Internacionalização e Inovação: temos que avançar

Em janeiro de 2015, quando assumimos a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal), fomos designados pelo governador Renan Filho a realizar algumas mudanças de condução na instituição, torna-la ainda mais conhecida do público comum, estabelecer ações de transparência nas políticas, ampliar as relações com a comunidade acadêmica e científica do estado, estreitar mais as parcerias dessa comunidade com o governo, através de contribuições ao aprimoramento das políticas públicas, e buscar apoio no governo federal para as políticas específicas.

Foram quatro anos de aprendizados, construção de uma nova cultura de incentivos à Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I) e vários avanços. Nesse período alcançamos resultados importantes e cerca de R$ 55 milhões de investimentos permitiram: 50 editais públicos lançados e executados na plenitude, 17 em cooperação internacional (França, Grã-Bretanha, Itália, Comunidade Europeia); apoio e fomento à 152 eventos científicos, acadêmicos e tecnológicos, entre eles a 70ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC); incentivo e financiamento para 140 cientistas participarem de encontros e congressos, com 61 destinos internacionais; 750 projetos de pesquisas contratados e pagos integralmente; mais de 3 mil bolsas concedidas nas modalidades extensão tecnológica, iniciação cientifica, mestrado, doutorado, pesquisa e fixação de cientistas; e, apoio à produção e lançamento de 80 livros acadêmicos.

Entre 2015 e 2017, segundo dados da Web of Science, a produção acadêmica das instituições de ensino superior de Alagoas em revistas científicas e qualificadas cresceu 75%, contra 35% no período 2010-2014. Em apenas 3 anos foram 1.551 artigos produzidos e publicados (média de 513,7), enquanto nos cinco anos anteriores foram 1.436 (média de 287,2). Essa evolução é uma das principais demonstrações de que a comunidade acadêmica e científica respondeu, positivamente, às políticas de incentivos e fomento à C,T&I do governo estadual. No quesito produção acadêmica, podemos afirmar, com expectativas favoráveis, que avançaremos mais porque muitas pesquisas estão em fase de desenvolvimento e seus resultados serão apresentados em congressos e publicados nas revistas especializadas.

Importa ressaltar que esses avanços foram conquistados em um momento de “maré vazante” para as áreas de ciência, tecnologia e inovação no país. Especialmente a partir de 2015, as principais agências federais de fomento foram gradativamente perdendo espaço no orçamento público federal e instituições como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superio (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) trabalharam no limite para garantir o trivial de seus compromissos. Naquele ano, por exemplo, o custeio de todo o sistema de pós-graduação brasileiro foi cortado em 75%, depois nunca foi constituído aos níveis anteriores.

O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), principal fonte de financiamento à infraestrutura de C,T&I e subvenção de programas estratégicos, especialmente para inovação, está contingenciado desde 2015.

Portanto, as políticas de austeridade adotadas no âmbito federal derrubaram os investimentos do país em C,T&I, promovendo a diminuição deles no PIB para cerca de 1% apenas. Ao que parece, as expectativas não são favoráveis ainda hoje.

Então, o esforço realizado pelo Governo de Alagoas, através da Fapeal, não deve ser minimizado e ele só foi possível, principalmente, porque a política de austeridade praticada “pelas bandas de cá” não foi às custas de cortes draconianos que sacrificam políticas sociais e investimentos públicos.

O estado de Alagoas alcançou as primeiras posições no ranking nacional em solidez fiscal graças, em termos gerais, a inovação na gestão das finanças públicas (tesouro e receita estadual) renegociações com o governo federal, especialmente na revisão dos termos e compromissos com a dívida pública, com apoio imprescindível do Congresso Nacional, através do Senador Renan Calheiros, ajustes e adoção de novas tecnologias na área tributária, revisão de contratos, cortes de desperdícios e a primazia de quadros técnicos em postos chaves da administração pública, que exigem maior controle e planejamento na execução financeira e orçamentária etc.

Portanto, as opções há quatro anos para a política de C,T&I em Alagoas, executada pela Fapeal, estavam dadas, também, pelas próprias circunstâncias. Mesmo sendo impossível substituir o governo federal em sua missão de apoiar, financiar e executar programas nacionais e grandes projetos de desenvolvimento científico e tecnológico, especificamente por intermédio do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC) e agências federais, era importante construir uma estratégia para que a ciência e a pesquisa no estado não entrassem em relativo colapso. Dessa forma, investir, especialmente em nosso sistema estadual de pós-graduação, foi imprescindível.

No que diz respeito a esse sistema, contamos com 67 cursos de pós-graduação em Alagoas. São 47 mestrados (14 profissionais e 33 acadêmicos) e 20 doutorados (6 em parcerias com instituições de ensino externas). O acordo de cooperação técnica e acadêmica celebrado entre Fapeal e Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), em 28 de abril de 2017, no valor global de 38 milhões de reais, foi um passo muito importante para garantir o fornecimento, até 2022, de bolsas de mestrado e doutorado para o sistema estadual de pós-graduação acadêmico. O acordo anterior que vigorou até 2016 foi de R$ 22 milhões, 72% inferior.

