Saúde mental pós-pandemia

Na Editoria Especial desta semana, manifestamos nossas preocupações diante do aumento dos transtornos mentais na população em geral. E deixamos nosso espaço aberto para ampliarmos as discussões de como enfrentar este problema

Problemas de saúde mental têm se tornado cada vez mais comuns em todo o mundo. No Brasil não é diferente, tanto que o País é considerado a nação mais ansiosa do mundo e a quinta mais depressiva, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Especialistas apontam ainda que o problema já vinha despertando preocupação para as autoridades. As consequências da pandemia de covid-19 como o sofrimento de perdas familiares, o sentimento de medo, a falta de socialização e a instabilidade no trabalho contribuíram para aumentar o nível de estresse dos brasileiros.

A OMS estima que, no primeiro ano da pandemia de covid-19, a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou cerca 25%. Em 2020, a entidade já alertava para a necessidade de manutenção dos serviços de assistência à saúde mental e ampliação dos atendimentos.

A pandemia causou transtornos mentais em diversos profissionais, dentre eles, os de saúde e professores. Segundo um estudo da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), 86% dos profissionais de saúde sofrem com Síndrome de Burnout e 81% com estresse.

Já a pesquisa “Saúde Mental dos Educadores 2022” revela que mais de 20% dos educadores brasileiros consideram sua saúde mental ruim ou muito ruim. O estudo ouviu mais de 5.000 profissionais da educação, entre professores e gestores de todos os Estados e do Distrito Federal. Segundo o levantamento, a percepção do agravamento do quadro de saúde mental (21,5%) piorou em relação a 2021, quando 13,7% responderam sobre saúde mental.

Quando se olha para os estudantes, os números também são preocupantes: 45% dos alunos foram diagnosticados com ansiedade generalizada e 17% com depressão durante o primeiro ano da pandemia. Além disso, mais de 60% relataram crises de ansiedade e dificuldade para dormir. Falta de motivação e problemas de concentração foram reportados por quase 80%. O estudo foi desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Ensino em Biociências e Saúde do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), com participação de pesquisadores do IOC e da Universidade Federal Fluminense (UFF). Os resultados foram publicados em artigo na revista científica International Journal of Educational Research Open.

Pobreza, violência e preconceitos de gênero são outros problemas que contribuem para a piora da saúde mental de jovens, revela estudo que ouviu adolescentes no Brasil, na Índia e no Quênia. A pesquisa foi feita pela organização não governamental (ONG) Plan International, que defende os direitos das crianças e a igualdade para as meninas.

Tudo isso é estarrecedor, porque estamos diante de uma sociedade adoecida. A preocupação em torno da saúde mental é tão grande que o Ministério da Saúde divulgou na semana passada que a assistência em saúde mental será ampliada no Sistema Único de Saúde (SUS). Serão R$21,3 milhões destinados ao ano para atendimento das pessoas com sofrimento ou transtorno mental ou com necessidades de atendimento decorrentes do uso de álcool e outras drogas.

Voltando à questão da pandemia: eu mesmo, ainda no começo dela, em março de 2020, alertei para a necessidade de priorizar, na volta às aulas ou ao trabalho presencial, a saúde mental. Na época, discutia-se muito como repor os conteúdos de ensino ou mesmo as competências educativas que nao tivessem sido transmitidas aos alunos. Mas a grande questão, insisti em vão, seria como lidar com o forte trauma do isolamento, do distanciamento, da perda afetiva – e isso exigiria, pelo menos, um espaço muito aberto e sincero de diálogos nas escolas e nas empresas. Como se sabe, o que se fez neste rumo foi muito pouco. Pois é: precisamos mudar radicalmente essa forma de conceber as relações humanas em função da produção de bens e serviços, e orientá-las para a criação do que é propriamente humano.

Diante do aumento dos transtornos mentais na população, manifestamos nossas preocupações na Editoria Especial desta semana. E deixamos nosso espaço aberto para ampliarmos as discussões de como enfrentar este problema. À medida que as economias prosperam, a preocupação com a subsistência material há de ceder cada vez mais lugar para questões como as da felicidade, do bem-estar, e obviamente de seus avessos. Precisamos falar mais destes pontos.

Renato Janine Ribeiro

Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC

 

Veja as notas abaixo do Especial da Semana – Saúde mental

Agência CNJ de Notícias – CNJ e Ministério da Saúde trabalham para implementar Política Antimanicomial

Outras Palavras – 31/03/23 – Os dois desafios da Saúde Mental brasileira

O Globo, 20/03/2023 – ‘Vamos investir em uma política que não isole o paciente’, diz chefe do inédito Departamento de Saúde Mental do governo

Outra Saúde – A árdua tarefa de resgatar a Saúde Mental no Brasil

Nexo, 24/02/2023 – Para onde vai a política de saúde mental no novo governo?

OPAS, 06/05/2022 – OPAS estabelece Comissão de Alto Nível sobre Saúde Mental

O Tempo, 16/01/2023- Saúde mental desestrutura professores nas redes pública e privada

Fiocruz, 17/11/2022 – Pesquisa identifica o impacto da pandemia em estudantes

Jornal da Unesp, 27/04/2023 – Os reflexos do isolamento social forçado pela pandemia na saúde mental das pessoas

Agência Brasil, 25/04/23 – Pobreza e violência pioram saúde mental de jovens

CNN Brasil, janeiro de 2023 – Profissionais de saúde têm índices negativos de saúde e bem-estar mental na pandemia, diz pesquisa

Folha de S. Paulo, 01/03/2023 – Sintomas de depressão cresceram 26% em adolescentes na pandemia, diz estudo

Estado de Minas – Depressão: sintomas cresceram 26% em adolescentes na pandemia, diz estudo

Galileu, 01/05/2023 – Como o algoritmo do TikTok impacta nossa saúde mental, segundo estudo

MCTI, 12/05/2023 – Ministério da Saúde investe mais de R$ 21 milhões para ampliar rede de saúde mental no SUS

Valor – SUS precisa reforçar serviço de saúde mental de jovens, dizem especialistas

OIT, 28/09/2022 – OMS e OIT pedem novas medidas para enfrentar os problemas de saúde mental no trabalho

Ministério da Saúde, 04/11/2022- Na América Latina, Brasil é o país com maior prevalência de depressão

BBC Brasil – Por que o Brasil tem a população mais ansiosa do mundo