SBPC encaminha moção de repúdio à plantação de soja e milho irrigados no Corredor Ecológico Capivara

O documento foi aprovado com duas abstenções pela Assembleia Geral Ordinária de Sócios da SBPC, realizada no dia 27 de julho, na UFPR, durante a 75ª Reunião Anual

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) encaminhou a autoridades a “Moção de Repúdio à plantação de soja e milho irrigados no Corredor Ecológico Capivara e a outros empreendimentos com impactos semelhantes”. O documento foi aprovado com duas abstenções pela Assembleia Geral Ordinária de Sócios da SBPC, realizada no dia 27 de julho, na Universidade Federal do Paraná (UFPR), durante a 75ª Reunião Anual.

A moção, que aponta os impactos da prática, foi endereçada aos ministros do Meio Ambiente, Marina Silva; da  Agricultura, Carlos Fávaro; e aos governadores estaduais.

No documento, a entidade manifesta repúdio à implementação do Empreendimento Cultivo de Soja e Milho Irrigados da empresa APESA AGRO PASTORIL, frente ao seu impacto devastador, irremediável e destoante dos rumos das políticas ambientais consensualizadas em nível mundial. “O projeto vai contra as políticas de reversão das mudanças climáticas, que têm também como causa ações antrópicas como as que serão executadas neste empreendimento. Esse caso serve também para alertar sobre outros empreendimentos que podem causar impactos semelhantes e que não devem ser incentivados pelos governos estaduais”.

Segundo o documento, os impactos que serão sentidos de imediato com o desmatamento completo da vegetação, o revolvimento do solo, o uso de sementes tratadas com agrotóxicos vão desde a perda da Biodiversidade (fauna, flora, fungos, líquens, microorganismos), mudanças nos ventos, na composição do solo exposto ao sol, na alteração da temperatura local, deterioração e contaminação do lençol freático e aquífero, à perda de processos biológicos únicos das espécies que se adaptaram ao clima semiárido e que lhes confere resiliência.

Leia a moção na íntegra:

Moção de Repúdio à plantação de soja e milho irrigados no Corredor Ecológico Capivara e a outros empreendimentos com impactos semelhantes

Por meio desta moção, manifestamos nosso repúdio à implementação do Empreendimento Cultivo de Soja e Milho Irrigados da empresa APESA AGRO PASTORIL, frente ao seu impacto devastador, irremediável e destoante dos rumos que as políticas ambientais consensualizadas em nível mundial. O projeto vai contra as políticas de reversão das mudanças climáticas, que têm também como causa ações antrópicas como as que serão executadas neste empreendimento. Esse caso serve também para alertar sobre outros empreendimentos que podem causar impactos semelhantes e que não devem ser incentivados pelos governos estaduais.

Importância da Região afetada
A região é chamada de “Berço do Homem Americano” pela Dra. Niéde Guidon, cientista que revelou para o mundo a importância dos mais de 1300 sítios arqueológicos, as belíssimas pinturas rupestres e as datações do homem mais antigo das Américas na região. Por esse motivo, e mais pela riqueza única de espécies vegetais, animais e de microrganismos que só existem na Caatinga e nesta área, além das belezas cênicas, a seu pedido, o governo do Brasil criou o Parque Nacional Serra da Capivara, em 1979.

Na ocasião, a área deveria englobar o Corredor Ecológico com o boqueirão Grande e o boqueirão das Camas, justo na porção onde se pretende implementar o plantio irrigado. Em 1998, foi criado o Parque Nacional Serra das Confusões, distante 90 km da Serra da Capivara, em sua porção mais próxima. A área entre os parques, local onde se propõe o plantio irrigado, passou a ser protegida mais tarde, em 2005, pelo Corredor Ecológico Capivara-Confusões (criado na gestão da Ministra Marina Silva). As três unidades de conservação compõem o primeiro mosaico de conservação criado no Brasil e que ainda compõem a Reserva da Biosfera da Caatinga.

O Parque Nacional Serra da Capivara

Unidades de Conservação do Bioma Caatinga no Piauí, a única que protege área exclusiva deste Bioma. Foi inscrito, em 1991, na lista do Patrimônio Mundial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Com 129 mil hectares de proteção integral à natureza, situa-se na fronteira geológica, entre a planície pré-cambriana da depressão periférica do São Francisco e a bacia sedimentar Maranhão-Piauí, razão das paisagens de grande beleza e extremamente variadas, resultantes da diversidade de formações geológicas que abrigam ecossistemas e recursos naturais notáveis.

