Presidente do CNPq apresenta nova proposta de avaliação de projetos em CT&I

“Não podemos só prometer, temos que mostrar o impacto de tudo que já fizemos”, alertou Hernan Chaimovich sobre a importância de se avaliar estrategicamente os projetos de pesquisa, em reunião com a comunidade científica ontem (5), na SBPC, em São Paulo

“Não podemos só prometer,
temos que mostrar o impacto de tudo que já fizemos”, alertou Hernan Chaimovich
sobre a importância de se avaliar estrategicamente os projetos de pesquisa, em
reunião com a comunidade científica ontem (5), na SBPC, em São Paulo

O presidente do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Hernan Chaimovich,
apresentou nesta segunda-feira, 5 de setembro, um novo formato de gestão e
avaliação de  projetos em Ciência, Tecnologia e Inovação que está em
discussão no CNPq, e que tem como prioridade o impacto social, intelectual e
econômico do estudo. A apresentação foi feita para representantes de sociedades
associadas da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e outros membros
da comunidade científica, que se reuniram ontem na sede da SBPC em São Paulo.

Chaimovich falou sobre a
importância de mudar a maneira de avaliar a qualidade da ciência, muito focada
em números e resultados, quando se deveria pensar no impacto que esse
conhecimento deve ter na sociedade. “A comunidade científica está muito
acostumada a apresentar resultados; isso é a mesma coisa que uma pessoa dizer
que vai apresentar uma lavadora de roupas contando as peças, muito orgulhoso
porque o número de parafusos aumentou 25%. Mas ninguém mostra se esta
máquina  é melhor que qualquer lavadora que exista. Isso é a diferença
entre resultado e impacto”, explica.

Para o presidente do CNPq, a
ciência deve gerar impacto intelectual, social e econômico. Por impacto
intelectual, ele descreve as ideias que produzem novas ideias, que fazem a
humanidade mais sábia e que permitem formar gerações de novas ideias. Já o
impacto social está relacionado ao conhecimento produzido capaz de influenciar
políticas públicas, que possa diminuir a desigualdade, ou mesmo que possa
reduzir, por exemplo, o tempo de espera na fila do SUS; ou, ainda, que aumente
o envolvimento social com a ciência. Por fim, o impacto econômico corresponde
às ideias que criam empresas e geram empregos, que aumentam a competitividade e
criam setores industriais.

“Não podemos nunca nos esquecer
que ideias incrementais de velas, jamais criam lâmpadas. O impacto da ciência
melhora a saúde, os negócios funcionam melhor, atrai gente, atrai financiamento
para pesquisa, atrai pessoas, forma pessoas, melhora políticas públicas”, diz.

Segundo ele, tudo isso depende de
um ecossistema, que compreende a pesquisa básica, a tradução da pesquisa, o
desenvolvimento de uma planta piloto e a transferência de tecnologias. Para
isso, é preciso apoio social e também do governo, para que a ciência entre na
agenda de prioridades e consiga o financiamento necessário.

“Não podemos só prometer, temos
que mostrar o impacto de tudo que já fizemos”, alerta sobre a importância de se
avaliar estrategicamente os projetos de pesquisa, pensando justamente em como
ele vai gerar impacto na sociedade: “Quando falamos com os ‘ministros dos
dinheiros’ esquecemos que se não fosse pela nossa ciência, não teríamos vacina
contra hepatite no Brasil – ou a vacina custaria 100 vezes mais. Não teríamos
uma vacina contra dengue, que sairá logo – pelo custo de alguns centavos de
dólares”.

Nova avaliação

Chaimovich contou que o CNPq está
estudando um novo ciclo de gestão de avaliação em CT&I, baseado em um
modelo de árvore de estrutura hierárquica (ver apresentação completa no link
abaixo).  “Estamos estudando uma proposta que possa estruturar um
problema, ajustar um modelo, obter dados e informações que tenham a ver com o
modelo, aplicar o modelo, selecionar um projeto que esteja de acordo e avaliar
resultado do projeto e impacto”, resumiu. 

Nessa nova proposta, a opção é
avaliar o projeto de forma holística, com critérios que se flexibilizam de
acordo com as diferentes áreas. “É uma árvore flexível. Ao invés de contar
coisinhas, pretendemos fazer uma avaliação holística do projeto, dos
resultados, do impacto”, afirma.

Ele explica que os diferentes
Comitês de Assessoramento (CA), que julgam e analisam os projetos nas agências
de fomento, teriam, com essa metodologia, mais flexibilidade para atribuir
percentagens diferentes a cada área, a cada componente, e que essa
possibilidade pode ser ainda mais aberta – por isso o modelo de árvore. Por
exemplo, o quesito “experiência na formação de recursos humanos” pode se abrir
para critérios como supervisão de pós-graduação, orientação de doutorado,
mestrado, etc., com percentuais adaptados. Outro exemplo dado é que no critério
“potencial de implementação” é possível analisar o desenvolvimento de pesquisa,
participação, utilização.

