SUBSCRITAS PELO BRASIL(lançada em 04/06/21)
PARTE VI. PESQUISAS INTERCULTURAIS
- SEÇÃO 15. POVOS INDÍGENAS
- SEÇÃO 16. COMUNIDADES TRADICIONAIS(lançada em 11/02/22)
- SEÇÃO 17. QUILOMBOLAS
Jornal da Ciência