A história viva do relevo brasileiro: Aziz Ab’Sáber e o impacto de sua obra

Conferência da 76a Reunião Anual da SBPC homenageia o geógrafo que desvendou a paisagem do Brasil e defendeu sua preservação
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Jardel Rodrigues/SBPC

O relevo brasileiro, com suas serras e planícies, é mais do que uma paisagem: é um testemunho vivo de uma história geológica de milhões de anos, moldada por forças como o intemperismo e a erosão. No entanto, essa narrativa geológica tem sido alterada pelas atividades humanas, tanto urbanas quanto rurais. Aziz Ab’Sáber, renomado geógrafo brasileiro, dedicou sua vida à defesa do meio ambiente e à preservação da biodiversidade. Em sua homenagem, foi realizada a conferência “Aziz Ab’Sáber e o impacto de sua obra” durante a 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece de 7 a 13 de julho na Universidade Federal do Pará (UFPA).

Renato Janine Ribeiro, professor da USP e presidente da SBPC, abriu o evento destacando o livro “Ciência, Meio-ambiente e Cidadania (Uma Homenagem Ao Mestre!)”, lançado durante a reunião. “Aziz Ab’Sáber era um homem progressista, com forte convicção no respeito à ciência, à diversidade e à democracia, e acreditava que o Brasil deve ser um país para todos”, ressaltou.

Roseli de Deus Lopes, professora da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (EP-USP), relembrou o período em que Ab’Sáber trabalhou no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, onde desenvolveu o projeto “Floram, que visava à recuperação da cobertura vegetal brasileira, especialmente nas florestas. Ela anunciou que o trabalho de Ab’Sáber inspirou a retomada do projeto, agora focado no reflorestamento e nas questões climáticas.

Francisco de Assis Mendonça, professor da UFPR, anunciou o lançamento da plataforma Floram-Aziz Ab’Sáber, que unirá o IEA da USP e a SBPC para formar um grupo de gestores e pensadores dedicados à restauração das paisagens brasileiras, não apenas na Amazônia, mas em todo o País. “Os debates na COP em Dubai sobre o desmatamento da Amazônia nos mostraram a necessidade de um projeto de restauração que seja tanto nacional quanto mundial”, explicou.

A conferência, ministrada por Wagner Costa Ribeiro, professor do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador da Rede de Pesquisa em Geografia das Águas no Brasil, iniciou destacando as importantes contribuições de Aziz Ab’Sáber para os estudos do relevo brasileiro e do meio ambiente. Entre essas contribuições estão os Domínios Morfoclimáticos, que representam a interação entre clima, relevo e vegetação, resultando em paisagens distintas que podem ser individualizadas. Aziz Ab’Sáber identificou seis domínios no Brasil: amazônico, da Caatinga, do Cerrado, dos mares de morro, das araucárias e das pradarias, enfatizando a importância crucial de sua conservação para o meio ambiente. Além disso, Ab’Sáber teorizou sobre a Teoria dos Redutos, que explora o avanço e recuo das diferentes vegetações em resposta às mudanças climáticas globais. Introduziu também o conceito de Stone Lines (linhas de pedra), indicadoras de climas mais secos no passado, e o Zoneamento Ecológico Econômico, uma base organizada de informações que sustenta a gestão territorial com critérios de sustentabilidade econômica, social, ecológica e ambiental. “Ele é de grande importância para nós, geógrafos, que buscamos compreender a complexa interação da natureza”, destacou Ribeiro.

Wagner Ribeiro também ressaltou o engajamento político e social de Aziz Ab’Sáber. Além de ter sido presidente da SBPC (1993-1995), ele liderou o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo (CONDEPHAAT) de 1982 a 1983, onde estabeleceu diretrizes cruciais para a política de preservação das reservas naturais em São Paulo. Sua influência na política científica e ambiental do Brasil foi profunda, marcada por um ativismo incansável e uma paixão duradoura pela pesquisa geográfica. Ab’Sáber foi um defensor fervoroso do papel da ciência na tomada de decisões, alertando para os perigos de ignorar o conhecimento científico em prol de interesses momentâneos. “O professor Aziz Ab’Sáber é um grande exemplo de cientista engajado politicamente, dotado de uma profunda sensibilidade social”, afirmou.

Laila Salmen Espindola, professora da UnB e diretora da SBPC, finalizou a conferência homenageando Ab’Sáber. “Temos a oportunidade de ter tido pessoas como o professor Aziz, que já tinham esse olhar clínico para a natureza, algo que tanto precisamos hoje. Precisamos reunir pesquisadores do mundo inteiro para fazer o que ele fez sozinho”, declarou.

Assista à conferência na íntegra:

https://www.youtube.com/watch?v=X5wii-e9Dt8

Chris Bueno – Jornal da Ciência