Combate a fake news e educação científica podem fortalecer percepção da ciência brasileira

Laila Salmen Espindola, diretora da SBPC, estava entre os participantes da audiência pública realizada nessa quarta-feira, 28 de junho

CCT - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicaç

“Além de combater as fake news, é preciso investir em divulgação e educação científica para ampliar o apoio à ciência e o desenvolvimento da tecnologia e da inovação brasileiras”. Esta foi a conclusão da diretora da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) Laila Salmen Espindola, ao fazer um balanço da audiência pública realizada nessa quarta-feira, 28 de junho, no Senado, sobre a percepção social em relação à ciência e à inovação.

O debate, que contou com a participação de vários especialistas no assunto, foi convocado pelo senador Izalci Lucas (PSDB – DF) e tomou por base estudos recentes que revelaram uma relação muito particular do público brasileiro com a área científica.

Segundo pesquisa de 2019 sobre percepção pública de C&T do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), nove em cada dez brasileiros consideravam a ciência importante na promoção de oportunidades, mas não sabiam citar o nome de um cientista ou instituição científica nacional. Já em 2022, um levantamento feito pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação (MCTI), observou que a confiança diminuiu pós-pandemia, sobretudo em segmentos e regiões considerados mais conservadores.

Diante desses dados, Izalci Lucas questionou os debatedores sobre como modificar o desconhecimento da população brasileira sobre os cientistas nacionais e a baixa participação em eventos científicos e de inovação.

Espindola enfatizou na audiência que a divulgação científica é um fator fundamental para combater a disseminação de fake news. Professora-titular da Faculdade de Saúde/Medicina da Universidade de Brasília (UnB), ela alertou que uma forte campanha de desinformação tem feito com que doenças já erradicadas ou controladas retornem, inclusive com agravantes, atingindo principalmente os mais vulneráveis.

“Somos sobreviventes do negacionismo científico e sanitário oficialmente instalado nesse país durante o auge da pandemia. Termos ficado vivos representa, com certeza, uma missão. Precisamos nos unir para combater as fake news, reafirmando os valores éticos do conhecimento científico para recompor a saúde. Para isso precisamos priorizar a inclusão social, em todos os níveis, em todos os sentidos. Considerar o meio ambiente como um patrimônio a ser estudado e defendido, além de estabelecer o papel decisivo da educação e da ciência”, declarou.

Espindola, no entanto, disse que a divulgação científica, sozinha, não é suficiente. “Algumas pesquisas mostram que o cidadão confia na ciência, mas ele precisa se sentir parte daquilo. Por isso, precisamos de educação científica para darmos condições para que as pessoas se apropriem das informações. E tudo passa por um processo democrático. Precisamos transformar o Brasil em uma democracia plena para que o cidadão tenha discernimento para tomar decisões favoráveis a ele. Mas para isso, os investimentos devem começar desde a primeira infância. É preciso políticas públicas direcionadas às práticas de alfabetização científica nas escolas”, observou.

Márcia Cristina Bernardes Barbosa, secretária de Políticas e Programas Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), também concordou que esse cenário só pode ser alterado por meio de um projeto que pense um sistema de educação com método e ética científicos adaptados à nova realidade das crianças e dos jovens e que envolva todas as camadas da população. Somente através dessa educação, será possível criar “uma confiança na autoridade do conhecimento”, conforme expressou.

“A educação precisa trazer não só novidades para os jovens que não estão com a mesma dinâmica de ficar sentado numa sala de aula que parece uma linha de montagem. Eles também precisam ter uma construção de conhecimento que não é um conhecimento de memorizar”, avaliou.

Yurij Castelfranchi, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), destacou a necessidade de uma análise mais aprofundada dos fatores que influenciam o negacionismo, evidenciando que nem sempre a ignorância é o fator central. Ele apontou que existem pessoas com acesso ao conhecimento científico que rejeitam as evidências por interesses pessoais ou políticos, enquanto muitos brasileiros com baixo acesso ao letramento científico apoiam a ciência. “Não é apenas a ignorância e a falta de acesso ao conhecimento que geram atitudes de hostilidade. Mas a desinformação tende, sim, a gerar incerteza. Incerteza de confiança nas instituições, não tanto no conhecimento científico”, acrescentou.

Helena Bonciani Nader, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), alertou para o caráter global do negacionismo científico e ressaltou a importância de compreender quem se beneficia com essa campanha de descredibilização do desenvolvimento científico. Ela destacou a responsabilidade do Estado brasileiro em garantir a saúde das crianças, enfatizando que a vacinação é uma obrigação coletiva.

Para o divulgador científico Átila Iamarino, mudar o cenário atual demandará mudar a maneira de se comunicar, educar e investir em ciência, considerando o crescente consumo de conteúdo digital, principalmente em plataformas como Google, YouTube, WhatsApp, Facebook e Instagram. “Só assim conseguiremos ocupar esses espaços de forma efetiva”, finalizou.

Veja aqui a audiência na íntegra.

Jornal da Ciência, com informações da Agência Senado