Na planície predomina a Caatinga baixa, com vegetação mais alta nas bordas das inúmeras lagoas que nela se formam durante a estação das chuvas. Inselbergs marcam a paisagem, onde se sobressaem os serrotes calcários conspícuos por sua paisagem cárstica característica. Neles, encontram-se cavernas profundas, com alguns salões ocupados por grandes lagos subterrâneos, onde, em alguns deles, repousam esqueletos da Megafauna que vivia até cerca de 10.000 anos atrás na região.

Os cânions profundos que recortam a chapada preservam cerca de 18 espécies de árvores amazônicas e 16 de Mata Atlântica, testemunhos do encontro destas florestas há mais de 40.000 anos, que de lá para cá deu lugar ao conjunto de fisionomias vegetais que formam a Caatinga. Essa riqueza de espécies únicas, muitas ainda a serem descobertas, suscitou a necessidade de ampliar-se a área de proteção, com a criação de 35 mil ha de Áreas de Preservação Permanentes (APP) adjacentes ao Parque em 1990.

O Parque Nacional Serra das Confusões

Criado por meio do Decreto 1998 foi ampliado em 2010, passando de 526.108 hectares de ambientes de Caatinga Arbórea e ecótonos Cerrado/Caatinga para 823.435,70ha. É uma das maiores áreas de conservação da biodiversidade do Brasil e a maior do bioma Caatinga. Em função das diversidades de suas características de relevo e de clima apresenta beleza natural, resultado de inúmeras serras, platôs, cavernas e de sua biota, ora de Cerrado, ora de Caatinga, associado a alguns elementos de Mata Atlântica, além dos cânions com seus microclimas característicos e peculiares. Em decorrência da riqueza do patrimônio natural e cultural com suas inúmeras inscrições rupestres, sítios arqueológicos, o parque desperta interesse internacional para sua preservação.

O EMPREENDIMENTO
APESA Agropastoril Piauiense S.A submeteu à Secretaria do Meio Ambiente do estado do Piauí projeto de porte excepcional para fazer plantação de soja e milho irrigada na zona rural do Município Brejo do Piauí dentro da área do Corredor Ecológico Capivara-Confusões, distante 110 metros do Parque Nacional Serra da Capivara, região semiárida de Caatinga piauiense. As dimensões do empreendimento são de aproximadamente de 12.913,4764 hectares, dos quais inicialmente 6.000 ha serão destinados à plantação dos grãos referidos e, posteriormente, mais 6.000 ha. A Plantação utilizará sementes geneticamente modificadas e agrotóxicos. Para o plantio haverá supressão total da vegetação nativa.

OS IMPACTOS
A extensão da plantação de soja e milho de quase 13 mil ha, a retirada completa da vegetação nativa, o uso de água do subsolo para irrigação, a introdução de gramínea exótica, o uso de sementes transgênicas e de agrotóxicos trazem agressões que se somam e que serão impostas para além do ambiente natural da área do Mosaico Capivara-Confusões, com consequências sociais, econômicas, para a saúde e a conservação do patrimônio cultural e natural da região.

É necessário ressaltar que o impacto em um dos pontos da cadeia de relacionamento entre os seres vivos e o ambiente físico reflete nos demais pois os elementos que compõem o ambiente natural se comunicam e as redes de relacionamentos em equilíbrio é que proporcionam o ambiente saudável, direito de todos de acordo com a Constituição vigente. Os impactos que serão sentidos de imediato com o desmatamento completo da vegetação, o revolvimento do solo, o uso de sementes tratadas com agrotóxicos vão desde a perda da Biodiversidade (fauna , flora, fungos, líquens, microorganismos), mudanças nos ventos, na composição do solo exposto ao sol, na alteração da temperatura local, deterioração e contaminação do lençol freático e aquífero, à perda de processos biológicos únicos das espécies que se adaptaram ao clima semiárido e que lhes confere resiliência.

Estas alterações comprometem a saúde dos animais silvestres, domésticos e das pessoas pelo contato direto ou indireto com os agrotóxicos, além do efeito devastador na economia local, uma vez que afetará a vocação das populações locais que têm buscado garantir seu sustento em convivência mais harmônica com a natureza por meio da apicultura, agricultura familiar, turismo ecológico, entre outras atividades.

Veja o PDF da moção aqui.

Jornal da Ciência