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Sérgio Mascarenhas passeia pela história da cultura e ciência e defende um modelo independente de desenvolvimento

O renomado e premiado cientista emocionou a plateia de pesquisadores e estudantes na 64ª Reunião Anual da SBPC, propôs uma "revolução tropical" mais humanista e falou da Olimpíada do Conhecimento, que poderá ser realizada em 2016.

O renomado e premiado cientista emocionou a plateia de pesquisadores e
estudantes na 64ª Reunião Anual da SBPC, propôs uma “revolução tropical”
mais humanista e falou da Olimpíada do Conhecimento, que poderá ser
realizada em 2016.

Sérgio Mascarenhas nunca passa despercebido.
Essa “fortaleza”, segundo as palavras da presidente da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, chama a
atenção tanto pela abundante sabedoria e méritos quando pela
simplicidade e gentileza com que trata as pessoas. Não foi diferente na
quarta-feira (25) quando apresentou – de pé e se movimentando muito
“para estimular o cérebro” – a conferência Dependência é morte:
propostas para o Brasil do século XXI.

Helena, que introduziu a palestra, deu um
panorama da trajetória de Mascarenhas, físico, químico e presidente de
honra da SBPC, citando prêmios como o Grã Cruz da Ordem do Mérito
Científico, cátedras internacionais e cargos como os de professor
visitante em universidades como Harvard, Princeton e no MIT. Também
lembrou seu papel como um dos criadores da Embrapa.

Mascarenhas abriu a conferência avisando que a “ciência brasileira está
sendo machucada”, numa referência ao contingenciamento de recursos da
área de Ciência, Tecnologia, Inovação e Educação.
Da Grécia Antiga à internet – O professor
recordou a importância de conhecer a história para acertar no futuro e
por isso estruturou a aula usando seis grandes revoluções tecnológicas e
culturais da Humanidade. Ao falar do primeiro período escolhido, que ia
do início do pensamento greco-romano até a idade medieval, lembrou a
necessidade de unir a teoria (Platão) à prática (Aristóteles), para em
seguida emendar no Renascimento e no início da ciência moderna, com
Galileu

Galilei e Isaac Newton.

Depois, pontuou a “sofisticação” do Iluminismo e
o marco político que a Revolução Francesa representou para o mundo, “um
padrão de revolta”. A partir daí, os avanços começam a se acelerar,
entrando na Revolução Industrial e logo na Revolução do século XX, com a
ciência se desenvolvendo a partir da mecânica quântica, relatividade,
física atômica e nuclear, além das pesquisas espaciais.

Finalmente, ele chegou ao século XXI, pontuando
os sistemas complexos, a globalização, energias alternativas e
sustentabilidade, dando destaque a Alan Turing e Claude Shannon. “Se não
fosse por eles, não haveria internet, celulares, robótica, mas ninguém
sabe quem são”, destaca. Mascarenhas disse que é o momento da “revolução
do conhecimento”. “É nossa chance para essa crise. Agora que a Europa
está indo para o fundo, temos a portunidade de criar uma cultura mais
apropriada e mais humanista, talvez uma revolução tropical”, sugere.

Nesse sentido, ele insiste que é necessário
“sair dessa cultura porca de 500 anos de colonização portuguesa e
espanhola” e criar modelos de desenvolvimento próprios, o que
necessariamente passa por inovação e por “sair da torre de marfim”, numa
referência aos
acadêmicos que teimam em não valorizar o
intercâmbio com os criadores de tecnologia. “Acham que são vendidos e
que estão gastando o dinheiro do Governo com as empresas”.

“Até hoje estamos
exportando commodities e se não fosse a Embrapa estaríamos pior ainda.
Temos que nos impregnar dessa história para termos poder de decisão e de
criar políticas de Estado”, afirma. Para implementar a inovação, ele
sugere o modelo dos cinco “is”: invenção, imitação,
interdisciplinaridade, imperfeição corretiva e investimentos.

Banquete de Tântalo – Mascarenhas ressalta uma
série de limitações e problemas como o analfabetismo, tanto literal
quanto filosófico. “O que o Brasil tem de melhor são as crianças e não o
fato de termos mais de duzentos milhões de celulares. Tantos celulares
para comunicar o quê?”, alega.

Ele também relaciona ciência e arte, ressaltando
a importância dos estudos sociais e manifestações culturais. “A
literatura é tão importante quanto a física, aliás, é ainda mais
importante. Cesar Lattes dizia que a ciência é filha bastarda das
artes”, relembra. “O que elas têm em comum? A criatividade. Há muito
cientista que não é criativo e os artistas, assim como as crianças, são
inovadores, isso é darwiniano”, compara.

Ainda usando o gancho da arte, mostrou uma
pintura que representa o mito grego do Banquete de Tântalo, que
esquartejou o próprio filho para impressionar os deuses. “Estamos
fazendo isso com as crianças brasileiras, um esquartejamento cultural
com analfabetismo, esquartejando o futuro delas e do País”, sublinha,
citando o Programa Nacional de Alfabetização na Idade Certa como uma das
soluções.

Mascarenhas também falou da proposta de realizar
uma Olimpíada do Conhecimento em 2016, paralelamente aos jogos
olímpicos no Rio de Janeiro. A proposta foi bem recebida pelos
ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia e Inovação e um comitê
para organizar a competição está sendo constituído. Ele também falou da
criação de uma rede nacional de centros interdisciplinares de sistemas
complexos, que já foi proposta por Mascarenhas a Capes.

(Clarissa Vasconcellos – Jornal da Ciência)