Proteção das florestas tropicais é essencial para zerar emissões de carbono até 2050

Especialistas alertam que Amazônia está próxima do ponto de não retorno devido ao desmatamento e às mudanças climáticas em mesa-redonda da 76a Reunião Anual da SBPC

Mesmo com a substituição dos combustíveis fósseis por fontes renováveis, será praticamente impossível zerar as emissões de carbono até 2050 sem proteger as florestas tropicais, principalmente a Amazônia. Esse foi o grande alerta dado pelos especialistas da mesa-redonda “Mudanças climáticas e ciclo de carbono na Amazônia”, realizada nesta quinta-feira (11/07) durante a 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece de 7 a 13 de julho na Universidade Federal do Pará (UFPA).

A mesa-redonda foi coordenada por Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), e contou com a participação de Vania Neu, professora do Instituto Socioambiental e dos Recursos Hídricos da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), e Bruce Rider Forsberg, gerente científico do Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA) do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).

As florestas tropicais, especialmente a Amazônia, possuem o maior estoque de CO2 do planeta. E estudos globais indicam que estamos próximos de um ponto sem retorno nas mudanças climáticas, impulsionadas pelo desmatamento e degradação das florestas. Segundo Paulo Artaxo, “a degradação florestal está começando a dominar o processo de perda de carbono da floresta e esse processo pode ser irreversível”. O desmatamento e as mudanças climáticas já alteraram aspectos importantes do ecossistema amazônico, como a fotossíntese, essencial para a captura de CO2. Com temperaturas mais elevadas, a quantidade de gás carbônico assimilada pela fotossíntese está diminuindo drasticamente. Ele alertou que, nos próximos dez ou quinze anos, as mudanças que se instalarem determinarão o clima dos próximos séculos. Ainda, ressaltou que, mesmo que o Brasil zere o desmatamento até 2030, se os países desenvolvidos não pararem de emitir combustíveis fósseis, a Amazônia sofrerá consequências severas. “É importante perceber que o futuro das florestas tropicais está intimamente ligado ao futuro de todo o nosso planeta”, afirmou.

Vânia Neu, líder de um estudo sobre as trocas de carbono e nitrogênio no delta do Amazonas, destacou a importância de entender como os processos hidrodinâmicos afetam essas trocas. A pesquisa revelou que essas trocas têm sofrido alterações significativas, impactando o clima. Em 2023, a região enfrentou uma das piores secas de sua história, exemplificando ao impactos das mudanças climáticas. Ela aponta que as consequências já podem ser sentidas, especialmente na mudança do regime de chuvas, com inundações ou secas mais frequentes e intensas — em 2023, a região enfrentou uma das piores secas de sua história. “Os problemas já estão acontecendo. Não é só a Amazônia que vai secar mais, mas todas as outras regiões produtoras. O celeiro da produção de grãos do Brasil é um dos que será seriamente afetado com a mudança do regime das chuvas. Então temos custos econômicos e sociais muito grandes”, alertou. Ela destacou o papel fundamental das populações tradicionais na conservação da Amazônia, que dependem da preservação dessa região para sua sobrevivência. “Não podemos esquecer que na Amazônia vivem pessoas. A conservação, manutenção dos estoques de carbono e os serviços ecossistêmicos, assim como o equilíbrio climático do planeta, dependem das condições mínimas para que os povos, as águas e as florestas possam continuar com seu papel único.”

Além disso, Bruce Forsberg explicou que o fluxo líquido de carbono da Amazônia está diminuindo. “Até o presente, tanto o ecossistema florestal quanto o aquático tendem a sequestrar carbono, mas essa capacidade está diminuindo, com algumas áreas mais degradadas já começando a liberar carbono” disse. O Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA) comprovou que desflorestamentos e queimadas aceleram o efeito estufa, alteram a formação de nuvens e podem modificar o regime de chuvas na Amazônia e além. A proteção das florestas tropicais é crucial para mitigar as mudanças climáticas e alcançar a meta de zerar as emissões de carbono até 2050. Caso contrário, enfrentaremos consequências irreversíveis para o clima global. “Se mantivermos a floresta do jeito que está, apenas não alterando as mudanças climáticas vindas de fora, esperamos atingir um aumento das temperaturas em torno de 3°C a 4°C. Agora, se tirarmos completamente a floresta em um processo de savanização, aí teremos aumentos de até 8°C a 9°C nas temperaturas”, alertou.

Assista à mesa-redonda na íntegra:

https://www.youtube.com/watch?v=zgb8r76SxnI

Chris Bueno, Jornal da Ciência