“É possível pensar no potencial
de impacto, no alinhamento desse projeto com as estratégias púbicas de
CT&I; no risco. E assim, é possível assinalar uma porcentagem para cada um
desses aspectos. E cada um desses critérios podem ser separados em foco,
potencial de aplicação, ou componentes, e todos os coeficientes podem ser
ajustados, dependendo da área”, diz.

A nova avaliação ainda não tem
prazo para ser implementada. O Conselho está realizando um piloto com um CA de
engenharia química que aceitou fazer uma dupla avaliação de projetos – uma pelo
método clássico, outra pela nova proposta. Chaimovich conta que até o momento
já foram observadas algumas diferenças nos resultados, principalmente nos
projetos considerados medianos – aqueles que não estão entre os melhores e nem
entre os piores. Mas o cientista acredita que essa avaliação levará ao menos um
ano e meio para se tornar norma, dependendo da aceitação dos CAs e da
mobilização favorável da comunidade científica em geral.

O fator impacto

Chaimovich alertou para a crítica
conjuntura nacional e os cortes que a ciência vem sofrendo. Ele falou, por
exemplo, sobre os prejuízos que o Ciência sem Fronteiras acarretaram, deixando
o CNPq praticamente sem verbas para enviar pesquisadores ao exterior.

Falou também sobre a
inconsistência da participação brasileira em publicações internacionais,
concentrada em matemática e ciências da terra, mais ou menos em biológicas, mas
mal  em engenharia e praticamente inexistente em humanidades. “Nós estamos
capengando em termos de competitividade. Temos alguns problemas que precisamos
olhar se queremos crescer. A colaboração internacional é cada vez mais
importante. Estamos caminhando para um caminho complexo, e estou pensando na
nossa realidade e na tendência do mundo”, enfatizou, citando exemplos como o do
Reino Unido, onde 50% das publicações possuem coautoria com outros países.

“Minha mensagem é que o impacto
da ciência brasileira e o número de cientistas têm que crescer. E crescer com
qualidade exige que a governança das universidades de pesquisa seja
absolutamente acadêmica. Ciência tem que estar relacionada com fronteira, já
que ela como um todo tem que atender à demanda nacional. E para atender essa
demanda, não pode voltar ao século XVIII”, concluiu.

Recepção

Os participantes do encontro
aproveitaram para esclarecer dúvidas sobre a proposta.  A mesa foi
presidida pela presidente da SBPC, Helena Nader, que aproveitou o encontro para
destacar a importância da participação de toda a comunidade científica na
política científica e tecnológica brasileira, bem como na trajetória do Marco
Legal da CT&I, que está em vias de ser regulamentado. Nader ressaltou que é
preciso o apoio de toda a comunidade, seja na regulamentação do marco legal,
seja para pressionar o governo pela derrubada dos oito vetos impostos na
ocasião de sua sanção em janeiro, seja junto ao congresso pelo financiamento de
CT&I.

Em relação à implementação da
nova proposta de avaliação, assinalou a importância da discussão entre todos os
atores envolvidos, com especial atenção às sociedades científicas. Em sua
opinião, a nova proposta de avaliação, embora interessante, coloca algumas
questões preocupantes, pois da forma como já são feitas, apesar de não se
aplicarem percentuais, os avaliadores observam todos os requisitos colocados.
“Minha preocupação é de estarmos colocando uma camisa de força no processo de
avaliação, impondo números que poderão nem sempre refletir a qualidade, e
tirando a visão crítica da análise conjunta por pares”, pondera a presidente da
SBPC, alertando para a importância de se refletir sobre os critérios propostos.

Para a conselheira da SBPC,
Regina Pekelmann Markus, o caminho proposto é bom porque ele flexibiliza. “O
caminho anterior foi bastante bom, porque ele criou uma rota possível de nos
trazer até aqui. Mas nós estamos precisando achar um novo caminho, porque nós
esgotamos esse”, comentou sobre a avaliação clássica dos projetos.

Já o vice-presidente da SBPC,
Ildeu de Castro Moreira, acredita que é importante levar essa discussão por
todo o País, para poder aprimorá-la e fazer com que ela seja implementada. “Eu
acho que essa proposta vai na direção exatamente de uma ideia que gera ideias e
gera inovação no sistema. E eu acho que o papel nosso aqui é fazer com que essa
proposta seja discutida com toda a comunidade científica brasileira”,
sugeriu.  A sugestão teve apoio da também vice-presidente da SBPC,
Vanderlan Bolzani, que ressaltou a importância do posicionamento dos
professores e pesquisadores nos rumos da ciência nacional. “Precisamos que
nossa comunidade seja mais motivada a se envolver com as questões da ciência no
País”, disse.

O presidente do CNPq, Hernan
Chaimovich,  disponibilizou a sua apresentação, realizada nesta
segunda-feira, na SBPC, que pode ser acessada aqui.

 

Daniela Klebis – Jornal da
Ciência