Inteligência artificial: ‘Parece que o futuro tão distante chegou’

Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), o professor Renato Janine Ribeiro reflete sobre as possibilidades, as interrogações e o futuro da inteligência artificial

As tecnologias de inteligência artificial (IA) ganharam os holofotes neste ano. Apesar de décadas de idealizações e pesquisas, as manchetes se voltaram para o aprendizado de máquina com maior fervor recentemente. “Parece que o futuro tão distante das ficções científicas chegou”, anuncia o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), professor Renato Janine Ribeiro. Contudo, as ferramentas de IA ainda são controversas e cheias de incertezas.

Falta de transparência, possíveis usos maliciosos, decreto de extinção de incontáveis postos de trabalho. Essas são algumas questões que tangenciam a IA. E cientistas, juristas, políticos, entre outros, estão debruçados sobre o tema. Países, como a Itália, já aplicaram sanções a empresas que tocam experimentos do tipo. Outros, como Estados Unidos e China trabalham em mecanismos de controle. Um dos grandes pivôs do frenesi em torno da IA chama ChatGPT.

A ferramenta da empresa OpenAI rompeu limites estabelecidos há anos para a IA. Na prática, o chatbot passou a simular com habilidade impressionante a linguagem humana. O programa é “capaz de escrever sobre basicamente tudo, com eloquência e riqueza de detalhes, impressionou até mesmo os grandes nomes da tecnologia mundial, como Bill Gates”, como lembra Ribeiro, em artigo especial para o Jornal da Ciência. “Discussões sobre sua influência (boa ou má) na educação, na academia, no mercado de trabalho e em outras frentes tomaram conta dos meios de comunicação”, completa.

Inteligência artificial; Problemas reais

Para o professor, as tecnologias recentes de IA, apesar de surpreendentes, “não parecem tão inteligentes assim”. Apesar da rápida evolução, é fato que os problemas são muitos. Como resumiria o célebre linguista norte-americano Noam Chomsky, estes chatbots, até então, não passam de “plagiadores de alta tecnologia”.

Ribeiro é signatário da posição de Chomsky. E vai além. “Treinadas por humanos, essas tecnologias que empregam a IA estão carregadas de vieses preconceituosos, racistas, classicistas. Também não são capazes de ir muito além na criação artística. Um texto produzido pelo ChatGPT ainda está muito longe da maturidade e excelência de um escritor humano, pois mostra muito mais embromação do que criação. Porém, este é apenas o começo de uma caminhada que não temos ideia de quão longe pode ir – e nem em que velocidade”.

Educação e trabalho

São justamente as interrogações, aliadas com a consciência de que a evolução pode ser veloz, que leva à necessidade de regulamentação da IA. “Países da União Europeia já estão debatendo a adoção de regulamentações para garantir a privacidade e proteção dos dados pessoais dos usuários. Na Itália, o ChatGPT foi suspenso. No Brasil, o debate também começa a tomar corpo e chamar a atenção para necessidade de uma legislação que permita que o país faça parte dessa nova corrida tecnológica, mas também que estabeleça os limites éticos para seu desenvolvimento e implementação”, explica o professor.

Contudo, existem impactos já sensíveis na vida das pessoas. Um dos problemas está no uso dessas ferramentas em escolas. “O ChatGPT e seus análogos colocam questões sérias para a educação. Primeira, como saber se o trabalho de um aluno foi redigido por ele mesmo ou pelo GPT? Mas esta questão é ainda pequena perto da segunda: se um instrumento pode escrever rapidamente e bem sobre praticamente qualquer assunto, para que formaremos nossos estudantes? Aparentemente, o GPT já dá conta do que seria um trabalho de graduação, mas não necessariamente de um TCC. Porém, pode ser questão de tempo ele redigir um mestrado.”

Por fim, Ribeiro lembra que “o tempo urge e é importante colocar a discussão desde já”.

Rede Brasil Atual