Carolina Bori entendia a Ciência para além da produção de conhecimento, relatam pesquisadores

Mesa especial realizada nessa terça-feira (06/02) reuniu cientistas que foram orientandos de Bori durante a graduação e pós-graduação; segundo estudiosos, a cientista pregava que a preocupação da ciência era com a sociedade

del_4458_editedComo parte da programação em comemoração ao centenário da pesquisadora Carolina Bori, iniciada em janeiro, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) promoveu uma sessão especial que reuniu orientandos e demais especialistas que trabalharam com Bori para debater o seu papel como educadora e pesquisadora.

Realizada na última terça-feira (06/02), a mesa-redonda foi coordenada pela professora emérita pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Maria do Carmo Guedes, e contou com as presenças de Júlio César de Rose, professor titular da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos); Lino de Macedo, professor emérito pelo Instituto de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo), Marilena Ristum, professora titular aposentada da Universidade Federal da Bahia (UFBA); e Raul Albino Pacheco Filho, professor titular da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da PUC-SP.

Professor titular da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Silvio Paulo Botomé também foi convidado a participar da mesa, mas não pôde comparecer presencialmente.  Botomé encaminhou um depoimento em texto, que foi lido pela diretora da SBPC, Fernanda Sobral:

“Para Carolina, a ciência não importava apenas como uma forma do conhecer, a sua atuação também está marcada na construção da sociedade”, afirmou o especialista, no documento.

Botomé ressaltou as ações de Carolina Bori na construção da política educacional, com ênfase à regulação da profissão de psicologia. “Carolina sabia as diferenças entre fazer ciência e aplicar a ciência. A lembrança de Carolina Bori como algo eterno se torna imprescindível.”

Primeira entre os presentes a falar, a professora Marilena Ristum ressaltou a preocupação de Bori com a promoção da psicologia e como ela rompia os padrões do que hoje se entende como orientação em pesquisas: ao invés do pesquisador indicar temas aos orientandos, Bori ouvia os seus estudantes e embarcava nos questionamentos de cada um deles.

“Carolina tinha a habilidade de acolher o interesse de seus orientandos, mesmo que esse interesse fosse em áreas em que ela não tinha tanto conhecimento. Ela tinha uma visão de que ciência se faz com diversidade, e essa diversidade é enriquecedora.”

As diferenças entre o ensino do passado e dos dias de hoje também foram foco da fala do professor Júlio César de Rose, da UFSCar. Rose relatou que, enquanto orientando de Carolina Bori, entre 1973 e 1981, via uma fila de pessoas se formar cotidianamente na sala da pesquisadora, que atendia a todos.

“Naquela época, a pós-graduação era bem diferente, não se publicava muito. Uma vez, perguntei à Carolina o porquê disso e ela me respondeu: ‘não se publica porque não se tem revistas científicas aqui’. Isso incomodava Carolina, aliás. Foi assim que ela começou a dedicar esforços para promover os estudantes e criou várias ações para a divulgação científica.”

Professor emérito pelo Instituto de Psicologia da USP, Lino de Macedo destacou que muito da atuação de Carolina Bori ficava nos bastidores. “O lugar de Carolina Bori não é apenas institucional, é importante reconhecê-la como pessoa. A dona Carolina era uma mestra, no sentido pleno desse termo. E quando a gente chama alguém de mestre, a gente entende que esse alguém tem discípulos. Ser orientado por Carolina era ter alguém que não era necessariamente da minha área, mas que tinha exigências, tinha rigor, tinha visão de conjunto, sabia questionar e criticar as formas de fazer pesquisa, sabia questionar o que era ser um profissional da academia. E a dona Carolina era tudo isso.”

Encerrando as falas do dia, o professor da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da PUC-SP, Raul Albino Pacheco Filho reforçou que o grande mérito de Carolina Bori era valorizar as diferenças, tanto políticas, de pensamentos e de visões acadêmicas.

“Carolina Bori tinha uma posição que extrapolava sua dimensão de grande analista comportamental, ela era uma personagem imbuída da missão de fazer avançar a ciência, de um modo amplo e extenso, para além da abordagem ou do campo científico em que atuava. Não é sem razão que, após ter se incumbido na direção de diversas entidades e instituições da Psicologia, essa grande mulher tenha tomado para si a tarefa de contribuir com o progresso da Ciência, exercendo diversas funções na SBPC, até chegar à sua Presidência.”

A mesa “Carolina Bori como educadora e pesquisadora”, com os depoimentos pessoais dos pesquisadores que foram orientados por Carolina Bori, está disponível na íntegra no canal da SBPC no YouTube.

 

Rafael Revadam – Jornal da Ciência