O que é preciso para ser um cientista?

As histórias de cientistas renomados e experiências que estão fazendo despontar novos talentos no Brasil foram destaque da programação desta quinta-feira, 26, na Reunião Regional da SBPC no DF

O que é preciso para ser um cientista? Com essa pergunta na cabeça, centenas de jovens estudantes participaram de um dia de palestras, nesta quinta-feira, 26, em Planaltina, que contaram histórias de cientistas renomados e experiências que estão fazendo despontar novos talentos no Brasil. As atividades são parte da programação da Reunião Regional da SBPC no Distrito Federal,evento integrado à XVII Semana Universitária da UnB (SemUni), cujo tema tem tudo a ver com os debates de ontem: Ciência, Ousadia e Integração Social: Conhecimento, Democracia e Resistência.

“Precisamos valorizar os cientistas brasileiros e a melhor forma de fazer isso é nos colocarmos no lugar deles”, afirmou a professora do Departamento de Engenharia de Sistemas Eletrônicos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), Roseli de Deus Lopes.

Ela falou sobre o papel das feiras de ciências investigativas na educação básica e afirmou que o que afasta os estudantes hoje da ciência é a falta de informação e uma cultura de inculcar medos e inseguranças. “Precisamos ser mais confiantes. É preciso despertar talentos e não nos condicionarmos para o fracasso”, disse aos estudantes.

Lopes, que é também diretora da SBPC, coordena a Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace), que tem como objetivo colocar o aluno como descobridor, inventor, e o professor assume o papel de orientador e provocador. “As feiras de ciências podem ser um jeito de levar a alunos e professores uma estratégia eficiente de aprendizagem”, diz.

Realizada anualmente desde 2003, a Febrace já atraiu alunos de mais de mil municípios do País e hoje existem cerca de 130 feiras afiliadas pelo Brasil. “A gente atrai os estudantes para a ciência e tecnologia e engaja, ao mesmo tempo, professores para experimentarem novas práticas pedagógicas nas escolas”.

A estratégia da Febrace é despertar a curiosidade e a compreensão do que é fazer ciência. Mostrando os exemplos dos estudantes que participaram da Febrace e chegaram até competições internacionais e hoje muitos são pesquisadores, Lopes destacou que não é a genialidade que faz ser um cientista, mas, sim, curiosidade, vontade de resolver um problema e método. Habilidades, que, segundo ressaltou, qualquer um pode desenvolver. “Eles foram alunos normais, como vocês. E descobriram uma paixão por resolver problemas”, contou à plateia. “As coisas não acontecem por acaso. A gente tem que fazê-las acontecer. Os talentos estão em todos os lugares”, concluiu.

Uma boa pergunta

O presidente da SBPC, Ildeu de Castro Moreira também acredita que uma maneira de valorizar a ciência brasileira e os cientistas, é conhecer como é feita a ciência e as histórias dos pesquisadores. Em sua palestra, ele levou mais de 100 estudantes entre 13 e 15 anos para uma viagem pelas trajetórias dos cientistas no Brasil. “Tem uma história da ciência no Brasil que merece ser contada”, ressaltou.

Conforme apontou, 93% dos brasileiros não sabem citar um cientista do Brasil. Este dado foi levantado na pesquisa do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE),  “A ciência e a tecnologia no olhar dos brasileiros. Percepção pública da C&T no Brasil – 2015”. E a lista de grandes cientistas do País é imensa.

Moreira apresentou aos estudantes um cartoon com o time de estrelas da ciência brasileira: Johanna Döbereiner, engenheira agrônoma naturalizada no Brasil, que descobriu uma técnica de fixação do nitrogênio para soja que hoje representa uma economia de R$15 bilhões para o País em adubos.  O geógrafo Milton Santos, negro e de família muito pobre, que desenvolveu estudos importantes sobre urbanismo em países subdesenvolvidos. César Lattes, físico que descobriu a existência de uma outra partícula no átomo, o méson, que o mantém inteiro, e, por isso, foi indicado ao prêmio Nobel. Santos Dumont, o pai da aviação. Artur Ávila, matemático, que, conforme contou, era um aluno regular, como todos ali na plateia. Ele participou das Olimpíadas de Matemática duas vezes, na primeira ganhou bronze, estudou mais e, na segunda, foi ouro. Em 2014 ganhou a Medalha Fields, considerada o Nobel da Matemática.

E os exemplos são muitos. Até Charles Darwin e Alfred Willace, viveram no Brasil, o primeiro por quatro meses, o segundo por quatro anos, e realizaram importantes estudos sobre a teoria da evolução aqui. Sem contar que foi aqui neste país que a teoria da relatividade geral de Einstein foi comprovada, em 1919, quando cientistas de vários países vieram ver o eclipse total do Sol, na cidade cearense de Sobral, comprovando que a massa dos corpos deforma o espaço pela curvatura da luz das estrelas observadas.

Ao mostrar um quadro com fotos desses cientistas ainda crianças, Moreira lembrou a importância de valorizar o estudo de ciências nas escolas, pois é ali que estão os próximos grandes cientistas. “Quando você olha para uma criança como essa, você não sabe o que ela vai ser”, disse aos estudantes.

Uma coisa que esses cientistas têm em comum, destacou Moreira, é que todos partiram de uma boa pergunta e seguiram perseguindo uma resposta. Nem sempre em ciência será possível responder às questões que são levantadas, mas a trajetória é que é importante, ressaltou. “O fundamental da ciência é continuar fazendo perguntas”.

Verônica da Silva Santos, aluna do 7º ano, saiu da palestra empolgada. “Além de saber sobre os experimentos, eu fiquei sabendo mais sobre os cientistas. Eu acho que não deve ser fácil ser cientista, é um trabalho muito duro, mas eu posso conseguir. Quero descobrir muitas coisas!”, disse.

Para Eloisa Assunção de Melo Lopes, doutoranda em educação e ciências na UnB, que também participou das atividades, desmistificar os cientistas é importante para que outros jovens se motivem a seguir essa carreira. “É importante mostrar que eles eram sujeitos comuns, que tiveram uma trajetória para se tornarem cientistas e hoje suas teorias são amplamente utilizadas. É importante mostrar que qualquer um pode se tornar também um grande cientista. É um incentivo para que novos cientistas surjam”, comentou.

Daniela Klebis – Jornal da Ciência