Prefácio
O centenário de nascimento de Carolina Bori (1924-2004), em 2024, ensejou comemorações variadas nas instituições educacionais e científicas em que ela atuou ou com as quais colaborou.
Muito expressivas e de grande visibilidade foram as iniciativas, ao longo de todo o ano, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, da qual ela foi a primeira mulher a exercer a presidência. Entre as homenagens, destaca-se o Memorial Carolina Bori, disponibilizado na página da entidade, pelo seu caráter de registro permanente, rico acervo em documentos, registros da atuação de Carolina na SBPC, textos de sua autoria e de outros que escreveram sobre ela, entrevistas, vídeos e fotografias.
A publicação deste livro de Gabriel Vieira Cândido com selo da SBPC insere-se neste conjunto de homenagens.
Embora muito tenha sido dito e escrito sobre Dona Carolina, ainda em vida (como no volume especial da Revista Psicologia USP, de 1998, publicado em sua homenagem) ou após seu falecimento, ocorrido em 2004, o texto de Gabriel é uma contribuição original e de extrema relevância.
Diferente de outras importantes contribuições, em geral narrativas e memórias da perspectiva dos autores e suas interpretações sobre ações, motivações e convicções de Carolina, Cândido apresenta “a vida pública e obra de Carolina Martuscelli Bori”. Seu texto, portanto, não resulta de experiências pessoais com Bori, mas de anos de pesquisa científica estudando sua produção escrita na forma de artigos científicos, dissertação de mestrado, tese de doutorado, tese de livre-docência, editoriais de revista científica, discursos em sessões de abertura de reuniões anuais da SBPC, entrevistas, prefácios e apresentação de livros, resumos de trabalhos apresentados em congressos e também em correspondências com colaboradores, como o professor Fred Keller.
A pesquisa de Cândido foi dirigida por sua sólida formação como historiador da Psicologia, sob orientação de duas expoentes nesse tipo de investigação, Maria do Carmo Guedes e Marina Massimi. A intensa e prolongada imersão nesse universo permitiu que ele sintetizasse e iluminasse não só o foco geral da atuação de Carolina Bori – psicologia, educação e política científica (no subtítulo do livro), mas também que mostrasse a evolução e a extensão dessa atuação, nos contextos culturais e científicos em que se manifestaram. Eu não resumiria melhor que o próprio autor:
Apesar de ser reconhecida por sua competência teórica e conceitual, a principal marca dessa pensadora e cientista está na mudança de comportamento que gerava entre os cientistas no Brasil. E, enquanto debatia as mudanças necessárias para o desenvolvimento científico e o crescimento do país, sua visão sobre ciência e psicologia ia sendo desenhada (p.17).
Sua visão de ciência e psicologia permitiu que ela se inserisse no cenário político-científico nacional e representasse a posição de cientistas das mais variadas áreas do conhecimento, influenciando assim opiniões sobre os rumos da ciência no país. Sua atuação se ampliou, indiscutivelmente, ao nível nacional, e marca, ainda, uma linha de desenvolvimento da cultura científica brasileira nos dias atuais (p.16-17).
O que se tem neste livro é, então, uma parte importante da história da ciência, da psicologia, da educação e da política científica no Brasil durante a segunda metade do século 20 (p.17).
Como contemporânea, aluna e colaboradora de Carolina, só posso apreciar, com emoção e gratidão, esse rico retrato “público” da pesquisadora que continua fazendo história.
Estou certa de que este livro de Gabriel Cândido será útil e apreciado por diferentes audiências interessadas nos tópicos de que trata e, sobretudo, que será um importante instrumento para a formação de novos pesquisadores (como queria Carolina), na ciência em geral, mas em particular na Psicologia e na Análise do Comportamento.
São Carlos, janeiro de 2025.
Deisy G. de Souza
UFSCar