Entretanto, dois aspectos são essenciais para continuidade dos avanços nas áreas de C,T&I em Alagoas. O primeiro deles, é superar as etapas de ampliação do sistema de pós-graduação em nossas instituições de ensino superior, que cresce ano a ano, direcionando nossas energias e recursos para consolidar os programas, incentivando estratégias e ações que permitam condições mais favoráveis para que as notas no ranking nacional se elevem e esses programas possam alcançar níveis de excelência internacional, com  parcerias cientificas, produção e cooperação acadêmica com outros países e suas instituições de ensino e pesquisa.

Mais do que a quantidade de trabalhos produzidos, importa que os mesmos sejam desenvolvidos e publicados em colaboração com pesquisadores de outros países. Estudos recentes comprovam a correlação muito forte entre a colaboração internacional e o aumento do fator de impacto da produção cientifica desenvolvida entre as áreas de conhecimento e instituições envolvidas, contribuindo, assim, para melhor inserção nos rankings, nacional e internacional, das universidades (Pedrosa & Pereira, 2018; Santos, 2018).

Portanto, a elaboração de uma estratégia de qualificação dos programas de pós-graduação alagoano e maior interação internacional, se colocam como condições muito importantes. Na última avaliação da Capes, em 2017, na região Nordeste apenas os estados do Piauí e de Alagoas não evoluíram para programas com notas 6 e 7, considerados de excelência em nível internacional. Faz-se necessário, portanto, discutir esse assunto com as instituições de ensino superior que contam com pós-graduação stricto sensu e definir, rapidamente, uma plataforma de ações, com metas e resultados esperados.

Numa estratégia dessa natureza é importante levar em consideração, por exemplo: quantidade de artigos publicados em revistas no 1%, 10% e 50% em cada área específica ou consideradas pelo Academic Ranking of World Universities (ARWU); artigos incluídos nos bancos de dados Web of Science e Scopus; porcentagem de artigos publicados com um autor de uma instituição estrangeira ou em coautoria com um parceiro não-acadêmico; número de patentes outorgadas; número de convênio ou cooperação assinados com o setor produtivo; backlinks ao site dos cursos dos programas de pós-graduação e das instituições; número de docentes em tempo integral (Marcovitch, 2018).

O segundo aspecto importante se refere aos incentivos às iniciativas de empreendedorismo e de inovação tecnológica em Alagoas. Muito já se fez para que o estado caminhasse a passos mais largos no sentido das experiências já conhecidas de construção de ecossistemas de inovação, a exemplo do Porto Digital, em Recife, e o Parque Tecnológico da Paraíba, em Campina Grande, hoje referência nacional (Pierro, 2019). O ex-secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação, professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Eduardo Setton (2010-2014), conseguiu, com muito êxito, liderar um movimento na direção do empreendedorismo inovador e na construção de um Plano Estadual de C,T&I, apropriado para a época e ao contexto das condições financeiras, tanto local quanto nacional.

Nesses quatro anos batemos os 4 cantos do país, inclusive na França, conhecendo modelos de parque tecnológicos, modelos de gestão e governança. No Brasil, o ecossistema de Santa Catarina tem inspirado vários outros projetos, inclusive o nosso. Liderado pela Fundação Certi, vinculada a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o estado sulista tem surpreendido o país em empreendedorismo tecnológico e, com isso, atraído grandes e importantes empresas, nacionais e estrangeiras.

A Fundação Certi tem tratado com a Secretaria de Estado de C,T&I  sobre o modelo mais apropriado para o Polo Tecnológico e Tecnologia da Informação, Comunicação e Economia Criativa do Jaraguá. Nesse sentido, o Polo pode se tornar um equipamento extraordinário de aglutinação dos potenciais de inovação de Alagoas, especialmente se conseguir construir as pontes entre os setores produtivos, empresários e jovens empreendedores, e o sistema de pós-graduação, portanto, universidades, centros universitários, instituto federal de Alagoas e faculdades.

Em 2017 a Fapeal estabeleceu com o CNPq uma importante parceria, na forma de piloto no país, para lançamento de edital no valor de 1,8 milhão de reais com objetivo de fortalecimento do sistema regional de inovação em Alagoas, através da concessão de bolsas de doutorado, mestrado e iniciação científica envolvidos em projetos de cooperação entre instituições de pesquisa e empresas instaladas no estado. O que chamamos de Programa de Pesquisa Pós-Graduação-Empresas (PPG-Empresa) é uma iniciativa para conectar as universidades aos setores produtivos no estado.

Esse Programa também objetiva criar novas fontes alternativas de financiamento à ciência em Alagoas, comprometendo os segmentos privados com projetos de inovação e desenvolvimento tecnológicos que permitam aumentar suas competências empresariais, algo muito comum em instituições como a Universidade de São Paulo (USP), Universidade de Campinas (Unicamp), Massachusetts Institute of Technology (MIT), Universidade de Berkeley, Universidade de Davis etc. (Brito Cruz, 2018).

