O Legado da Escravidão e o Futuro do Brasil

Conferência foi apresentada pelo escritor e jornalista Laurentino Gomes

Laurentino- O LEGADO DA ESCRAVIDÃO E O FUTURO DO BRASILO Brasil foi o maior território escravista do Ocidente, o último a extinguir o tráfico negreiro, e o último a abolir a escravidão. O resultado é um legado de desigualdade social, exclusão e violência. Essa foi a discussão da conferência “O Legado da Escravidão e o Futuro do Brasil”, realizada esta quinta-feira (22) na 73ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

O evento teve a participação do escritor e jornalista Laurentino Gomes e foi mediado pelo presidente da SBPC e docente da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ildeu de Castro Moreira. Autor dos best-sellers “1808”, “1822” e “1889”, que abordam o período monarquista do Brasil, Gomes agora publica a trilogia “Escravidão”, sobre a época escravagista do país.

A herança do racismo no Brasil foi gerada por mais de três séculos de escravidão. Entre 1501 e 1870, mais de 12,5 milhões de africanos foram vendidos como escravos para o continente americano. Desses, um em cada quatro foram enviados para o Brasil (cerca de 4,8 milhões até a segunda metade do século 19).

“Tudo o que nós fomos no passado, o que nós somos hoje e o que nós seremos no futuro só pode ser explicado pela escravidão. Considero esse o assunto mais definidor da história do Brasil”, afirma Gomes.

Grande população, baixa representação

Apesar de ser o país com a maior população negra fora da África, de acordo com o Ministério das Relações Exteriores, essa população está sub-representada em todos os setores da vida social no Brasil. São 56,10% pessoas que se autodeclaram negras no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), equivalente a 19,2 milhões de indivíduos. No entanto, no mercado de trabalho, pretos e pardos ocupam apenas 29,9% dos cargos de gerência segundo a pesquisa “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil” do IBGE.

A baixa representatividade de negros em cargos de decisão também é visível na política: de acordo com levantamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 17 dos 24 partidos com representação no Congresso, a participação de quem se autodeclara negro nas cúpulas partidárias vai de zero a 41%. O cenário não muda na academia: um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostrou que apenas 18% dos negros entre 18 e 24 anos estavam cursando ou já haviam concluído o ensino superior.

“Eu diria que o principal traço do racismo brasileiro é silencioso e cúmplice. Existe hoje uma grande maioria dos brasileiros brancos que jamais se assumiria como racista, jamais teria coragem de pronunciar uma injúria racial, mas aceita como se fosse um fato natural da vida um Brasil desigual, em que pobreza e falta de oportunidade é sinônimo de negritude”, alerta Gomes.

Violência

Por outro lado, os casos de homicídio de pessoas negras aumentaram 11,5% em uma década, de acordo com o Atlas da Violência 2020. O relatório mostra que os negros representaram 75,7% das vítimas de todos os homicídios em 2018. Além disso, 75,2% dos pretos e pardos encontram-se entre os 10% com menores rendimentos per capita no País, segundo a pesquisa “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil” do IBGE.

“Discutir o racismo e a herança da escravidão não é uma mera ‘firula intelectual’”, afirma Gomes. “É importante que as pessoas entendam que esse assunto obrigatoriamente terá que fazer parte da agenda de todo partido político que tiver projetos para enfrentar a desigualdade social, e portando promover essa segunda abolição.”

Assista à conferência na íntegra, no canal da SBPC no YouTube.

Christiane Bueno – Jornal da Ciência