Comunidade científica celebra Dia Nacional da Ciência com manifestações contra desmonte da CT&I no País

Evento no último domingo em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife foi organizado pela SBPC em comemoração aos 70 anos de sua fundação e ao Dia Nacional da Ciência e Dia Nacional do Pesquisador

spDomingo, 8 de julho, foi dia de manifestações em defesa da seleção que realmente pode fazer o Brasil um campeão. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), junto com a comunidade científica nacional, celebrou em quatro capitais do Brasil o aniversário de 70 anos de sua fundação, o Dia Nacional da Ciência (Lei nº 10.221, de 18 de abril de 2001) e o Dia Nacional do Pesquisador (Lei nº 11.807, de 13 de novembro de 2008). Cientistas, professores, estudantes e amigos da ciência participaram das comemorações e juntaram às manifestações em defesa da CT&I e da educação do País, em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife. Ao todo, os quatro eventos atingiram um público de cerca de cinco mil pessoas.

Em São Paulo as atividades foram realizadas em parceria com o Instituto Moreira Salles (IMS), na Avenida Paulista. O evento começou com a apresentação musical “Ciência e Música”, do Maurício Pereira, uma atividade interativa na qual o público adivinhava os nomes entre uma seleção de grandes cientistas brasileiros e uma intervenção teatral comemorativa ao septuagésimo aniversário da entidade do Núcleo Arte Ciência no Palco, que intercalava frases de cientistas à música “O que será” de Chico Buarque.

As atividades foram seguidas de uma “Marcha Pela Ciência”, que teve a participação de bonecos de Olinda, representando quatro craques da ciência: o físico Albert Einstein, o geógrafo Aziz Nacib Ab’Saber, ex-presidente da SBPC, a psiquiatra Nise da Silveira e o físico José Leite Lopes.

Cerca de 600 pessoas, entre cientistas, professores e pesquisadores, caminharam em defesa da ciência e da educação na avenida Paulista. O objetivo da manifestação foi alertar a população sobre a gravidade dos cortes orçamentários que vêm impossibilitando o desenvolvimento de pesquisas vitais para o desenvolvimento do País e poderão comprometer a formação dos futuros cientistas. Empunhando a faixa com o mote das celebrações dos 70 anos da SBPC – “Ciência Educação Ontem Hoje e Amanhã!” – o grupo caminhou por cerca de uma hora na avenida, levando pôsteres, e bradando palavras de ordem como: “Se você pensa que ciência é gasto? Ciência não é gasto não! Ciência é investimento para o resto da nação”, “Um, dois, três, quatro cinco mil, queremos mais ciência pro progresso do Brasil” foram alguns deles. A SBPC também distribuiu folders informativos, adesivos e marca páginas, para a população.

“A situação é dramática. São drásticos os cortes graves que a Ciência e Tecnologia têm sofrido. Estamos vivendo uma situação muito difícil”, afirma Ildeu de Castro Moreira, presidente da SBPC. Os recursos para investimento do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) caíram para cerca de um terço do que eram oito anos atrás. Para Moreira,  a manifestação representa tanto uma atitude de “resistência ao desmonte” quanto um esforço para avançar no diálogo com o Congresso e o governo federal — lembrando que o orçamento de 2019 está sendo definido agora.

Moreira lembrou que nesses 70 anos a SBPC vem lutando firmemente pela valorização da ciência. “A SBPC surgiu para lutar pela sobrevivência da ciência e pela valorização da educação. Um dos objetivos é que o conhecimento científico seja compartilhado com a sociedade e que tenha impacto no sistema produtivo. Mas para isso, precisamos ter recursos adequados, como já acontece em países desenvolvidos”, disse.

“Continuamos querendo que a ciência, tecnologia, inovação e educação sejam elementos fundamentais para o desenvolvimento do País. Temos um potencial grande, mas este potencial não se realiza na falta de políticas públicas mais adequadas dentro do contexto do País”, afirma. E completa, “a nossa luta é também para que a educação seja de qualidade e que a educação científica seja reforçada nas escolas”.

Alerta à população

O presidente da SBPC destacou que, além da importância desse tipo de manifestação de conscientizar toda a sociedade para o papel que a ciência tem no cotidiano das pessoas e no desenvolvimento do País, foi um dia de celebração.  “Além de chamarmos a atenção para o desmonte da área, foi um dia de celebração porque comemoramos, além dos 70 anos da SBPC, o Dia Nacional da Ciência e o Dia Nacional do Pesquisador”, disse lembrando que a ideia é que as datas passam a ser celebradas todos os anos, a partir de agora.