Para incrementar esse aspecto do desenvolvimento tecnológico, empreendedorismo e inovação em Alagoas, também em 2017 o governador Renan Filho, através da Fapeal, assumiu importantes compromissos com a Financiadora de Projetos e Pesquisas (FINEP), o de apoiar duas grandes ações: o Programa de Apoio à Inovação Tecnológica – Programa Tecnova II e, pela primeira vez, o Programa Nacional de Apoio à Geração de Empreendimentos Inovadores – Programa Centelha.

Enquanto o Programa Tecnova II apoiará, através de subvenção econômica, empresas de médio porte já constituídas em projetos de inovação tecnológica de produtos e processos, o Programa Centelha promoverá cerca de 40 novas empresas de base tecnológica que possam atuar em vários segmentos, como saúde, tecnologia da informação, energia e meio ambiente, biotecnologia, design, moda, audiovisual, gestão, tecnologias sociais, materiais, mecatrônica etc.

Os três programas (PPG-Empresa, Tecnova II e Centelha), portanto, somam um funding de R$ 4,6 milhões em investimentos, constituído pela Fapeal, Finep e Sebrae, a ser aplicado em 2019. Eles certamente movimentarão os núcleos de inovação tecnológica – NIT instalados nas instituições de ensino superior, cursos de pós-graduação, micro, pequenos e médios empresários, ajudando a constituir uma cultura mais ampla de empreendedorismo tecnológico, fortalecimento dos arranjos produtivos locais, especialmente em tecnologias, das incubadoras de empresas, criação de aceleradoras e, finalmente, dando caráter dinâmico ao Polo Tecnológico de Tecnologia da Informação, Comunicação e Economia Criativa do Jaraguá mais à frente.

Essas ações poderão, novamente, rearticular interesses, projetos e sonhos que convergem para a necessidade de uma Alagoas mais diversificada economicamente, com geração de oportunidades, empregos e renda em níveis mais elevados. Elas não serão possíveis sem a parceria efetiva de instituições como as Secretarias de Estado da Fazenda (SEFAZ), do Desenvolvimento Econômico e Turismo (SEDETUR), a de Ciência, Tecnologia e Inovação (SECTI), a Federação das Indústrias de Alagoas (FIEA), o Instituto Evaldo Lodi, a Federação de Comércio de Alagoas (FECOMÉRCIO), o Sebrae, a Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (ASSESPRO/AL), e a colaboração das Universidades, dos Centros Universitários, das Faculdades, da Associação Comercial de Alagoas e do Conselho de Jovens Empreendedores de Alagoas.

Não podemos desestimular o potencial criativo em Alagoas. Ele deve ser valorizado, pois muitos dos problemas podem contar com a genialidade e inventividade de nosso povo. Devemos superar a barreira do vira-latismo, nos termos de Giannetti (2018), dando as chances e possibilidades de ousarmos. Temos muito potencial para isso, se não em grandes e significativos avanços científicos e tecnológicos, que nosso sistema acadêmico e científico e segmentos econômicos de base tecnológica, possam, especialmente, adequar, adaptar à nossa realidade e aos nossos desafios, aquilo que os outros inventam, descobrem, fazem avançar, em várias áreas, disciplinas e atividades produtoras de riqueza.

Bibliografia de apoio:

BAIMA, Cesar. CNPq e Finep alertam para possível corte de bolsas e investimentos em 2019. Jornal O Globo, Rio de Janeiro, 09/08/2018.

BRITO CRUZ, Carlos Henrique de. Indicadores sobre Interação Universidade-Empresa em Pesquisa em São Paulo. In: MARCOVITCH, Jacques (Org.). Repensar a Universidade. São Paulo: Com-Arte; Fapesp, 2018.

GOLDEMBERG, José. Ciência, Desenvolvimento e Universidade. In: MARCOVITCH, Jacques (Org.). Repensar a Universidade. São Paulo: Com-Arte; Fapesp, 2018.

GIANNETTI, Eduardo. O Elogio do Vira-Lata. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.

MARCOVITCH, Jacques (Org.). Repensar a Universidade. São Paulo: Com-Arte; Fapesp, 2018.

MARQUES, Fabrício. Ciclo Interrompido. Revista Pesquisa Fapesp, São Paulo: Fapesp, Ano 20, nº 275, janeiro de 2019, pp. 36-41.

PEDROSA, Renato H. L.; PEREIRA, Micael Waldhelman. Avaliação da Pós-Graduação, Publicações Científicas e Rankings Internacionais. In: MARCOVITCH, Jacques (Org.). Repensar a Universidade. São Paulo: Com-Arte; Fapesp, 2018.

PIERRO, Bruno de. O Desafio de Transferir Conhecimento. Revista Pesquisa Fapesp, São Paulo: Fapesp, Ano 20, nº 275, janeiro de 2019, pp. 50-53.

SANTOS, Solange Maria dos. Rankings Internacionais de Universidades: comparação e desempenho por áreas. In: MARCOVITCH, Jacques (Org.). Repensar a Universidade. São Paulo: Com-Arte; Fapesp, 2018.

Cada Minuto