Cientistas entregam propostas aos presidenciáveis para a área de ciência e tecnologia

Dobrar o esforço de investimento do país em ciência e tecnologia, de 1% para 2% do PIB nacional, “como ocorre em países desenvolvidos”. Agregar valor tecnológico à produção industrial brasileira e “readequar nossa legislação de propriedade intelectual para o século 21”. Incluir a Amazônia na agenda nacional e estudar muito mais a fundo o mar territorial brasileiro, em todos os seus aspectos.
Documentos preparados pela ABC e pela SBPC pedem valorização da educação, da ciência e da inovação na indústria como formas de alavancar o desenvolvimento do país
Dobrar o esforço de investimento do país em ciência e tecnologia, de 1% para 2% do PIB nacional, “como ocorre em países desenvolvidos”. Agregar valor tecnológico à produção industrial brasileira e “readequar nossa legislação de propriedade intelectual para o século 21”. Incluir a Amazônia na agenda nacional e estudar muito mais a fundo o mar territorial brasileiro, em todos os seus aspectos. Valorizar os professores, estimular a formação de técnicos e modernizar a gestão das universidades públicas, “com sistemas de gestão e financiamento compatíveis com as mais destacadas instituições internacionais”.
Essas são algumas das propostas apresentadas pela Academia Brasileira de Ciências (ABC) num documento que será entregue a todos os candidatos à presidência do Brasil, intitulado Por uma política de Estado para ciência, tecnologia e inovação. São 41 propostas no total, organizadas em quatro grandes temas: O Brasil na Fronteira da Produção do Conhecimento; Agregação de Valor à Produção e Exportação do Setor Industrial; A Bioeconomia e a Conservação e o Uso Sustentável dos Biomas Nacionais; e O Brasil Precisa de uma Revolução na Educação.
Veja o documento aqui: Politica de Estado para ciencia tecnologia e inovacao _ 2014[2]
A primeira autoridade a receber o documento foi a presidente Dilma Rousseff, numa reunião do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT), em junho. A segunda foi a candidata à vice-presidência Marina Silva, ontem, na reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que neste ano ocorre na Universidade Federal do Acre, em Rio Branco – berço geográfico e acadêmico de Marina. O candidato à presidência Eduardo Campos, que foi ministro de Ciência e Tecnologia na primeira gestão do governo Lula, havia confirmado participação no evento, mas cancelou a viagem na última hora por causa da morte do escritor Ariano Suassuna, que era amigo de sua família em Pernambuco.
“Nós queremos ouvir a comunidade científica, não só para legitimar o que já foi decidido, mas para influenciar os processos que estão em curso na administração pública”, disse Marina. “A ciência é fundamental, se não para nos ajudar a encontrar novos caminhos, para nos mostrar novas maneiras de caminhar”, completou ela, usando como exemplo a necessidade de criar um modelo de desenvolvimento diferenciado para a Amazônia, baseado na biodiversidade, que não reproduza simplesmente os modelos econômicos das outras regiões.
Sobre a possibilidade de assumir um compromisso de aumentar os investimentos em ciência e tecnologia para 2% do PIB (hoje esse índice é de aproximadamente 1,1%), Marina disse que essa possibilidade está sendo analisada por sua campanha, mas que ainda não há uma posição fechada com relação a ela. “Não posso dizer que vamos assumir esse compromisso (de 2%)”, disse. “Mas com certeza há um compromisso de fazer uma ampliação desses recursos.” Ela ressaltou que há várias outras áreas reivindicando compromissos orçamentários semelhantes, e que se “carimbar demais” o orçamento, corre-se o risco de engessa-lo.
A SBPC declarou apoio ao documento da ABC e entregou a Marina uma carta própria, elaborada pelo conselho da entidade na reunião de Rio Branco, e também endereçada aos presidenciáveis (que foram todos convidados para o evento). Além do aumento dos investimentos em ciência e tecnologia, a carta pede mais transparência do governo federal com relação à aplicação desses recursos.
“Será importante também conhecer o volume de recursos destinados por lei a CT&I, contingenciados em sucessivas administrações e acumulados nas contas do Tesouro”, diz a carta, que também pede proteção à pesquisa básica, num momento em que as políticas públicas do setor dão uma ênfase cada vez maior à pesquisa aplicada, voltada para a inovação tecnológica. “Imaginar que a Política de Ciência e Tecnologia deva se concentrar  nas áreas de aplicação industrial inovativa é desconhecer o papel seminal da pesquisa básica.  Trata-se de  um grave equívoco que compromete o desenvolvimento cientifico e tecnológico.”
Leia a carta aqui: Carta_da_SBPC_aos_candidatos
PARCERIA
Em sua fala para um auditório recheado de pesquisadores e alunos da área de ciência, Marina disse que é preciso haver uma “parceria profunda entre o governo e a comunidade científica”. “Muito do conhecimento que vocês produzem fica na prateleira, e acaba não sendo levado em conta pelo governo nos processos de tomada de decisão”, afirmou.
Marina, que foi ministra do Meio Ambiente no primeiro mandato do governo Lula, citou como exemplos os casos da revisão do Código Florestal e do descaso dos governos com relação ao risco de uma crise hídrica no País. “Desde 2001 a ciência vem alertando para esse risco. Treze anos se passaram e parece que não aprendemos nada; os alertas da ciência não estão sendo ouvidos.”
Com relação à conservação da Amazônia, é com base na ciência, segundo Marina, que seria possível assumir um compromisso de desmatamento zero, sem prejuízos para o agricultura brasileira.
“Sou acusada de ser contra o agronegócio, mas os estudos mostram que o Brasil não precisa aumentar sua produção pela expansão predatória (da fronteira agrícola) sobre os biomas brasileiros. Podemos dobrar a produção sem derrubar mais nenhuma árvore”, disse.
Perguntada sobre sua posição com relação ao uso de animais em pesquisa – um dos temas mais polêmicos no relacionamento da ciência com a sociedade – Marina disse que defende o uso de métodos alternativos, quando isso for viável, mas não se opõe ao uso de animais, quando isso for necessário para o avanço da ciência e da medicina. “O que não pode é haver uma banalização”, afirmou.