Uma das organizadoras do evento, Roseli de Deus Lopes,  professora da Poli-USP e diretora da SBPC, também falou da importância de uma manifestação desse tipo para conscientizar a população sobre o desmonte do setor de CT&I. “Sabemos que investir em ciência, tecnologia, inovação e educação de qualidade é um retorno garantido. Mas o que temos visto são cortes dramáticos. O efeito disso é muito grave, pois estamos vendo estruturas sendo desmontadas. Nesses 70 anos de SBPC, a gente vem batalhando para a criação de um Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia e não podemos tirar o oxigênio dessas estruturas agora. Temos, por exemplo, laboratórios super avançados que necessitam de um pequeno investimento para mantê-los funcionando, mas isso não está sendo priorizado. É importante movimentos como esse para levarmos mais subsídios para a população. Se a gente investir em ciência e educação, todo mundo ganha”, afirma.

A vice-presidente da SBPC, Vanderlan Bolzani, que também esteve na marcha paulista, afirma que esse evento é realizado em um momento extremamente importante de conscientização de toda a comunidade científica do Brasil e da sociedade brasileira como um todo sobre a importância da ciência para o desenvolvimento da humanidade. Ela também comemorou a atividade ao ressaltar o papel da SBPC nessas sete décadas.  “Há 70 anos a SBPC tem tido um papel fundamental para as instituições, para os cientistas, em todas as épocas, principalmente em períodos difíceis, como na ditadura. Isso é uma coisa fascinante, e hoje, com 70 anos, ela continua lutando para que a nossa ciência e educação tenha o mínimo exigido pelos países em desenvolvimento”, afirma. Bolzani lembra a resistência da SBPC contra os cortes no orçamento da CT&I de um país rico que tem tudo para estar entre os grandes. “Sem ciência, tecnologia e educação, não temos futuro dentro das sociedades do conhecimento”, ressalta.

A manifestação de São Paulo contou com a participação de cientistas como Helena Nader, presidente de honra da SBPC, Umberto e Lisbeth Cordani, professores da USP, Etelvino Bechara, do IQ-USP, Fernando Dias Menezes, da Fapesp, Regina Markus, professora do IB-USP e conselheira da SBPC, Marcos Buckeridge, presidente da Aciesp, entre outros, além de representantes da ANPG, APQC e sociedades associadas, como a Sociedade Brasileira de Imunologia.

Engajamento

A passeata em São Paulo contou também com a participação de pessoas fora do ciclo cientifico. “Sei do desmonte que o Brasil vem sofrendo em todas as áreas, mas a educação é fundamental para o desenvolvimento de um povo. De uma sociedade. Por isso, resolvi participar da marcha”, disse a bancária aposentada, Regina Mariana, que saía da missa na igreja na avenida quando se deparou com o grupo na frente do IMS.

As professoras da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Jacy Perissinoto e Ana Carina Tamanaka, também resolveram participar das atividades depois de receberem um comunicado da reitoria. “Acho importante chamarmos a atenção para a importância da ciência em si e pelo desmonte que a área tem sofrido. Infelizmente a ciência não está tento a atenção necessária. E esse momento é oportuno por já que estamos em ano eleitoral e em momento de decisões importantes”, disse Perissinoto.

A atividade também chamou a atenção para jovens estudantes. “Fazemos um curso técnico em química e resolvemos participar porque sabemos que o Brasil está sofrendo com cortes, principalmente na área de educação”, disse Enzo Monteiro, de 16 anos, que ficou sabendo das atividades pelas redes sociais.

O público que aproveitava a tarde na Paulista parava para acompanhar os cientistas e participar das atividades. Muitas crianças tiraram fotos com os bonecos de Olinda. A SBPC também fez uma campanha de estímulo aos potenciais cientistas do futuro.

Algumas instituições também colaboraram para tornar o domingo na Paulista em um dia dedicado à ciência. Um exemplo foi a Sabina – Escola Parque do Conhecimento – de Santo André, que trouxe alguns experimentos científicos para o evento, instalados em frente ao IMS. O grupo Via Saber, com apoio do Instituto de Física da USP, também aproveitou as celebrações para realizar mais uma edição do “Ciência na Paulista”, no qual cientistas responderam perguntas das pessoas.

Recife

recifeAs atividades pernambucanas foram realizadas no Espaço Ciência, entre as cidades de Recife e Olinda.  A SBPC Regional de Pernambuco, em parceria com a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação de Pernambuco (SECTI), com os apoios do Conservatório Pernambucano de Música e da Secretaria de Educação da Prefeitura do Recife, comemorou as datas do dia 8 de julho com o evento, “CIÊNCIA COM MÚSICA”. No auditório do Espaço Ciência, foi feita uma apresentação do Dueto de Acordeons com Júlio Cesar Mendes e Karoline Maciel do Conservatório Pernambucano de Música e, logo em seguida, os público participou de debates sobre os cortes orçamentários em CT&I e educação e futuro da Ciência no Brasil. O público também pode visitar as mostras e exposições do Museu de Ciência (Espaço Ciência).

Leia mais sobre os eventos no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte.

Vivian Costa – Jornal da Ciência