“Precisamos de um desenvolvimento sustentável e mais justo”, afirma Paulo Artaxo

O cientista apresentou a conferência “As mudanças climáticas e o planeta” nessa terça-feira, 14, durante a Mini Reunião Anual Virtual da SBPC

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A crise sanitária provocada pela covid-19, junto à perda de biodiversidade e à crise climática são problemas enormes para a civilização e evidenciam a necessidade de tomada de decisão baseada em ciência.  A afirmação é do cientista Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), em sua conferência “As mudanças climáticas e o planeta”, nessa terça-feira, 14 de julho, durante a Mini Reunião Anual Virtual da SBPC. A atividade foi apresentada pelo presidente de honra da SBPC, Ennio Candotti, e pelo presidente da entidade, Ildeu de Castro Moreira.

Artaxo é considerado um dos maiores especialistas em mudanças climáticas e aquecimento global do mundo e, segundo ele, para resolver as três crises citadas acima, o mundo precisa criar um modelo de governança global, com uma estratégia baseada em ciência, para garantir a sustentabilidade do ser humano dentro desse novo planeta da era do Antropoceno, época geológica na qual o ser humano tem uma ação devastadora. “Precisamos de um desenvolvimento sustentável e mais justo”, ressaltou.

O cientista e professor da USP afirma que, para a questão climática, é preciso reduzir as emissões de gás de efeito estufa em, pelo menos, 7% ao ano, até 2050, para conseguirmos limitar o aquecimento da Terra a 2ºC, que já é o dobro do que foi observado até agora desde a revolução industrial.

Na questão da saúde, Artaxo diz que a covid-19 mostrou que é preciso investir para garantir o sistema de saúde universal, em particular, nas regiões mais interioranas, no caso do Brasil, além de mudar o modelo de desenvolvimento econômico praticado, para, assim, reduzir as desigualdades sociais e econômicas. “Isso é uma tarefa enorme que vai requerer recursos financeiros e intelectuais gigantescos.  Mas nós temos de fazer essa tarefa se quisermos deixar um legado para as próximas gerações que gere menos sofrimento”, disse.

“De acordo com os modelos climáticos, a temperatura média do Planeta pode subir em torno de 4ºC a 5ºC ao longo das próximas décadas. Já aumentamos 1ºC, o que é um aumento grande para acontecer em dois séculos, desde a revolução industrial”, afirma. E completa, “E não e só o aquecimento da temperatura que observamos com as mudanças climáticas: a redução de chuvas no Nordeste brasileiro, em algumas regiões, já chega a 30%; eventos climáticos extremos, como por exemplo, ondas de calor e inundações, aumentaram no mundo todo. Muitas áreas correm o risco de se tornarem inabitáveis com temperaturas no verão com 52ºC. Temos de olhar estes fenômenos com muito cuidado”, alertou.

A degradação do solo, os processos de desertificação e a perda acelerada de carbono do solo são outros problemas citados pelo especialista, que afirma que eles podem trazer danos grandes para a estrutura socioeconômica e comprometer a capacidade de produção de alimentos ao longo das próximas décadas. Segundo Artaxo, o modelo atual de exploração excessiva poderá provocar migração em massa, já que a humanidade não vai conseguir produzir alimentos suficientes para uma população de 10 bilhões de pessoas que habitará o mundo em 2050.

No caso brasileiro, explicou, as florestas tropicais podem ter seus limites de sobrevivência ultrapassado quando a fotossíntese deixar de ter a eficiência que tem hoje, ou seja, quando suas plantas começarem a perder carbono para a atmosfera. “Isso é importante, porque a Floresta Amazônica contém hoje cerca de 150 gigatoneladas de carbono, e isso pode trazer implicações, agravando o efeito estufa de uma maneira muito significativa.”

Ao falar da biodiversidade e do meio ambiente, Artaxo foi taxativo ao afirmar que cuidar da Amazônia nunca foi tão urgente. “A crise na saúde pode passar, mas a das mudanças climáticas vai durar séculos. E a perda da diversidade é para sempre. O que estamos fazendo hoje pode ser crítico por séculos, e as espécies que estamos extinguindo serão perdidas para sempre.” Quanto ao desmatamento na Floresta Amazônica, ele alertou ainda que o processo pode acelerar a liberação de milhares de vírus, e consequentemente, desencadear novas epidemias.

Artaxo chama a atenção para os dados recentes divulgados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) que afirma que o aquecimento global está se acelerando e que a temperatura pode atingir 1,5ºC a mais já nos próximos cinco anos, quando comparado o período pré-industrial. “Não estamos mais falando de 2050. E esse aumento pode agravar a situação de algumas regiões da Amazônia onde a fotossíntese pode deixar de ter a eficiência que tem hoje. A floresta pode passar a ter um processo de decomposição agravando o efeito estufa global”, disse.

Ao falar sobre a potencialidade da Floresta Amazônica, Candotti, que é diretor do Museu da Amazônia (MUSA), lamentou a falta de interesse político para ampliar as pesquisas científicas neste grande laboratório natural. “Esse grande desmatamento está acontecendo porque há uma ignorância sobre as riquezas que a floresta pode oferecer”, afirmou.

Veja a apresentação na íntegra .

A Mini Reunião Anual Virtual da SBPC segue por toda a semana e mais informações podem ser obtidas acessando este link: http://ra.sbpcnet.org.br/mini-ravirtual/

Vivian Costa – Jornal da Ciência