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Regulamentação da profissão de cientista em debate

Cientistas e dirigentes de instituições universitárias se posicionaram contra a regulamentação da profissão de cientista, na audiência pública realizada nesta terça-feira, 19, pelas comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público; e de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, da Câmara dos Deputados.
SBPC, ABC e Andifes têm posicionamento contrário à regulamentação da profissão de cientista. Para Helena Nader, ser cientista é um ofício e não uma profissão

Cientistas e dirigentes de instituições universitárias se posicionaram contra a regulamentação da profissão de cientista, na audiência pública realizada nesta terça-feira, 19, pelas comissões  de Trabalho, de Administração e Serviço Público; e de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, da Câmara dos Deputados.

O secretário-executivo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Gustavo Henrique Balduíno, e a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, centralizaram “o debate sobre uma possível regulamentação da profissão de cientista.”

Balduíno citou dados do Ministério do Trabalho (MTE), apresentados na abertura da audiência, e disse que a burocracia e o sistema vigente de fiscalização não combinam com a atividade de cientista.

“Uma das coisas mais primordiais e mais defendidas, em qualquer espaço de atuação da atividade de cientista, é a liberdade dele como cientista”, afirmou. “Seria inaceitável que alguém fosse fiscalizar a atividade de um cientista dentro do laboratório. Isso não existe no Brasil e nem em nenhum lugar do mudo.”

Balduíno acrescentou que a ciência não está restrita ao espaço universitário. “No Brasil temos o viés de imaginar que a ciência está restrita à universidade. Mas a ciência é feita em vários lugares”, disse.

Ele citou órgãos como Embrapa, institutos de pesquisa estaduais e do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que realizam ciência.

“Não é possível imaginar  criar uma regulamentação pensando apenas na universidade, seja ela federal, estadual e privada.”

SBPC avalia que haveria consequências graves

Com a mesma opinião, a presidente da SBPC, Helena Nader, apresentou algumas definições do exercício de cientista. Para ela, ser cientista é um ofício e não uma profissão. “Em nenhum lugar do mundo existe a profissão de cientista, porque praticar a ciência não é prerrogativa exclusiva de um segmento profissional”, disse Helena que também representou a Academia Brasileira de Ciências (ABC) na audiência.

Na avaliação de Helena, qualquer proposta para regulamentar a profissão de cientista é uma mera iniciativa para garantir reserva de mercado, numa atividade em que a opção é mais ocupação do que profissão.

No entendimento de Helena, uma eventual regulamentação da profissão de cientista poderia trazer “consequências graves” ao Brasil. Isso porque, disse, o País deixaria de formar recursos humanos qualificados com a justificativa da empregabilidade. “A SBPC e ABC se posicionam contrárias à regulamentação da profissão de cientista”, reforçou.

Ela explicou que são cientistas professores universitários, pesquisadores de institutos de pesquisas e de empresas públicas e privadas; estudantes de pós-graduação, bolsistas de pós-doutorado, além dos autodidatas.

Helena defendeu o sucesso obtido na pós-graduação do Brasil que, segundo disse, é reflexo de uma política de estado adotada para tal segmento. “O modelo da pós-graduação é orgulho nacional, modelo que tem sido referenciado mundialmente”, disse Helena.

Conforme entende Helena, a pós-graduação é uma formação qualificada de recursos humanos para o desenvolvimento educacional, econômico, social e ambiental do País.

Próximos passos

O presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia, deputado Fábio Sousa (PSDB-GO), mediou a audiência, e lamentou a ausência de convidados que defendem a regulamentação. Segundo disse, a comissão realizará outras audiências para discutir o tema. “O Brasil não pode continuar tendo pouco investimento em inovação científica e tecnológica como tem”, declarou. A audiência desta quarta-feira foi sugerida por Fábio Sousa e pelo deputado Alexandre Baldy (PSDB-GO).

Para Balduíno, a dificuldade para fazer ciência no Brasil não é falta de regulamentação da profissão. Ele entende que a dificuldade é um conjunto de ações impeditivas, nas relações do setor produtivo, do setor público e do financiamento.

Em outra frente, a presidente da SBPC voltou a criticar o contingenciamento de recursos para pasta de Ciência, Tecnologia e Inovação. “Não é possível fazer planejamento sem ter recurso garantido. E os cortes têm sido sistemáticos”, pontuou.

Produção científica

A presidente da SBPC mostrou dados em que o Brasil situa entre os 20 primeiros países em número de publicações científicas. E existem 155 mil bolsistas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) desenvolvendo pesquisas em diversas áreas.

Disse que o Brasil responde por 70% de toda produção científica da agricultura na América Latina, número parecido com o que registra na medicina, de quase 70%.

Para Helena, a pujança na produção científica do Brasil é atrelada a um número de bolsas de estudos de doutorado. “Existe uma relação boa entre os programas de pós e a produção científica.”

(Viviane Monteiro/Jornal da Ciência)